sexta-feira, 15 de outubro de 2010
Sing for me, Karen
Mais um aniversário difícil de celebrar, Karen. Teu silêncio lugubre me gela o peito e a espinha. Você não me responde mais, nem com uma malcriação.
Faz tanto tempo que não ouço tua voz, que praticamente só me lembro dela. Ainda a tenho cristalina e sedosa como sempre fora, enternecedora de tal modo que só mesmo você poderia ter assim cantado. Me lembro melhor do que me cura que daquilo que me fere, foi assim que perdoei tudo quanto aprontou comigo e nossos pais, Karen. E sua voz não escondia o anjo detrás das malcriações. Quem te conhecia como nós te conhecíamos, sabia quem você realmente era.
Eu deveria ter ficado mais atento, ter cuidado de você como prometi para mamãe.
Está tudo gravado, mas não é você. Posso ouvir e re-ouvir tantas vezes quantas quiser, mas mesmo hoje nenhuma tecnologia de gravação faz juz à tua cantoria. Hoje é fácil ter vídeos a qualquer momento, mas eu não posso conversar com um vídeo. Com você eu ria, chorava, bradava ou ficava perplexo; nossos vídeos só me deixam triste. Deve ser uma doença, porque eu sempre quero ver de novo. Às vezes fecho e saio, mostrando que está tudo bem, mas a minha vontade é de entrar no vídeo e te abraçar de novo. Uma vez só.
É triste lembrar que hoje é meu aniversário, Karen. Estão todos à minha volta, querendo me ver sorrir, saber do carro que adiquiri para minha coleção, da melodia que compus ou em que tenho trabalhado. Mas eu só quero chorar, Karen! Eu só quero chorar!! Mas tenho que manter a armadura para que os outros também não fiquem tristes.
Eu tinha que ter cuidado melhor de você, mas você não deixava! Orgulhosa, sempre disse para não nos metermos, que estava tudo sob controle, que sabia o que estava fazendo! Você demorou demais a perceber que precisava de ajuda, Karen!
Você não era só uma irmã para mim, era mais como minha filha! Eu tinha que ter cuidado de você!
Hoje estão todos à minha volta, me felicitando, me abraçando, querendo que eu cante o que cantávamos juntos! Não havia e-mail na nossa época, tem a ver com computadores e linhas telephônicas de alta velocidade. São milhões de fãs, Karen! Até hoje me mandam e-mails, cartas, presentes, dizem que nossas canções mudaram suas vidas. Até hoje muitos escrevem chorando e eu tenho que consolá-los, quando eu mesmo mal me agüento em pé, mal consigo digitar enquanto minhas lágrimas molham o teclado!
Já são quase trinta anos. É uma vida. Uma vida inteira sem você.
No meio de tanta gente esnobe, com pretensões de parecer intelectual, moderna, descolada, você era uma caipira convicta e assumida. Ser tão verdadeira não é bem visto por este mundo cretino, Karen. Com você as meias-palavras eram papel-higiênico, mandava passar naquele lugar e "ai" de quem achasse ruim. Eu ficava bravo, mas depois ria. Você falava o que ninguém tinha peito para tanto. Eu gostava de te ouvir.
Por que você fez isso comigo? Por que não aceitou ajuda quando oferecemos? Eu nem posso mais ficar puto com você, porque cada vez que começo a ficar, fico também com saudades e choro!
Você não era só sua, Karen. Você tinha um pedaço meu também, um pedaço grande do meu peito! Hoje eu falo e você não responde, nem com uma malcriação! Nem com a língua de fora! Nada!
Hoje é meu aniversário, Karen, e eu só queria te ouvir de novo. Hoje fiquei mais velho e você não ligou nem para zombar da minha careca crescente. Não disse que estou ficando gagá e esclerosado, que só posso comer papinha.
Quando quis, você sempre foi carinhosa, com com aquelas crianças no Japão, cantando em japonês... Quantos cantores americanos sabiam balbucear, quanto mais cantar em japonês? Só você mesma para se dar a tanto trabalho. Eu me lembro, mas perdi as contas, de quantas vezes foi comigo também. Eu compreendo, o mundo não era bom o bastante para você e hoje, acredite, consegue ser bem pior em muitos aspectos. Foi bom... Foi este o problema, ter sido bom.
Foi bom demais, Karen. Apesar de tudo. Tão bom que me viciei e sinto falta. Eu ando para frente, mas sempre olhando pelo retrovisor. Não é excesso de cautela, é para tentar te ver.
Você levou muito de muita gente consigo. Não deu para ser o mesmo depois que você foi embora, ninguém é o mesmo desde aquele dia. Há momentos em que eu penso que a dor vai me matar, talvez fosse melhor ter um câncer, que me daria a certeza de que tudo acabaria em breve.
Eu agüento, você sabe. Tenho responsabilidades e pessoas dependendo de mim, preciso agüentar firme até o fim. Mas você me conhece, sabe que não é tão fácil quanto faço parecer. Minha vontade era cair da cama e acordar, então te ligar e ouvir você me xingando por ter te acordado tão cedo por uma bobagem... Mas eu sei que estou acordado. Durmo todas as noites e acordo sem que algo tenha sido só um pesadelo.
Give-me a last wish, please... Sing for me, Karen!
Postado por Nanael Soubaim às 17:59
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2 comentários:
Não puderam matá-la pela arrogância e frivolidade, mataram-na pela vaidade, doce Karen.
Agora me diz se quem se acostumou a ouvir esta voz, vai se contentar com as tais "teen idols" de hoje.
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