“Minha avó era uma bruxa. Mas não uma bruxa qualquer, ela era a líder das bruxas de Porto Alegre e região. Andava sempre bem arrumada, cheia de jóias. No pescoço, ela pendurava um colar sagrado, que possuía poderes mágicos. Além disso, ela conseguia adivinhar seus pensamentos, só com um olhar. A casa dela era toda de pedra. Ao entrar na sala, a gente via um imenso caldeirão, que estava permanentemente borbulhando. Não havia luz elétrica. Toda a iluminação era feita por velas, muitas velas. Uma vez por mês, todas as bruxas se reuniam lá. Não sei, acho que era por causa da lua cheia. Nessas ocasiões, era acesa uma grande fogueira e todo mundo dançava e cantava em volta dela...”.
“Quando eu nasci, ainda no hospital, recebi a visita de um mágico. Ele andou pela maternidade, procurando duas crianças, a quem ele concederia alguns dons. Fui escolhida. A outra criança era um menino. O mágico se aproximou, pôs a mão nas nossas cabeças e sussurrou algumas palavras. Desde então, eu leio pensamentos, tenho sonhos premonitórios, consigo levitar sempre que eu quiser (a não ser que vente muito) e entendo a linguagem dos animais. Nunca contei isso para ninguém. A única pessoa que sabe disso é a avó. Porque ela é bruxa...”.
“Falando em avós, preciso contar sobre o avô da Márcia, minha vizinha. Ele é um zumbi. Não no sentido figurado, ele é zumbi mesmo. Um dia ele morreu, mas retornou do mundo dos mortos. Por isso, ele tem aquela pele meio esverdeada aqueles cabelos sempre arrepiados. Coisa estranha... Durante a noite, ele fica vagando pelas ruas. Quando encontra algum cachorro solto na vizinhança, ele mata. E come. Foi o que aconteceu com o pastor alemão da esquina. Diz que o velho chegou, ficou olhando fixamente para o cão, até que o animal fosse hipnotizado. Depois disso, ele só teve o trabalho de torcer o pescoço do bicho. No outro dia, os donos do pastor alemão só encontraram o couro e os ossos dele... A gente ouve cada coisa, não é? Mas é tudo verdade”.
A menina Luna gostava de inventar histórias sem pé nem cabeça, para assustar os outros. Mas ela não saía por aí, falando essas invencionices para qualquer um. Ela sempre soube escolher as vítimas perfeitas...
A história da bruxa foi contada para a, digamos, babá da menina. Luna não gostava dela, porque ela era chata, maldosa e vivia difamando as pessoas. Foi gratificante ver a babá from hell ficando apavorada e não se atrevendo mais a falar mal da avó de Luna, com medo de alguma represália, de algum feitiço. Melhor ainda foi notar que a babá nem conseguiu olhar diretamente para a avó, quando esta apareceu para visitar a neta...
Já a mentirinha sobre o suposto mágico, foi contada para um primo, numa tarde ociosa na praia. Ele acreditou em tudo, mas a menina Luna resolveu mudar de assunto, quando teve de dar uma pequena demonstração. Usou a desculpa de que podia aparecer alguém... Todo o cuidado é pouco, quando não se quer ser descoberta! Ainda assim, os poderes mágicos foram assunto durante o resto do veraneio.
Porém, a melhor história foi mesmo a do velho-zumbi. Essa virou até lenda urbana no bairro, pelo menos entre as crianças menores. A cada dia surgiam fatos novos, no melhor estilo “quem conta um conto, aumenta um ponto”. Devo dizer que a menina Luna ficou feliz da vida, por ter começado o diz-que-diz...
É muito bom ser criança e poder dar asas à imaginação, falar tudo o que se tem vontade, sem se preocupar com nada. O máximo que pode acontecer é não acreditarem na gente. Quando crescemos, a língua não pode ficar tão solta, porque aí somos acusados de fofoca, calúnia e outras coisas chatas. Como diz C.S. Lewis, em As Crônicas de Nárnia: “Gente grande tem mania de dar explicações sem graça!”.
segunda-feira, 21 de janeiro de 2008
Uma bruxa, um mágico, um velho e uma menina
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3 comentários:
As minha imaginação infantil nunca foi tão fértil assim. Gostei da história da avó bruxa, é tão - não se ofenda, por favor - Luciana do Rócio, nos bons tempos é claro.
O pior foi que a babá morreu acreditando que a minha avó era bruxa. Nunca desmenti!
Gostei de ser comparada à Luciana do Rócio! Miacabei!
Cada história, hein, Luna!
Que imaginação fértil você tinha (tem?).
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