segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Tortura através dos anos

Sabe aquela sensação de que algo muito ruim vai acontecer? Você sua frio, tem taquicardia, quer fugir, mas não tem para onde. Sua ansiedade atinge o limite máximo, você deseja morrer – ou ficar muito doente – para não ter que enfrentar aquilo. Ao longo da minha vida me senti assim várias vezes. Sempre que era dia de Educação Física.

Brincadeiras
Até a quarta série, minhas aulas de Educação Física se resumiam a brincadeiras, como a do Ovo Podre. Acho que isso acontecia porque a minha escola não tinha muitos recursos, como uma quadra de vôlei ou um campo de futebol. De vez em quando, a professora tinha a brilhante idéia de fazer competições de corrida. Eu sempre perdia. Todo mundo dizia que eu não corria o suficiente. E eu não conseguia ver sentido nenhum naquilo. O que se ganha correndo?

Danças Gaúchas
Um belo dia, fui convocada a participar do grupo de Danças Gaúchas da escola. Não foi por causa das minhas fantásticas habilidades de dançarina. A professora simplesmente convocou um número X de crianças e eu estava entre elas. Não foi tão ruim, até que eu gostava. A gente se sentia importante quando saía da aula para ensaiar, enquanto os outros ficavam lá, presos na sala de aula. Eu não era a pior dançarina, até onde me lembro. Às vezes eu era xingada porque me distraía muito. Pena que o grupo de dança era igual ao Menudo: depois de uma certa idade, a gente tinha que sair.

Esportes com bola
A partir da quinta série, tudo o que era doce se acabou. Começamos a aprender a praticar esportes de verdade. Não era igual a jogar vôlei na rua. Na escola tinha rede, tinha time e tinha regras. E eu tinha todos os motivos do mundo para ficar ansiosa quando era dia de Educação Física.

O vôlei era o meu pior pesadelo. Eu odiava ter que jogar aquilo. E esse ódio se refletia no meu desempenho. Era sempre a última a ser escolhida para o time. Meus saques muito raramente passavam para o outro lado da rede. Quando a gente tinha que trocar de posições na quadra, eu nunca sabia para onde ir. De vez em quando, aproveitando a distração da professora, minhas colegas me deixavam permanentemente na posição de levantadora, onde eu não precisava fazer nada. Assim, o time não perdia pontos e eu podia praticar minha maior defesa: deixar o corpo na quadra e levar a mente para outro lugar, bem longe dali. Eu era ótima nisso, pena que essa habilidade nunca valeu nota, nem elogios.

Além do vôlei, havia o handebol, que era o meu esporte preferido. Eu jogava muito bem, porque handebol é um esporte muito fácil. Vou ensinar o segredo do meu sucesso: é só seguir a manada. Se todo mundo corre numa direção, você corre junto. Se a bola vier na sua direção, você desvia dela e deixa que alguma fanática por esportes faça o que deve ser feito. Você é figurante, não é atração principal.

Quando o Brasil foi tetra campeão, as meninas da minha aula tiveram uma iluminação: aprender a jogar futebol. Graças a Deus, naquela época, o professor de Educação Física não obrigava ninguém a jogar. Eu ficava assistindo ao jogo com extremo desprezo. Querer jogar futebol só porque o Brasil ganhou a copa é o mesmo que fazer aula de dança do ventre por causa da novela “O Clone”. A adolescente que eu fui odiava modinhas.

Dança, de novo
Depois de todos os traumas físicos e psicológicos, do estresse pós-traumático e dos danos morais e materiais que sofri por causa dos esportes com bola, no Segundo Grau (oi?), cheguei ao paraíso. Na minha nova escola, nós podíamos escolher a modalidade esportiva que quiséssemos. Eu escolhi a dança, porque não precisaria chegar nem perto de uma rede ou de uma quadra.

Não era ruim, mas também não era bom. Meu maior vexame foi ter que fazer um trabalho em grupo sobre rumba. Eu sei lá o que é rumba? A gente se preparou mal e porcamente e depois teve que dançar na frente da turma toda. Teve de tudo: de coreografia mal ensaiada a meninas tropeçando na saia e quase caindo. Ainda assim, era bem melhor do que jogar o maldito-seja-eternamente vôlei.

Você pode até pensar que eu sou muito loser. Pode até ouvir aquela música do Beck em minha homenagem. Mas sou uma sobrevivente. E digo mais: aos 31 anos, meu corpinho está bem melhor do que o de muitas das minhas ex-colegas fanáticas por esportes. E juro que jamais pus os pés numa academia.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Repasse urgente, é sério... ou não.

Olá, meu nome é Manoel Furtado, mas actualmente sou um mané seqüestrado. Sou professor da Ucla e estava de férias no Brasil, quando fui vítima de um novo golpe.

Um casal discutia no estacionamento de um shopping, aparentemente coisa banal de casal e coisa e tal. Mas era só uma distração. Enquanto o casal fingia brigar, um integrante da quadrilha analisava as vítimas. Ele tem um incrível poder de dedução, descobriu de alguma forma que eu era o doador perfeito. A mulher atendeu ao celular e a briga parou. Todos entraram no shopping e eu fui para o meu carro, quando recebi uma coronhada e desmaiei. Nem vi a cara do negão de bigode ralo e olhos amendoados que me carregou.

Agora eu estou em um porta-mala de Fusca sem um rim, um pulmão, um pedaço do fígado, uma córnea e a Playboy da Xuxa que tinha arrematado no leilão.

Eu não tenho mais esperanças, amarrado, amordaçado e sangrando dentro deste porta-malas, me debatendo e gritando por socorro sem ser ajudado. Devo estar na selva amazônica. Mas você pode evitar novos casos, repassando esta mensagem para todos os seus contactos, com CPF, RG, senhas de banco e cartões de crédito, endereço e telephone completos, bem como detalhes escabrosos de sua vida íntima, para que opossamos chantageá-lo.

Não permita que outros caiam nesta armadilha. A polícia já está investigando a quadrilha desde a Segunda Guerra Mundial, o Frangástico e o Dormindo Boçal mostraram exaustivamente vídeos e depoimentos sobre o golpe. Todo mundo sabe, menos você, mané.

Então não perca tempo, mande para todos os seus contactos e obrigue-os a fazerem o mesmo. A Ual, a So-Micro-and-So-Soft, a Terra, o Gloogloo, o Pirate-Bye, o Mercado Ria, O Silvio Chatos, até o papa vão doar um centavo para cada vez que esta mensagem for repassada. Tenha coração, porque eu já não tenho. REPASSE, CACETA!

Avise todo mundo, fale com o papai, a mamãe e peça logo o seu. Deus lhe pagará em dobro.

Você só terá o trabalho de entupir as caixas de mensgens de seus amigos e (principalmente) seus inimigos, mande quantas vezes quiser. Lembre-se, eu conto com você. Milhões de pessoas já repassaram, não fique de fora. Se mandar para todos os seus contactos nos próximos dez minutos, você ainda ganha um lindo MP3 com "Então é natal" da Simone em infinit repeat; a cada vez que seus contactos mandarem para todos os contactos deles, você ganha um monte de inimigos.
Então não perca tempo, limpe esses dedos engordurados de óleo de coxinha vagabunda e mãos à obra. Ligue Djá!

E pensar que todos os dias um "novo golpe" mirabolante, como o caricaturado acima, aparece em minha caixa de mensagens. Rir, que mais fazer?

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Tesoura e cola - ou: como bolar incríveis manchetes chamativas

Vocês lembram da legendária revista MAD? Uma de minhas colunas preferidas era aquela do faça-você-mesmo, em que, numa espécie de recorte-e-cole (metaforicamente falando), usando determinadas frases e personagens chave era possível montar histórias de terror, notícias de jornal e talicoisa.
Mais ou menos como os famosos geradores do Mundo Perfeito e outros.
O que era uma boa piada infelizmente parece ter se tornado regra hoje em dia. As pessoas nem precisam mais de tesoura e cola (ainda que meramente imaginativas). Bastam os famigerados control+c e control+v que num instantinho se pode montar qualquer coisa. E, se não houver uma notícia de verdade, basta rearranjar as frases e criar uma, seguindo o espírito de JJ Jameson.
Vamos supor que você queira ter um blogue/revista/etecétera de fofoca. Você pode bolar incríveis manchetes chamativas a partir das sugestões abaixo.

a) Para o verão
"X mostra sua boa forma em [insira aqui uma praia da moda]"
"Y lê revista e W confere o bronzeado"
"K mostra seu lado maternal com seus filhos"
"Q, ex-BBB, aparece despreocupada em calçadão"
"Mulher-[fruta da vez] pára a praia XY"
"Calor e alegria: Fulannette se esbalda em Salvador"

b) Para o Carnaval
Além de variantes das alternativas acima, ainda tem:
"X arrasa na avenida"
"W confere a bateria da Unidos da WYZ"
"Tipannyyy se descuida e mostra mais do que queria" (mulher-sem-calcinha)
"Q, Ex-BBB, é a rainha de bateria da Acadêmicos do WRST"
"O carnaval não pára na Bahia e Beltranette dá o tom"

c) Para o inverno
"W no friozinho gostoso de [insira aqui uma cidade fria brasileira]"
"Y e K no charme de [insira uma cidade fria latino-americana]"
"H foge do frio em [insira cidade preferencialmente nordestina] e confere a culinária local"
"Cicranette agita o inverno mais quente do Brasil" (lógico que é na Bahia)
"Ex-BBB´s se esbaldam em/na/no [parque de diversão multitemático]"

Que outras categorias você acrescentaria?

Obs.
1. Notei que o pessoal atórammmmmmm o verbos conferir. Serve para quase tudo: desde lançamentos de livros a sorvete no quiosque.
2. As frases acima são produto da minha imaginação pérfida e não foram retiradas de nenhum sáite/blogue/revista.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Sangue de Jesus tem poder!

Uma vez, escrevi aqui sobre o porquê de eu não assistir mais novelas. Hoje, enquanto voltava para casa, lembrei de uma novela de que eu gostava muito e que, para mim, foi a melhor de todas: Vale Tudo, de Gilberto Braga.

Quando ela foi ao ar pela primeira vez, entre os anos de 1988 e 1989, eu tinha entre dez e onze anos. Diz o pessoal mais velho, que se lembra melhor das coisas, que a novela foi marcante por causa das críticas sociais. Tinha um personagem, o Marco Aurélio, que era um empresário corrupto – e acabou fugindo do Brasil, sem ser punido. Igualzinho ao que acontece na vida real.

Mas não estou aqui para falar de mazelas brasileiras. Para mim, o que mais torna Vale Tudo inesquecível são as quatro divas. Regina Duarte, Glória Pires, Renata Sorrah e Beatriz Segall deram um show de interpretação e suas personagens são lembradas até hoje. Uma novela ter quatro atrizes arrasando é um fato raro. Hoje em dia, temos um personagem que rouba a cena e temos que nos dar por satisfeitos.

Regina e Glória interpretavam Raquel e Maria de Fátima, mãe e filha que não poderiam ser mais diferentes. Raquel era uma mulher batalhadora, correta, honesta, que vivia dizendo que “sangue de Jesus tem poder”. Maria de Fátima não valia o ar que respirava, queria ficar rica da maneira mais fácil: dando o golpe do baú. No final das contas, as duas conseguiram subir na vida. Raquel vendeu sanduíches na praia, depois criou uma cadeia de restaurantes. Maria de Fátima deu seu golpe do baú – casou com o filho banana de Odete Roitmann.

Preciso abrir um parêntese e dizer que Regina Duarte interpretando uma mulher de fibra, de quem todo mundo gosta, já é um clássico da teledramaturgia brasileira. Assim como, em qualquer novela, todas as mulheres se apaixonam pelo Tony Ramos, mas acabam indo para a cama (ou para um monte de feno, ou para o banco de trás de um cadillac) com o José Mayer.

A cena abaixo é antológica, já é um clássico talicoisístico. Nela, vemos Maria de Fátima destilando toda a sua maldade. Vejam e aprendam a arte do desprezo!


“Mas é pobre! Você sempre se cercou de gente pobre! Você pode gostar, mas eu não gosto!”

“Pára de me chamar de Maria de Fátima, que eu odeio esse nome! Já me basta a vergonha de estar assinando esse nome de pobre em talão de cheque!”.

“Ninguém suporta pobre!”.

“... agora, você tinha que aparecer na frente dele com essa sua figura triste, para estragar a minha vida!”.

“Um dia eu vou poder te ajudar... porque, apesar de você ser pobre, você é minha mãe!”

“Se você soubesse de alguma coisa, não teria chegado a sua idade só com a rua para andar!”.

Raquel, porém, não deixou barato e acabou criando um bordão fantástico, que pode ser repetido em todas as ocasiões, só mudando algumas palavras: “Pra que táxi, Maria de Fátima?”. Adooooooooooro!!!

Na cena seguinte, é a vez de Raquel se vingar. Como ela é a boazinha da trama, não tem tanta graça.


"Eu odeio vocês, eu tenho nojo de vocês, eu tenho nojo! Noooooooooooojo!"

"Eu tenho a minha consciência limpa, e é com ela que eu vou subir. E um dia você vai cair!"

"Você vai bater na minha porta, e eu vou ter o prazer de bater com a porta da minha casa na sua cara!"

"Moooooooooooooooooooooooooooooooooonstro!!!!!!!!!! Mooooooooooooonstro!!!!"

Maria de Fátima, porém, não deixou barato e também criou um bordão instantâneo: "Sorte a do Ivan!".

Regina Duarte, quem diria, já foi diva. Eu já falei, e espero que Gabriel Leite não me ouça, que quem estragou Regininha foi o Maneco. Antes disso, ela fazia bons papéis, sempre com as suas marcas registradas: a carinha de cachorro que caiu da mudança e o famoso torcicolo.

Falando no torcicolo, tenho para mim que Regina Duarte deve ter sido degolada ou enforcada numa encarnação anterior...

Quanto às outras duas divas de Vale Tudo, isso é assunto para outra postagem.

sábado, 22 de agosto de 2009

Como pode ser tão ruim?

A propaganda oficial brasileira é um dos maiores ralos do erário público. A linguagem é quase sempre vaga, parece que os publicitários em questão têm medo de passar a mensagem que precisam passar. Se bem que na política o medo de expor a opinião tem o amparo da realidade.
Certa tarde (inteira) em uma fila do hospital Juarez Barbosa, me deparo com um cartaz (pretensamente) de esclarecimento a respeito da Hepatite B. Como não tenho a imagem no momento descreverei; Um cartaz horizontal com seis elementos principais, da esquerda para a direita: um rapaz negro dançando break no chão, uma garota cadeirande com uma bola de basquete na mão, outra garota fazendo pose de "gatinha", um enorme sinal de proibido pintado no muro já pixado, um surfista fazendo pose e sinal com a mão como se estivesse na praia, uma skatista fazendo pose com o veículo aos pés. Esclarecimentos a respeito da doença? Não. Instruções claras sobre como evitar a doença? Não. Um texto, ainda que rápido, mostrando as diferenças entre as hepatites? Não. Uma legenda dizendo o que aquela garotada fazendo poses estereotipadas têm a ver, directamente, com a prevenção? Não.
No decorrer das várias horas em que esperei para ser atendido, me perguntei o que era aquilo. A única conclusão a que cheguei, e que descartava o uso indevido e descarado dos impostos que eu pago, é que se tratava de um preenchimento de cotas. Porque a maior preocupação na formulação de uma propaganda oficial, já ficou claro, é ser politicamente correcto, ainda que o resultado final mate a mensagem a ser passada. Informar corretamente, de modo directo e claro a população é muito arriscado. Se o povo começa a pensar, logo começa a questionar, então políticos e programas de televisão perdem seus públicos.
Um exemplo recente de propaganda televisionada, é a que alerta para o excesso de elocidade nas estradas. Estereotiparam o motorista de tal modo, que em vez de engraçado ou carismático ficou canastrão. Ter graça ou carisma ajuda a fixar a mensagem na coletividade, ser canastrão, bem, quem entrou em uma sala de cinema e se esqueceu do filme meia hora depois do fim, sabe do que estou falando. A mensagem final foi "Foi a última vez que ele ouviu sua música preferida", a música era um rock pesado... Eu gosto de rock e não dirijo daquele jeito. Nada foi mostrado de modo claro, apenas sugerido, e muito mal sugerido. Não que eu queira ver aquele erro crasso do Detran, mostrando gente completamente desfigurada na televisão, sem maiores explicações. Só quero profissionais competentes trabalhando livres da censura política e partidarista politicamente patética. Mostrar o carro sendo abalroado de frente por um caminhão, por ter feito uma ultrapassagem perigosa, teria custado pouco e passado a mensagem.
As campanhas sobre medicamentos, então, me ofendem com tamanha incompetência. Digo "incompetência" porque não sou leviano de pensar primeiro na única outra hipótese, a da corrupção. Dão a entender que os laboratórios as encomendaram. Photographei algumas na Vigilância Sanitária Municipal de Goiânia, e minha chefe concordou comigo. São desenhos muito mal feitos, infantilescos, parecem ter sido coloridos com giz-de-cera vencidos. A intenção de quem idealiza as campanhas, quase sempre médicos, é das melhores, mas infelizmente na esphera pública uma idéia precisa passar por muitos filtros e muitas pessoas, muitas delas ocupando cargos de confiança sem ter conhecimento de causa para tanto. É aqui que dana tudo, que conceitos pessoais de certo e errado interferem directamente no trabalho. Notem que em momento algum eu me referi a interesses torpes, estou deixando tudo no ameno orbe da incompetência, que não é crime... Pena.
Cito duas propagandas oficiais que foram directo ao ponto e deram seu recado. Uma de Moçambique mostrando um caminhoneiro descendo do caminhão, já em casa, sendo acolhido pela família. É uma campanha contra a aids, que incentiva o caminhoneiro a pensar na própria família. Outra é nacional, uma pérola. Mostra um senhor já maduro na sala de cinema, com os traços endurecidos pela vida, começando a lacrimejar de emoção pelo filme. Se não me engano era uma campanha pela saúde do coração e a frase no fim era "Chore se for homem". Acreditem, esta propaganda tão liberal e avançada até para os dias de hoje, se deu durante o governo do Presidente Figueiredo. Oh, ja, mein herr. Uma propaganda da ditadura combatendo o machismo, algo que a nossa democracia bêbada nunca fez de verdade. Que ironia. Certo que o Figueiredo, em matéria de ser democrático, dava de dez na maioria dos caciques políticos hoje em liberdade, mas já faz um quarto de século que ele colocou um fim no regime, e as propagandas oficiais só pioraram com o tempo. Há uma diferença entre colocar em discussão e simplesmente discutir.
O que sugiro? Dusas cousas: Deixar publicitários tratarem de publicidade, existe já uma entidade própria para a regulação da propaganda, não precisamos de um doutor bacharéu com cargo de confiança dando pitacos; Olhar par trás, para ver o que e porque deu certo, e o que e porque não deu certo. Se o Estado se empenhasse no esclarecimento da população como se empenham seus dirigentes em suas campanhas eleitorais... Deixa, é utopia. Apenas dê uma olhada na ilustração e veja o quanto eles se encheram de dedos e medos de ofender, na hora de elabora-lo. Para quem não tem muito discernimento (o grosso da população) dá a entender que se medicar é legal.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Não presta? Quebra e joga fora! (ou respire fundo e diga: goosfraba!)

Eu sempre achei patético gente que quebra objetos inanimados por puro ódio. Tipo o cara que esmigalhou o controle remoto por não estar funcionando e só depois foi ver que o problema tava nas pilhas. Bom, o fato é que eu descobri recentemente a dor e a delícia de trogloditar. De bancar o Chuck Norris. De dar uma de Steven Seagal. Acompanhe.

* NOTA: O texto que talvez você leia, tem muito palavrão. Depois não vá reclamar... Caralho.


Devil Coelho: Ok, vamos aos fatos: a sua internet só conecta quando acha que deve. O carregador do seu celular também agia assim, mas decidiu aposentar de vez. (...) Ah sim, a TV da sala quebrou. Dê um fim nisso, colega!

DaveCoelho: Gente, que porra! Nada presta! O dia hoje foi babado e eu não posso tricotar! Nada de celular e nada de internet! Miséria!

Divino Coelho: - Se você raciocinar um pouquinho, vai ver que isso tudo é facílimo de ser resolvido. Eu vou te dar uma super dica, meu amor: vá pessoalmente a casa daquele técnico conhecido e peça pra ele vir ver qual o problema com a internet! Dep..

DevilC: Que mané técnico, colega! Essas porcarias não prestam MESMO. Vá lá e arranque esses cabos infelizes pra dormir tranqüilo, minha gente! O carregador do celular nunca prestará! Conscientiza-te! Para de tentar dialogar com essas tralhas, picote-as e deposite no lixo! Já!

DivinoC: Não dê ouvidos! Já não vivemos mais na selvageria e na barbárie! Jogar na lixeira... ora essa...

DevilC: Não, sério! Tudo bem que a lixeirinha é de plástico, colega... Mas se você olhar com a cabeça levemente inclinada, dá até pra confundir com um Tupperware.

DivinoC: Não seja besta, diga: Goosfrab...

DaveCoelho: Gente, realiza! Meu celular ta descarregado! Tô incomunicável, caceta! E já tô mexendo nesses cabos há horas pra ver se internet conecta e NADA! Tô muito puto, caralho!

DevilC: Baby, há dias você está sujeitado a boa vontade da sua internet. A dica é: destrua os cabos e vá dormir! DESTRUA! Não vai funcionar!

DaveCoelho: Vou destruir essas merdas é AGORA, meu amor! Peralá!

[Arranca os cabos da internet, quebra o conector *]

DivinoC: Tu ta achando isso bonito, é?! Ótimo. Agora não tem mais nenhuma possibilidade de conectar... Quem sabe era só esperar mais uma meia horinha...

DevilC: MEIA HORA? HAHAHAHAHAHA! ALOKA! RS LOL! VSF1 _|_

DaveCoelho: Cadê aquela porra de carregador? LIXO! Merece ir pro lixo é agora!

DivinoC: Gente, um carregador desses no camelô é baratinho... Para com isso...

DevilC: Carregador de cu é rola! HAHAHAHAHAHAHA!

DivinoC: Dave, você sempre achou ridículo quem destrói objetos inanimados em acessos de fúria... É inútil!

DevilC: Que inútil nada, colega! É infernalmente terapêutico! Ui, ui, ui! Calma, nervosinho!

DaveCoelho: Porra nenhuma! Se é patético ou terapêutico, eu tô puto demais pra diagnosticar. Mas uma coisa é fato: NUNCA MAIS vou ser perturbado por este carregador e nem por esta porra de internet! Foda-se! E o que eu faço com a TV?

DevilC: Ah, a xentchy ressóvi!! Várias vezis11 rs

DivinoC: HAHAHAHAHA! (...) RUM! Não vi graça...

DaveCoelho: Ah, calem a boca!

Vitória da Equipe Vermelha - e tudo resolvido em menos de uma semana.


Como assim???

Então, antes de tudo queria avisar que preciso que alguém troque de lugar comigo aqui no TC, pois as quintas-feiras não são mais um dia auspicioso (/"O clone II, a Missão", também conhecido como "Caminho das Índias"). Pode ser uma quarta, sem problema.

Voltando ao texto de hoje, olha sóam, eu tava aqui lendo meus i-meius quando me deparei com a seguinte imagem:


Um boné que tem um abridor de garrafa acoplado à aba. Como assim??? Como alguém teve a brilhante idéia de associar as coisas? Até onde eu saiba, um abridor de garrafas é algo que qualquer boteco, por mais pé-de-chinelo que seja, tem. Num acampamento? Talvez, mas um abridor não pesa tanto assim. E a idéia de abrir uma garrafa com um objeto todo suado, com o combo de gordura-de-cabelo e fios propriamente ditos destrói minha sede. Eu passo, obrigada.


E enquanto eu pensava sobre isso,acabei lembrando de algo bem mais insólito (e nojento) que um boné com abridor. "Arrepara" nas brilhantes idéias abaixo. Abridores de garrafa na sola de calçados!!!!!







Franciscanas.
















Tênis.







Sapato esportivo.













Chinelo.
Horror acoplado a nojo. Quem no mundo pediria: tiraí o calçado pra abrir a garrafa???
É indigno. É asqueroso. E é feio. E, tendo em vista os vários modelos, é temdemsia.
Eeeeca!







terça-feira, 18 de agosto de 2009

Momento artesanato



Comecei a fazer nos últimos suspiros das minhas férias, agora só falta passar uma camada de verniz.
Vai ser usada como porta-"jóias", já comprei várias outras caixinhas que estão em fase de produção (chique, nã?).
Eu aprendi essa técnica vendo algum programa "Note e Anote" no tempo em que a Ana Maria Braga apresenta (that means pré-história) e de vez em quando eu faço alguma coisa (comecei com latinhas, a latinha de pringles é ótima).
Com o passar dos anos, fui aprimorando. É terapêutico e bem fácil de fazer :)
Quem quiser aprender pode me avisar, andei pensando em fazer um passo-a-passo para postar aqui no Tali, mas minha semana começou com uma combinação não muito digna de dor de garganta e febre.

sábado, 15 de agosto de 2009

Vários pesos, várias medidas.

Tenho uma colega que puxa o filho para trás, enquanto o pai puxa para frente com o pronto apoio da família.
O moleque mal sabe diferenciar protocolo de preto-no-colo. Pois certa feita, em uma feira agropecuária, ela o flagrou aos beijos com uma menina. Não beijinhos, mas daqueles que a molecada vê na televisão e vive querendo alguém para praticar. Nada de errado, se o malandrinho nada fizesse além de estudar e existir. Se algo acontecer, ele não tem como arcar com as conseqüências, nem no financeiro, nem no psicológico. Nem falarei em moral e espiritual porque é exigir demais.
Hoje há um pé de guerra na casa dessa colega, porque o pai querer espalhar pelos quatro ventos que o filho "é macho e sabe agarrar", enquanto ela quer dar-lhe a dose diária de safanões. Até a irmã dela apóia, deixa o filho livre e a filha presa. Homem pode, mulher não pode.
Vamos à contradição. Querem que o filho seja macho, mas querem que a filha seja pura, casta e virginal até o suspiro final, dando à luz por concepção do Espírito Santo.
Se eles podem, mas elas não, eles vão poder com quem? Não vai dar para ser macho, porque só vai restar homens nas ruas (que visão mais horrorosa, heim!) e terão que se virar entre si. Ou seja, por esta análise, essa mentalidade é um estímulo ao homossexualismo, embora este seja rechaçado com violência por muitas famílias. Rechaça, mas planta e cultiva com esmero.
Noutra análise, há a mulher para casar e a para transar. Então vem outra mazela, pois para manter essa mentalidade é necessário e vital que alguém expulse a filha de casa. Ou seja, a felicidade do homem é necessáriamente a infelicidade de uma família inteira. Não há meio termo, se é preciso haver mulheres que jamais poderão se casar, porque em uma sociedade assim elas jamais se casariam, elas têm que sair de algum lugar, de mulheres que deram à luz. Ou estas mulheres seriam filhas de prostitutas, perpetuando um mundo de miséria e frustração, ou seriam filhas expulsas de casa, tendo causado uma dor que raramente um homem é capaz de conceber.
Não há meio termo aqui. Notem que em ambas as possibilidades, é preciso desgraçar a vida de alguém para manter os prazeres masculinos.
Agora vamos para as rodinhas de discussões mais reincidentes. Elas discutem política. Mais do que isso, falam mal de políticos. Com que moral? Alguém que incentiva o filho a abusar de outra pessoa mas não admite sob hipótese alguma que aconteça consigo, é em quê diferente dos políticos mal falados? Em nada.
Ambos só se importam com seus prazeres, não lhes interessa se a outra parte se sente bem; ambos não dão a mínima para quem venham prejudicar por seus interesses, pois se acham no direito de usar a outra pessoa para alcançar seu objectivo; ambos são capazes de matar uma pessoa para tirar satisfações de seu prestígio ferido, pois exibir e aprimorar a fama conquistada lhes é mais caro do que todo o resto.
Sim, há a questão cultural, que é difícil remover. Muito difícil. Dificílimo, aliás. Mas não é impossível. Ninguém adere a uma idéia, por mais pressão que sofra, se não lhe for simpática.
É muito cômodo poder esvair suas más tendências em alguém e ainda obter aprovação do grupo, pois a fama de bom pai de família e cidadão honrado fica preservada, apesar de falsa.
É muito cômodo poder fazer algo que incomoda, mas ter a certeza de que o mesmo não poderá ser feito impunemente consigo, fica preservada da máscara de cidadão calmo, equilibrado e civilizado.
No primeiro caso acima será preciso inventar uma mentira mais a cada dia, pois sempre haverá uma geração que quer saber os motivos disto e daquilo, e as explicações dadas a uma não servirão para a outra. Mas nós sabemos o quanto isso sai caro, estamos pagando o preço há alguns anos, mis precisamente desde Setembro de 2001.
No segundo caso acima, ficam confinados a agressividade e o rancor. Ambos crescendo com o tempo e um dia investindo contra as portas, até que estas sejam postas abaixo e eles se enfrentam. É o que está acontecendo hoje. Ser cortês e educado se tornou símbolo de hipocrisia, ser honesto é se arriscar a perder o respeito do grupo, não querer ter tudo aqui e agora é se arriscar a te virarem as costas.
Hoje em dia os filhos não respeitam os pais. Certo, meia verdade. Afinal, foram os pais que ensinaram seus rebentos a se colocarem acima do outro. Se o garoto transa é garanhão, se a garota transa é piranha? Então ele vai concluir que é melhor do que ela, que tem mais direitos, que é privilegiado. Um dia isto se vira contra quem não pode mais se defender, como um pai idoso. Não adianta reclamar, ele se acha superior a quem não pode se defender, lhe foi ensinado isto desde a mais tenra idade.
Depois de falar mal dos políticos e defender a pena de morte até para quem rouba para comer, ele vai entrar em seu carro, dar ré sem ver o trânsito, disparar, furar sinal, entrar na contramão, estacionar em cima da calçada e agredir quem achar ruim. Reconhecem a cena? Pois é, não saiu do nada, pois o nada não existe. O vácuo não existe. Se falta algo, outro algo toma seu lugar, e nem sempre esse outro algo presta. Começou quando colocaram o menino em posição de superioridade a alguém, seja uma menina, seja um empregado, seja um animal de estimação, seja quem for. Ele foi recompensado por agir como se fosse superior, quando adulto já não tolera mais não ser recompensado por isto. Ser punido, então, é jurar alguém de morte.
Nem todos chegam a tal extremo, mas todos o que compactuam com essa mentalidade corroboram para que tal extremo seja alcançado. Vão deter o extremista com que argumento? Toda agressividade que usarem para tanto, será vista como permissão para agredir em nome do que se acreditar, pelos mais jovens.
Gritar "Fora Sarney" e cochichar "Coma todas elas" é usar vários pesos e medidas, ensinando à criança que sua conveniência é mais importante do que a necessidade comum. Pois o pai já idoso e ranzinza pode ser muito inconveniente.
Para a colega de quem falei, aconselhei plantar uma marmeleira, que dá varas finas, fortes e flexíveis. Uma medida extrema para uma situação extrema. Infelizmente ela mora em apartamento, mas já cogita a idéia de pisar no chão e não pagar condomínio. Ela já percebeu que não está sozinha e que, na falta do amparo familiar, terá o dos amigos. Porque de pouco adianta incentivar e virar as costas, isto é hipocrisia. Ela sabe que se tentarem estragar o menino, terá a quem pedir ajuda para que volte a prestar. Isto é usar um peso e uma medida, não gerar contradições e cortar um mal pela raiz.

sexta-feira, 14 de agosto de 2009

O Reino do Apocalipse

Capítulo III – Mais respostas


- Ok. Hope, então... Onde estamos?

- Em um pequeno estábulo, quase uma manjedoura – ela sorriu – perto do litoral.

- E em que país?

- França.

- Certo. Ahn... Pelo que você me disse, é africana, certo?

- Sim.

- Ahn... Então... De onde, na África?

- Não lembro, ao certo.

- Não lembra??

- Não... Meus pais sumiram, quando eu era muito pequena. Fui criada por um curandeiro de uma tribo que habitava próximo a Serra Leoa.

- Hmmm... Daí o seu sotaque, não é?

- Exatamente.

Ela sorriu novamente. Christian achou que ela mentia, mas não entendia por que. Se ela tinha cuidado dele até ali, também não adiantava ficar colocando ela contra a parede. Mesmo porque, ele ainda não estava no seu estado normal.

- Bem, e ... Hope... Você por acaso sabe o que anda acontecendo no mundo? O que houve, porque do Terremoto, essas coisas? Eu andei muito tempo. Nem sabia onde estava. Só sei que tudo está uma loucura, e as pessoas estão loucas... Sem contar esses “bichos” que andam aparecendo...

- Sim... E várias pessoas que eram boas sumiram também, não é?

- Ahn... Sim. – Ele baixou a cabeça, se lembrando de Vie.

- Bem, mister Christian. Essa pergunta não é tão fácil de responder. Você crê em Deus?

Era uma pergunta um tanto quanto complicada para ele. Tinha sido batizado e feito a catequese na Igreja Católica, mas nunca havia sido uma pessoa ligada à isso. Sem contar o fato de que nunca havia sentido a necessidade de Deus em sua vida, e tudo mais.

- Digamos que eu não duvide, mas nunca fui beato, nem algo do tipo.

- Bem, Christian... Acho que você deveria começar a acreditar.

Ele estranhou o tom que ela usou. Falava sério demais. Queria entender.

- Bem, e... Ahn... Por quê?

- Já leu a Bíblia alguma vez, Christian?

- Não. Só algumas partes, aquelas que falavam sobre Adão e Eva, e sobre Jesus Cristo. E isso na Catequese. Sempre achei que havia vários erros ali. Não conseguia crer no que lia.

- Eu entendo. Já começa com a questão de Adão e Eva serem expulsos do Paraíso sem ter feito nada, quando a Igreja vivia dizendo que eles foram expulsos por terem feito sexo, certo?

Ele se assustou com a franqueza dela. Ainda mais, uma garota pequena como ela falando de sexo.

- Bem... É... Ahn... Isso... – E deu um sorriso amarelo.

Ela riu.

- Hahahaha, Christian. Eu sei o que é sexo.

- Ahn... Tudo bem. Mas... O que tudo isso tem a ver com o que está acontecendo?
- Ah, isso é um pouco mais complicado. Veja bem, a Bíblia realmente tem várias coisas, não exatamente erradas, mas confusas. Mesmo assim, tem importantes lições. Mas o que importa para nós não está no Gênesis ou nos Evangelhos.

- Certo. E onde está?

- Lembra-se de qual é o último livro da Bíblia?

Teve que fazer um esforço. Nunca havia feito mais do que folhear a Bíblia, exceto pelas partes que havia realmente lido. Sabia que depois dos Evangelhos havia os Atos dos Apóstolos e livros que contavam a estória de Paulo de Tarso.
De repente, lembrou-se.

- O Apocalipse de São João?

- Exatamente.

- E o que é que tem?

- Bem... Você não o leu, creio?

- Pra falar a verdade... Não.

- Ok. Então vai ser mais complicado do que eu imaginei.

Ele assentiu, sem saber exatamente o que deveria esperar.

- Bem, Christian. O Apocalipse fala de um sonho de São João, onde ele previa o fim do mundo.

- Fim do mundo? – Ele arregalou os olhos.

- Sim – Disse ela, rindo – mas não era exatamente tudo verdade.

- Como assim?

- O Apocalipse se refere mais exatamente à destruição do mundo como o conhecemos, e não ao seu final.

- Ahn... Olha, Hope... Isso está ficando estranho.

- Eu sei. E acho que isso tudo foi informação demais pra você. Descanse agora.

Ele não recusou. Deitou-se.

- Eu vou buscar mais comida. E vou tentar encontrar roupas limpas pra você. Durma.

Ele obedeceu, mas ainda ficou pensando sobre o que ela havia dito. Apocalipse? Destruição do mundo? E outra coisa... Como uma criança poderia entender tudo aquilo?
---§---

Uma das criaturas vinha em sua direção.
Ele correu, buscando se proteger.
A criatura corria atrás dele.
Ele entrava por um beco escuro, tentando se esconder.
Ao chegar ao final do beco, não encontrou nada onde se esconder. Olhou de um lado para o outro, sabendo que a criatura poderia vê-lo.
Virou-se.
Era tarde demais.
A criatura estava ali.
Não havia armas, não havia nada.
Estava tudo escuro.
Apenas os olhos vermelhos da criatura brilhando.
E aquela boca aberta, com dentes enormes, e aquele hálito fedorento.
Ele suava, pensando que estava perdido.
A criatura o fitava.
Ele não sabia o que fazer.
A criatura se ajoelhou à sua frente.
E o reverenciou.

---§---

- Christian?

Ele abriu os olhos, assustado. Era dia novamente.

- Está tudo bem com você?

- Está... Está. Um sonho ruim. Só isso.

- Ok. Bem... Coma. Vai se sentir melhor.

Novamente, frutas, água e pão. “Meu fígado vai ficar mal acostumado”, pensou.
No caminho até ali, tudo o que ele havia encontrado que não estava estragado, eram vinho e cerveja. A água estava escura, por todos os lugares aonde ele havia passado. Sempre havia animais mortos próximo aos rios, ou lagos. Nas casas, não havia água.
Terminou sua refeição, e Hope lhe deu roupas limpas. Eram roupas comuns: uma calça jeans, uma camiseta branca, meias e um par de tênis.

- Aonde arrumou tudo isso?

- Tirei de um homem que tinha o seu tamanho.

- Tirou?

- Sim. Ele estava morto.

Ele arregalou os olhos. Ela riu.
- Hahahahahaha. Não, encontrei em uma casa abandonada. Achei que iriam lhe servir.

- Bem... Ahn... Acho que servem.

- Hmmm... Entendo. Você fica encabulado com a minha presença, certo?

- Bem... É.

- Tudo bem. Vou até lá fora. Quando terminar, me avise.

- Ok.

Ele já conseguia se levantar. Estranhamente, pois fazia apenas dois dias que havia acordado, e já estava bem. Acho que teria que ficar um longo tempo ainda sem se mexer.
Vestiu as roupas limpas, o que era um alívio. Desde que havia saído de Londres, não havia tomado banho, e as roupas ainda eram as mesmas. Ressentiu-se de não poder tomar um banho. Mas... Se já havia sobrevivido a aquele corte, do que podia reclamar?
Viu seu sobretudo preto em um canto. Gostava dele, especialmente porque o havia ganhado de Vie. Mas estava muito quente pra usar aquilo, agora.
Resolveu arriscar, e andar para fora do estábulo. Abriu a porta, e ia chamar Hope quando olhou em volta.
Haviam dezenas de barcos encalhados na praia.
O ar lhe faltou.
A visão escureceu.


E agora, o que mais falta...?

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Eu só queria dizer - ou: pesquisas "gugleanas" sobre "frases"


Sabe aquele arquivo em ppt com ursinhos/fadinhas/rosinhas com glitter, animação e musiquinha de fundo, cheio de frases melosíssimas sobre amor/amizade/família/auto-ajuda que você vive recebendo?

E aquele com frases engraçadas, divertidíssimas, com aquelas imagens hilárias (com sarcasmo, faz favor) que infestam sua caixa de i-meius?

Pois é, fazendo uma das coisas de que mais gosto - fuçando no gúgou, descobri que existem pessoas que procuram por esse tipo de arma de destruição em massa... digo, informação relevante para montar essas "maravilhas da tecnologia".

Com vocês, os 10 resultados do auto-preenchimento das pesquisas sobre "frases".


1. "De amor" é o primeiro complemento à palavra. Aí você clica nos linques sugeridos e encontra coisas belíssimas como "Pode mil palavras levarnos[sic] ao abismo, mas, só um justo amor nos ensina a viver", de Aristides Wanderley (uau!), que é a primeira frase do primeiro linque sugerido. Não sei por onde começar a rir disso...

2. "Frases", assim, isoladas, para quem quer de tudo um pouco. Ecletismo, meu povo!

3. "Românticas" vem em seguida. O amor está mesmo no ar. Assim como a gripe suína, como disse um aluno meu da sétima série.

4. "Bonitas". Claro, frases de amor e românticas tem que ser bonitas, né?

5. "Para MSN". Bem que eu desconfiava que tinha de haver um banco de dados para coisas profundas como " Nóxxxxxxxx é d+++++++++++++", "Fulano(a): amor eterno, amor sem fim" (pleonasmo estilo Sandijúnior) e equivalentes.

6. As "de amizade" também são procuradas. Eu digo que o pessoal é mesmo romântico e amistoso!

7. "Engraçadas" vem coladinho (/SBT). Amor, romantismo, amizade, bom-humor, ecletismo. Tudo junto ao mesmo tempo agora.

8."Para orkut" tão ali. Seguem na mesma linha do item 4. Será que também tem um tradutor para miguxês/messenês/orkutês da vida? Tem sim!

9."E pensamentos". Hum, além de tudo o povo quer as frases e refletir! Acho digno.

10. "Lindas'. Para aqueles que acreditam que bonitas não basta, as frases têm que ser lindas também.


Observações:

1. Este post é ilustrado com a primeira imagem na pesquisa gugleana para a palavra "frases". Tem de tudo um pouco nela... Argh!

2. Eu só queria dizer que escrevo hoje por não ter certeza de que terei tempo amanhã.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Especial Miss Universo 2009 - A DIVA


O Miss Universo 2009 está acontecendo nas Bahamas (sim, o concurso não é só no dia...Existem apresentações preliminares e talicoisa) e a final vai ser dia 23 de agosto - a Band vai exibir aqui no Brasil.
Para o primeiro post da cobertura especial talicôisica...A Musa das musas, a deusa das deusas, a diva, a única, a inigualável MISS TURKS & CAICOS!!!!!!!!!!!!
Jewel Selver, 1,55m de puro glamour!




A última foto é uma das fotos oficias da Jewel no site do MU. É absoluta ou não é?

Primeira chamada - OTB

A professora começa a primeira chamada do ano letivo...
- Bom dia. Vamos começar nos apresentando junto com a chamada. Abba Cate da Silva (!!!)
- É "Aba Queite", psôra!
- Comé que é?
- É que minha mãe tem uns vinís do Abba e gostava de assistir "Dama de Ferro"... vergonha alheia...
- Fã é fã... Ava Gina Grande... Não precisa, filha, eu já te vi.
- Brigada, tia...
O constrangimento foi grande. Continua com a chamada...
- Big Bang Solano... É assim mesmo?
- É... Nem de relógio eu gosto.
- Cartier Temporão.
Uma moça se anuncia...
- Nossa, pensei que fosse um rapaz!
- Todo mundo pensa. O que é cartier?
- É uma marca de relógios de luxo muito famosa.
- Igual Rolex? Uh, agora eu gosto do meu nome!
- Daniel Matou Golias de Jesus...
- Presente... Ó, nem vem que eu sou ateu, um dia mudo esse nome.
- Do Re Mi Fa Sol La Ci Tocando Violão Soprano... Meu Deus!
- Presente... Desculpa a demora, é que tenho problema de audição.
- Everybody Come-On da Costa. Esse aluno existe?
- Sou eu - levanta timidamente o dedo uma moçoila ruiva.
- Terei que ter uma conversa com os pais de vocês. Forever Endever Garcia... Prazer, moço eterno, depois conversamos. Godsave Decuin Pereira Pinto... Depois falo com você também, filha. Meu Deus, onde foram parar Josés e Marias? Haga Nunfassom Rodrigues...
- Presentchê, psora!
- Irevir Gostoso Linhares...
- Presente... Ausente... Presente... Ausente... Presente... Ausente... Presente...
- Tá, já entendi. O que dá nas cabeças ocas desses pais de hoje? Joaquem Quessabe Disso Marques...
- Presente...
- Kriptonita Azul Kal-El Gibibom de Alencar...
Levanta a mão uma moça tímida, que poderia ser modelo, não tivesse mais vergonha do nome que vontade de vencer na vida.
Há uma breve fase de nomes mais comuns, mas sempre cheios de letras que só fazem ocupar espaço nos formulários. Porém, a segunda safra logo vem...
- Roliday Onice da Silveira... Prazer, moça... Super Trouper Musical Dobemol Caiado... Dá para ver que as moças são maioria, inclusive nos nomes exóticos. Theone Novais... Seus pais são versados em inglês?
- Não, nem português eles falam direito. Se fala "Deuan" mesmo.
- Percebe-se, mas você deve ser única mesmo. Urinol Tamoiado Rios!!!!!!!
- Sou eu - Se apresenta um garoto na primeira fila.
- Walkiria Viking Fagner Moreira Neves de Assumpção Normanda Silva Gregório Duarte Mendonça Uribe Cardoso Franco Denizard Maciel Luz Pompéia de Lima e Braga...
A sala toda grita "Amém"...
- Zu de Sá...
- Presente.
- Bem, me apresentando, sou a professora Maria da Silva.
A sala toda fica pasma com o nome estranhíssimo. A primeira aula começa e, no intervalo, é cercada para dizer o que significa e de onde tiraram esse nome. No dia seguinte, quando vai falar com os pais, nenhum apareceu. A maioria confirmou, mas a sala está cheia de cadeiras vazias. Já que por algum milagre o Estado não se lembra desta escola nem para suas políticas demagógicas de passar sem mérito, vai tomar conta daquela turma, porque família já viu que eles não têm.

sábado, 8 de agosto de 2009

O Reino do Apocalipse

Capítulo II – Uma nova Esperança

A escuridão permanecia, mas ele ainda podia ouvir alguma coisa.

Sons dispersos, a voz de uma criança. O som de algo sendo arrastado.

E a escuridão.

Cheiro de velas.

E a escuridão.

E de flores.

Pensou “Acho que eu morri mesmo”.

Palavras desconexas.

E a escuridão.

---§---

A escuridão começou a se desvanecer.

A dor não existia mais.

O som agora era o de alguns pássaros cantando ao longe.

Pensou “Ahn... É o paraíso, mesmo...”.

Abriu os olhos, e se decepcionou ao ver a mesma construção de madeira, aonde tinha caído, e sangrado.

Olhou de um lado, e viu a mancha já ressecada de sangue.

Procurou pelo ferimento, e encontrou uma grande cicatriz que seguia por todo seu lado esquerdo. Sinal de que esteve desacordado por muito tempo. Mas quanto?

Olhou para a sua direita, e havia um prato com frutas, e uma garrafa de barro, que continha água.

“Hora de assustar o fígado”, pensou.

Enquanto comia, começou a se indagar sobre quem o havia tratado, costurado, e alimentado. Certamente, nenhum dos assassinos ou criaturas que havia encontrado no caminho até ali. Se bem que... Onde era ali?

Tentou se levantar, mas viu que seria um pouco mais complicado. O corte havia cicatrizado, mas ele ainda não podia se mexer.

Fechou os olhos, tentando novamente se lembrar de como chegara ali. Foi interrompido pelo som da porta se abrindo.

Uma criança negra, de cabelos bem curtos, e roupas coloridas apareceu, e disse:

- Bom dia, mister. Consegue se levantar?

- Ainda não – respondeu – Mas acho que antes de qualquer coisa, eu deveria lhe agradecer por ter cuidado de mim. Quanto tempo fiquei apagado?

- Cerca de alguns meses, mister.

- MESES!?!

Ela riu.

- Não mister, estou apenas brincando. Você ficou cerca de 3 semanas dormindo.

- Mas... Como já posso ter cicatriz? Com um corte desse tamanho ainda?

- Digamos que você tenha uma boa saúde, e que eu dei uma pequena contribuição também. – Disse ela, piscando com o olho direito e apontando para uma mesa aonde havia um kit médico e algumas ervas.

- Você me costurou?!?!

- Sim, mister.

- Aonde aprendeu?

- Bem, são perguntas demais para quem acabou de acordar. Descanse, e mais tarde conversaremos.

Christian concordou, mas ainda não entendia muita coisa.

Deitou-se e dormiu.

---§---

Acordou ao anoitecer.

Começou a se lembrar de como havia conseguido aquele ferimento.

Ele tinha passado por uma pequena vila, no sul da França.

Não havia ninguém lá.

Encontrou apenas um homem, que tirava um pedaço de pão de uma criança e batia nela.

Ele matou aquele homem.

O pedaço de pão estava agora no chão.

A criança sorriu pra ele, e parecia agradecer.

Uma daquelas criaturas surgiu do nada. Pegou o pão, esfarelou-o.

Christian apontou sua arma para a criatura.

Outra criatura surgiu. Torceu de uma única vez o pescoço do garoto.

Christian atirou no primeiro, mas quando foi se virar para atirar no segundo, recebeu o que parecia uma punhalada no seu lado esquerdo.

Atirou e acertou o segundo.

Outros começaram a surgir.

Christian continuou atirando.

Mas as balas acabaram.

Saiu correndo, sem olhar para trás.

---§---

Sentiu um pequeno calafrio, e notou que a porta havia sido aberta novamente.

A menina negra surgiu, trazendo mais frutas e água.

- Sente-se melhor, mister?

- Um pouco. Mas gostaria de entender algumas coisas. Podemos conversar agora?

- Claro, mister. Mas antes, coma.

Junto com as frutas, desta vez, ela havia trazido um pequeno pedaço de pão. Novamente, Christian lembrou-se do garoto que havia morrido.

Acabou de comer, e já se enchia de perguntas, quando a menina disse:

- Não tão rápido, mister. Deite-se e descanse.

- Eu vou descansar. Mas quero que você me responda algumas coisas.

- Pois bem. O que quer saber?

- Primeiro, como uma menina da sua idade conseguiu me costurar desse jeito?

- Campanhas da Cruz Vermelha, mister. Como deve saber, na África, muita gente é mutilada, esfaqueada, e etc. Uma das primeiras coisas que se aprende a fazer é isso.

- Hmmm... Mas mesmo assim, você é muito nova.

Ela sorriu, mas não respondeu.

Ele assumiu que ela não era exatamente uma criança, apenas uma mulher... Digamos... BEM pequena.

- Outra coisa, não me chame de mister. Eu tenho um nome.

Ela sorriu novamente, e disse:

- Por acaso seria Christian?

Ele arregalou os olhos:

- COMO SABE?

- Está escrito na sua identidade – ela sorriu novamente.

Ele se sentiu um idiota.

- Ok. Esqueça. E você, tem um nome?

- Tenho sim, mis... Quer dizer, Christian. – Disse ela, sem tirar o sorriso do rosto.

- Bem... E qual é?

Ela silenciou por alguns momentos. Como se estivesse tentando se lembrar de alguma coisa. Christian não entendeu. “Será que ela não lembra o próprio nome?”

Ela voltou a abrir seu sorriso.

- Meu nome, Christian... É Hope.




"Meu nome é Hope..."

Grisalhos

Entra naquele salão, como tem feito nos últimos vinte anos, todos os sábados. Mas hoje tem uma novidade, não consegue mais disfarçar os cabelos brancos.
Todas as amigas, e até alguns maridos, lascaram tinta antes que o primeiro fio ficasse totalmente albino. Pensou seriamente no assunto, o cabeleireiro há anos a incentiva, mas o que parece ser uma decisão banal e óbvia lhe soa estranha.
As mesmas caras de sempre estão lá, mas as cabeças, quanta diferença! Louras-mel da semana passada estão ruivas, ou castanho-dourado, todas eram morenas há não mais que sete anos. Há cinco a melamina avisa que vai se aposentar.
Lhe soa simpático encurtar os cabelos, deixando algum volume para manter a feminilidade. Não um chanel, mas um curto volumoso e vivo, Mas nada de luzes, nada de tinta, nada de química de espécie alguma. Sempre foi uma mulher moderna, activa, atenta ao mundo mutante á sua volta. Sempre foi independente financeiramente e ainda guarda traços nítidos de sua juventude. Mas não vê nisto, motivos para querer enganar o espelho. Pode tratar de manter a cintura, o tônus muscular e redobrar os cuidados com a voz, mas a pele e os cabelos só podem ser disfarçados. Tem horror a artificialidades, suas amigas não são as mesmas desde que começaram a lutar contra a ampulheta. Parecem estar sempre querendo mostrar que não são velhas, uma delas se divorciou porque o companheiro de trinta anos de matrimônio não quis sequer pintar os cabelos, hoje sumiu de sua convivência, dorme durante o dia e badala à noite, geralmente com garotões. As outras não seguiram esse extremo, mas quase todas passaram a ter phobia do tempo. Foi verem as "melhorias" no espelho e ter medo de perdê-las, passando a gastar somas maiores no salão. A única excessão é uma amiga de infância, que ficou ruiva, mas se limitou a isto. Devaneia e medita enquanto folheia, sem ver do que trata a revista, esta dando destaque para uma actriz que se vende e é vendida como "gatona" que namora um rapaz diferente a cada semana. Melhor para ela não ver mesmo. Chamam-na, é sua vez...
- Lave, hidrate e Corte três dedos abaixo da nuca.
Ele festeja e estende a comemoração às outras dependências do salão, mas não ouviu as palavras mágicas...
- Blonde Marylin Monroe ou Grace Kelly?
Se lembra de ambas. Era criança quando Marylin faleceu, mas o velório da princesa ainda é nítido em sua memória. Foi sua época de juventude, quando ainda namorava despreocupada com o futuro...
- Deixe como está. Só lave, hidrate e corte.
- Com esse rosto de artista...
- Não quer fazer o serviço?
Ele obedece, mas não perde as esperanças de ela sair à rua com a cabeça dourada, quem sabe um louro bronze bem sóbrio. Começam lavando. Já passou por apertos financeiros sérios, foram épocas em que precisou usar curto para não gastar com a manutenção. O falecido não fazia objeções, mas a festividade da esposa não o enganava, sempre foi uma mulher austera, embora ousada. Naquela época não havia muito mais a fazer do que pintar o cabelo e caprichar na maquiagem. Às vezes até lhe vem à mente recuperar o tempo perdido, fazer o que não pôde, reaver as chances de que abriu mão pela família. Mas já lhe disseram desde menina que o tempo é como catraca de bicicleta, só gira para frente.
Não voltará a ter vinte e seis anos, os amigos mortos não vão levantar dos túmulos (graças à Deus) onde jazem, sua viuvez não pode ser revertida, os filhos não voltarão a ser crianças e não poderá mais ser jogadora de vôlei. Nem seus pais, nem seu marido, nem o esporte, nem cousa alguma que tenha perdido ou deixado de fazer voltará.
Não tinha muitos brinquedos em meados dos anos 1960, mas nem precisava. Conseguia se divertir com praticamente tudo, ainda que ficasse só olhando e admirando. Se lembra de cada surra que levou e os motivos da maioria delas, algumas ela não mereceu e renderam inversões de papéis, com seus pais cabisbaixos e chorando de vergonha pela injustiça...
- Pronto, agora vamos hidratar.
- Mas já?
- Menina, onde você está com a cabeça? O tempo já passou, queria.
Passou. Se dá conta de que passou até muito depressa. Era uma menina decidida no que queria ser, uma médica advogada formada em administração e enfermagem, com uma carreira vitoriosa no vôlei. Às vezes queria ser a quarta Pantera do seriado, mas já quis ser freira por um curto período. Mas seguiu seu desabrochar entre minissaias e bocas-de-sino. Foi nesta época que conheceu sua amiga mais arraigada, praticamente a única que restou de então. Namoro era aquela cousa de garotos que tremem para um simples beijo...
- Acorda, Bela Adormecida. Vamos fazer uma massagem.
- Posso acompanhar?
Sua velha amiga. Poucas pessoas a conhecem como ela. Uma já cuidou dos filhos da outra em diversas ocasiões, têm certeza de que já foram mãe e filha noutra encarnação...
- Tô divagando, sonhando aqui.
- Parece que está é hipinotizada. Que foi?
- Lembrando... Lembra quando anunciaram que o Fusca ia sair de linha?
- Mesmo dia em que sua avó caiu doente. Quem diria que os dois iam sair de cena?
- Mesmo com toda aquela idade... Ela ainda tinha força pra de dar bronca, porque eu tava chorando junto dela.
- Não é só isso.
Não, não é. Ninguém imaginava que a avó dela fosse morrer algum dia, pensavam que a morte já a tinha esquecido. Mas ela veio e a levou. No ano seguinte se casava, depois começou a vir a ninhada, três rebentos que hoje vivem suas vidas e fazem festas temáticas "Anos 80" uma vez por ano. Pelo menos esta vitória arrasadora pode contabilizar, criou a todos com um sucesso raro, manteve todos na linha até que pudessem voar com suas próprias asas. E voaram longe...
- Mas, apesar de tudo, a senhora ainda queria ter feito todas aquelas coisas que a gente não conseguiu...
- Culpa minha. Mas não me arrependo, faria tudo de novo. Eu fiz minha escolha, ninguém me forçou a nada.
- Então por que essa cara, mulher?
- Entre não me arrepender e não sentir falta tem uma distância grande.
Viagens adiadas por causa do trabalho, dos cursos e dos estudos dos filhos. Amigos de cujos óbitos só souberam semanas mais tarde, alguns íntimos, mas de quem que a correria acabou afastando. Foram quase vinte anos em um ritmo frenético, sem tempo para entretenimentos, que acabaram em um enfarto fulminante. Só a viuvez conseguiu lhe mostrar o estrago que estava se causando, mas ainda foram alguns anos para conseguir parar...
- Vamos cortar?
- Vamos.
- Amiga, o tempo é uma catraca de bicicleta, só gira pra frente, ela não dá ré. Vem com a gente fazer aquela viagem, nós três.
- Eu vou aceitar. Desta vez eu vou aceitar. Só deixa eu organizar a minha agenda, em um mês eu tô livre.
- Aêêêêêêêêêê! Gostei de ouvir. Ainda tá uma mulher bonita, gostosa, cheia de vida pela frente...
O século não começou bem para ela. Custou a conseguir equilibrar as finanças e os súbitos aumentos de taxas da prefeitura levaram suas economias. Fora que a filha e seu marido ficaram quase um ano desempregados, precisou amparar os três por quase um ano. Se pergunta se meio século de vida lhe dá perspectivas. Sempre chamou de "novas" as pessoas com cinqüenta anos, mas agora é ela quem tem cinqüenta. Olha para trás e vê uma estrada longa, talvez mais do que o que tem pela frente. Aposentar está fora de seus planos, foi no trabalho que encontrou amparo para as mazelas que sofreu. Sinceramente, só queria ter uma chance de recomeçar a vida, ou o que acha que resta de vida, porque juventude...
- Juventude é cabeça, criatura! Você mesma vive falando isso pra todo mundo. Olha essa molecada careta, preconceituosa e reacionária que tá lá fora. Eles têm medo da própria sombra e se escondem entre ruínas do mundo já demolido. Minha mãe é mais jovem do que eles, você é uma menina perto deles.
- É, você tem razão. Marca a viagem, vou comprar um maiô.
- Cara, o Julierme ia adorar ouvir isso!
- E quem garante que não tá ouvindo?
- Você jura que não vai pintar? Não quer aproveitar esse rejuvenescimento de dentro pra fora e mostrar por mundo? Mulheres bem mais maduras, de família, já fazem muito mais que isso.
- Respeita meus cabelos grisalhos. Eu não quero mostrar que tô bem, só quero estar bem.
- Deixa ela. Eu só queria tirar ela desse casulo e já consegui.
- Deixa eu envelhecer com dignidade.
Saem. Os cabelos brancos que só se vêem de perto continuarão brancos, os outros ainda serão. Volta a fazer planos; conhecer Santa Catarina, fazer um doutorado, deixar as marcas do tempo só no corpo, quer a mente lúcida até o último segundo, como sua avó era.