sexta-feira, 24 de agosto de 2018

Dead Train in the rain IX

    Os laços são feitos e devidamente arrematados entre nossos amigos.
    Nona estação, parada rápida, todos a bordo que o trem vai partir.


Turma formada, todos devidamente acomodados, Nancy começa como pode, para quebrar o gelo. Começa a aula cantando...

- Boa tarde, crianças.

- Boa tarde, professora - respondem na mesma melodia, se divertindo.

Funcionou. Pede, ainda cantarolando, que ajudem o garoto de fora, para que consiga alcançar o resto. Entre conversas normais e cantaroladas, o conteúdo é apresentado, explicado, discutido e exercícios práticos realizados. Exactamente como sua mãe lhe ensinava, com a inclusão de técnicas modernas.

Com sua experiência ao balcão, ensina matemática de forma prática, com exemplos próximos e mostrando a utilidade, inclusive usando as bombas de combustível para demonstrar frações e cálculo de volume. No fim da tarde, vê que não se saiu mal, embora ainda esteja com as pernas tremendo. Planeja a aula de amanhã, esperando tremer menos.

Com alguma dificuldade, Robert júnior consegue alcançar os demais. Rebeca, sua irmã, tem aulas à parte, pois ainda é muito novinha, mas grande o bastante para iniciar a carreira estudantil. O ensino intensivo de música surte efeitos positivos nos irmãos, especialmente no garoto, que passa a render mais na escola. Diga-se de passagem, a pequenina se mostra uma aluna voraz, deglute e digere rapidamente o que lhe é ensinado.

O racismo? Ele viu que é uma coisa muito idiota, agora é unha e carne com Ronald, nos estudos e nas travessuras típicas da idade. Certa feita eles estavam brincando de bola, na casa de Robert, quando um vizinho viu aquele garoto negro e mandou que seus dois filhos entrassem em casa. Os dois olharam abismados pela cerca baixa, a cena ridícula. Quando o homem colocou a cabeça para fora da porta da cozinha, o nobre acenou, ele se recolheu rapidamente. Os dois se olharam, combinaram e esperaram. O homem abriu a cortina da janela e os dois acenaram dançando o cancã, ele se escondeu de novo. Mais um pouco e ele olhou novamente, os dois seguravam uma placa escrito “We’re still here!” bem grande. Foi uma tarde de domingo mais divertida do que imaginavam ter. Quando contaram aos pais, após a indignação que quase fez papai Robert partir a cara do vizinho que há muito não lhe agradava, combinaram de fazer algo parecido noutro dia, com mais gente e com mais deboche.

Rebeca ainda era muito novinha para compreender essas coisas idiotas de quem se acha adulto, já começou sua vida social interagindo positivamente com negros, índios e filhos de imigrantes. Novinha, mas sua personalidade agressiva se mostrou desde cedo.

&

Patrícia vê um bilhetinho em sua carteira (...) os amigos dizem que viram várias crianças passando por ali, mas não viram quem colocou o bilhete. Abre e lê “O que uma garota legal como você faz com um grupo de perdedores, quando poderia estar com um homem de verdade?”. Fica brava, embora não aparente. Olha discretamente para os lados, mas todos têm a mesma cara de idiota, parece que saíram de uma linha de montagem. Mostra aos amigos na saída, e aos pais em casa. Ela não reclama de ter sido paquerada (...) se aborreceu de a pessoa ter se desfeito de seus amigos; são como seus irmãos.

Nancy e Richard observaram a filha com atenção, ainda pouco mais do que uma criança, mas se formando e crescendo muito rápido (...) a plástica da menina era simplesmente deslumbrante. Decidem observar e testar reações, no próximo halloween, com uma festa em casa. Mas por agora tratam de conter a indignação do rebento, que há muito se queixa de colegas de escola. Adoraria estudar nas escolas legais e cheias de amigos sinceros, dos filmes institucionais...

- Meu amor, venha aqui. Senta no colo da mamãe, enquanto ainda cabe nele... Você já está ficando mocinha. Eu sei que nunca ficou presa às bonecas, que prefere os livros, mas... Vou ser directa, esses caras vão começar a ser inconvenientes, eles vão pegar no seu pé e enxergam os seus amigos como obstáculos. Para eles, os garotos são seus paqueras.

- Como é que é - Indigna-se?

- Você se lembra do que aconteceu com os Blosson, no ano passado? Da encrenca que foi um rapaz se interessar pela Betty e assediá-la, e quando ela correu quase nua do carro para dentro de casa?

- Tá querendo dizer que esse cara quer me namorar? Sem chance! Não vou com a cara de quem não respeita a minha turma... E ainda estou longe de querer saber disso... Colegas minhas que já namoram estão indo mal na escola, sabia?

- Seu pai nunca me atrapalhou, muito pelo contrário. Me incentivou a estudar e até me ajudava nos trabalhos.

- Oras, mamãe, não faça comparações tolas! Papai não é simplesmente um homem, é um Super Homem, um exemplar raro e talvez único, um príncipe, um gênio, um exemplo e modelo para o resto da humanidade...

Ela enumera as qualidade e Richard ouve, com um sorriso de orelha a orelha, detrás da porta. Sai de volta à oficina esticando os suspensórios, mais cheio do que tanque de Cadillac recém-abastecido, se achando o máximo.

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