A ausência pode não ter feito ruírem as paredes, mas tornaram o silêncio entre elas insuportável. Buscaram forças em si mesmos para manterem a rotina e a casa de pé, sem o quê o retorno não seria possível. A imensidão do imóvel poderia abrigar uma multidão, agora reduzida a dois.
Espanar e conservar os leitos, a mesa, o banco da varanda, a horta que o quintal ainda mantinha, pois era casa antiga, com espaço para pessoas viverem e conviverem. Agora somente quatro mãos para todo o serviço, cansativo, mas capaz de manter a tristeza abaixo do tolerável.
As aventuras necessárias a tantos para a maturidade feriram e acariciaram, formaram os paradoxos aos quais todo gênio está sujeito, mas não se consideravam gênios, sendo expostos a provações às quais não se sentiam preparados. A partida lhes era necessária por se sentirem sufocados e podados naquilo que não conseguiam realizar, no tempo que não lhes era possível disponibilizar. Problemas todos têm, mas os que ficaram admitiam a falha para com os que partiram. Eram crianças, crianças precisam de atenção que aquelas não conseguiram receber. O arrependimento e a frustração podem ser vilões ou professores, os dois preferiram aprender.
Caminhando no mesmo lugar, sem trégua e sem tempo para pensar na solidão, mantiveram a casa em ordem, bem cuidada, o jardim bem cultivado, enfim, tudo pronto para quando decidissem voltar. Se decidissem voltar.
Os outros, decididos a recomeçar uma vida nova, alguns até magoados pelas expectativas não satisfeitas, iam de casa em casa, empolgados a cada começo e logo desanimados, então pegavam novamente a estrada para nunca mais, sem olhar para trás. O que valeria à pena ver não estava mais ao alcance das vistas, inútil parar e olhar na direção da partida. Sabiam, entretanto, que o ninho deixado era o único feito sob medida e coisa e tal. Ainda que tristes, seguiam em frente. Em círculos. Abrindo uma porta para abandoná-la logo em seguida, jamais satisfeitos.
Vez ou outra alguém ainda pegava o retrato guardado com carinho na mochila, esta já precisando de reparos, aquele já amassado e começando a desbotar. Mas ninguém pensava em voltar.
No mesmo lugar, a idade passou como para todos. A mudinha plantada meses antes da debandada já floria, frondosa e imponente, a abrigar ninhos e um balanço que raramente era usado. As lembranças mais duras eram a da convivência, que esfriara com o acúmulo de obrigações. Destas nenum era culpado, mas também não procuravam um.
Os olhos já não brilhavam e as rugas, antes restritas às expressões intensas, começavam a descansar perenes nas frontes exauridas. Mas a esperança dura e difícil de digerir constituía o alimento, o principal ítem da dieta árdua que adoptaram para resistir à solidão que a distância de tantos gerava. Não cogitavam o adeus ouvido, ninguém é totalmente dono de seu destino se não vive em uma caverna no deserto. O mundo é curvo. Só se pode distanciar até certo ponto, a partir do qual se inicia o retorno sem precisar caminhar pelas mesmas pedras.
As aventuras necessárias a tantos para a maturidade feriram e acariciaram, formaram os paradoxos aos quais todo gênio está sujeito, mas não se consideravam gênios, sendo expostos a provações às quais não se sentiam preparados. A partida lhes era necessária por se sentirem sufocados e podados naquilo que não conseguiam realizar, no tempo que não lhes era possível disponibilizar. Problemas todos têm, mas os que ficaram admitiam a falha para com os que partiram. Eram crianças, crianças precisam de atenção que aquelas não conseguiram receber. O arrependimento e a frustração podem ser vilões ou professores, os dois preferiram aprender.
Caminhando no mesmo lugar, sem trégua e sem tempo para pensar na solidão, mantiveram a casa em ordem, bem cuidada, o jardim bem cultivado, enfim, tudo pronto para quando decidissem voltar. Se decidissem voltar.
Os outros, decididos a recomeçar uma vida nova, alguns até magoados pelas expectativas não satisfeitas, iam de casa em casa, empolgados a cada começo e logo desanimados, então pegavam novamente a estrada para nunca mais, sem olhar para trás. O que valeria à pena ver não estava mais ao alcance das vistas, inútil parar e olhar na direção da partida. Sabiam, entretanto, que o ninho deixado era o único feito sob medida e coisa e tal. Ainda que tristes, seguiam em frente. Em círculos. Abrindo uma porta para abandoná-la logo em seguida, jamais satisfeitos.
Vez ou outra alguém ainda pegava o retrato guardado com carinho na mochila, esta já precisando de reparos, aquele já amassado e começando a desbotar. Mas ninguém pensava em voltar.
No mesmo lugar, a idade passou como para todos. A mudinha plantada meses antes da debandada já floria, frondosa e imponente, a abrigar ninhos e um balanço que raramente era usado. As lembranças mais duras eram a da convivência, que esfriara com o acúmulo de obrigações. Destas nenum era culpado, mas também não procuravam um.
Os olhos já não brilhavam e as rugas, antes restritas às expressões intensas, começavam a descansar perenes nas frontes exauridas. Mas a esperança dura e difícil de digerir constituía o alimento, o principal ítem da dieta árdua que adoptaram para resistir à solidão que a distância de tantos gerava. Não cogitavam o adeus ouvido, ninguém é totalmente dono de seu destino se não vive em uma caverna no deserto. O mundo é curvo. Só se pode distanciar até certo ponto, a partir do qual se inicia o retorno sem precisar caminhar pelas mesmas pedras.
Estranhava a vizinhança aquela casa praticamente imutável ao longo dos anos, cujo jardim os mais atentos podiam desenhar sem precisar revê-lo. Os moradores remanescentes, discretos, eram também solícitos e gentis com a comunidade, mas se esquivavam de qualquer pergunta a respeito dos assuntos internos.
Na última curva do horizonte a família se reencontra e reconhece seus integrantes, mas não mais seus rostos, seu cansaço, suas lágrimas. Se lembram daqueles caminhos que outrora usavam para irem à escola, às festas e toda a sorte de venturas que suas juventudes ofereceram, e das quais abriram mão para amadurecerem do modo mais duro.
Passos decididos à casa que ajudaram a erguer, que outrora era fértil em festas, mas das quais o amadurecimento coletivo os afastou e precipitou as buscas. Saíram para procurar o que tinham dentro de si mesmos. Não reconhecem o bairro, mas o caminho ainda é o mesmo. O velho cão já não os esperava e o novato estranhou a movimentação, mas estranhamente não acusou perigo. Saem os dois, guarnecidos por seus óculos, vendo a família de volta.
Todos mudaram, mas são todos os mesmos.
Desculpem o fora de hora, mas foi necessário. Texto exclusivo do blog Talicoisa.
1 comentários:
Dois textos num dia é melhor que vários dias sem texto.
Lindíssimo texto. Nanael!
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