sexta-feira, 7 de junho de 2013

Nas margens do dia

By Alberto Benett


Não é de hoje, mas tem se acentuado com a crescente imbecilização da televisão, salvo este ou aquele programa.

Os programas que passam em horários que podemos ver, são aqueles que fazem meu cérebro ameaçar cometer apoptose. Superficiais, falsamente úteis e umbilicalmente ligados à audiência, a ponto de os apresentadores delongarem uma besteira qualquer que esteja pesando na balança do ibope.

A Bandeirantes constitui uma feliz exceção, colocando Futurama e Os Simpsons no horário da tarde. Infelizmente é só isso mesmo, e infelizmente, pelo que conheço da emissora, é mais para tapar um buraco do que propriamente para ser uma atração.

Programas como o telecurso, são exibidos quando o cidadão em geral está a caminho do trabalho, sonolento, pensando unicamente nas obrigações, quando não no trânsito. Quando ele chega a algum lugar que tem televisão, os jornais matinais já terminaram de exibir o que faz diferença e se esmeram em falar de futebol... Bem, não propriamente de futebol, mas de fofocas futibolísticas.

Terminada a sessão celebridade da bola, vem um programa matinal, uma revista televisiva que deveria passar de forma leve e mastigada, o que o jornal mostrou de modo denso e objectivo. Infelizmente os apresentadores são priorizados, em detrimento das matérias. Depois disso, o cidadão já está a pleno vapor e não pode prestar atenção a mais nada.

Na volta para casa, no fim do dia, programas que acham que mostrar um assassinato brutal em vários ângulos diferentes, repetidas vezes, dividem o horário com novelinhas bobas e superficiais, cada um em seu canal, tirando o direito de escolha de quem não tem canais pagos em casa. Ou corre o risco de ter pesadelos, ou o risco de ter uma anestesia mental.

Depois que o cidadão se deita, para voltar a trabalhar bem cedo, é que as coisas interessantes voltam a ser exibidas, mas geralmente em doses de tarja preta. Documentários sobre ciências naturais, personalidades que fizeram diferença de modo que voltem a fazer diferença, filmes clássicos que dão um espetáculo de talentos de artistas e profissionais de apoio, programas de entrevistas que demonstram algum grau de inteligência, humoristas realmente engraçados, enfim... Tudo em horários inacessíveis a quem tem o que fazer durante o dia.

Fim de semana? Esqueça. Quem precisa dormir e acordar cedo, mas geralmente não consegue dormir cedo como deveria, está caindo aos pandarecos e usa o sábado para repor o sono. Quando acorda, só tem besteira na televisão.

Mas geralmente, quem trabalha ou estuda duro durante a semana, usa os dias de folga para ver se ainda conhece os próprios filhos, em um passeio ou qualquer evento de família. Ou ainda para provar aos entes que não está morto, só porque não teve tempo de responder a e-mails, ou mesmo a caixa de diálogos do facebook.

Aliás, quem usa a internet para trabalhar, é geralmente quem menos tempo tem para bobagens de televisão. As pessoas pensam que por trabalhar em casa, o cidadão está à toa, à toa no atol de Mururoa... e dana a mandar mensagens, servicinhos "só para olhar como fica", faz ligações a todo momento, e ainda tem a campainha, o síndico, o vizinho chato, MEU DEUS EU TENHO QUE TRABALHAAAAAAARRRRR!!!!!

Só vê filmes alugados ou pelo youtube, ou seja, não tem tempo para televisão, até porque mesmo os noticiários são em tempo real, pela rede. Quando o infeliz consegue terminar alguma coisa, toma um banho, come qualquer tranqueira e desaba na cama. Vida social? Não me façam rir, pois não tem graça.

Tudo o que o trabalhador e o estudante, quando não é ambos, consegue ver, é o que a televisão de onde e quando estiver lhe mostra. O que lhe daria diversão e conteúdo, fica bem nas margens do dia, separadas por um rio de idiotices que fica mais largo a cada dia; margens cada vez mais estreitas, diga-se de passagem.

Há canais públicos novos que tentam fazer algo diferente, mas enfrentam as dificuldades de praxe. Têm pouca verba, produção quase sempre pouco atraente, quase nenhum patrocinador, além de seus canais terem bem pouca abrangência. Precisa de dinheiro para se varrer um bom pedaço deste país gigantesco. Há gente, e muita gente que assiste ao que sua marca preferida patrocina. Não é devaneio, há uma pequena inversão de fluxo se instalando, já há alguns anos, mas isso tem explicação; os programas estão ficando tão absolutamente idiotas, que empresas tradicionais estão lhes emprestando seu prestígio, quando o normal era acontecer o inverso.

Infelizmente o círculo vicioso se instalou e é cada vez mais largo. Patrocinadores só patrocinam o que facilita suas vendas, claro e até certo ponto justo, enquanto o consumidor que poderia mudar isso não tem tempo para fazê-lo. Geralmente, diga-se de passagem, quem tem o controle das televisões nos ambientes de trabalho, é justo um viciado em bobagens neuro adiposas, que até hoje não sabe que estivemos na iminência de um conflito nuclear, mas sabe de cor e salteado cada penteado maluco daquele jogador da moda... E está deprimido por causa de mais um divórcio de mais uma celebridade, que não ajuda a pagar suas contas.

Eu faço parte do contingente que, de vez em quando e por acidente, descobre coisas muito legais na televisão, passando em horários que quase sempre me excluem de seu quadro fixo de telespectadores. E vou lhes dizer, é dose p'ra leão! Porque quando pego a internet, depois do expediente, quase tudo o que faço é trabalho.

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