quarta-feira, 12 de dezembro de 2018

Dead train in the rain CXVIII

    Lutos e novidades! A estação 118 traz tristezas e sustos, mas também sorrisos dos que não se detêm por isso. Dói, mas levante-se e embarque. O trem vai partir.


Poucos dias depois, o segundo luto. Robert desce do Peterbilt, sente-se um pouco tonto, vai ter com a esposa, mas cai morto a poucos passos dela. Enya tenta acolher a mãe e ligar para os irmãos ao mesmo tempo (...) Não é por já esperarem que isso acontecesse a qualquer momento (...) que eles não ficam arrasados. Cabe a Renata e Marcia controlar a situação, como sempre tem sido. Ele não se foi como esperava, quando os filhos eram crianças. Esperava ter um cantinho onde desfrutaria com Norma da magra aposentadoria que estava preparando (...) Queria ver Bobby em uma profissão de futuro e Rebeca com um homem que soubesse lidar com sua índole agressiva. Nunca em sua vida corrosiva, imaginou que viveria suas últimas três décadas na maré mansa. Estava voltando justo de uma roda de amigos caminhoneiros, com quem conversava sobre a vida de nababo que seus filhos lhe davam (...) Uma caravana de cinqüenta caminhões acompanha o cortejo. Na frente o Fletwood 1931 com Patrícia ao volante, levando Norma e filhos para a despedida. O caixão desce ao som de choro, dos presentes e das buzinas dos caminhões.

Ele resistiu bem mais do que todos esperavam (...) Foi um marido dedicado e carinhoso, conseguiu preencher a falta diária de Rebeca até adoptarem Enya. Na volta para casa, os irmãos conversam sobre a mãe. Enya não pretende mesmo sair daquela casa, mas viaja muito a trabalho. Os próximos ensaios foram adiados por uma semana por causa do luto, mas terá que viajar. É hora de arranjar uma acompanhante para a mãe (...) O problema é ela não ter parentes vivos. Encontram a solução temporária entre seus fãs, três estudantes universitários se mudam para lá já no terceiro dia, cientes da responsabilidade que têm diante de todo o universo dos ghost drivers, e da economia que terão com alimentação e hospedagem.

Enya tem tempo para ensiná-los a lidar com a mãe, com Crazy Kurt e os cuidados que devem ter com a imprensa. Apesar do coração apertado, por deixar a mãe ainda enlutada, trabalha mais tranqüila. Na volta encontra Norma enturmada com aqueles garotos. O sangue novo ajudou muito na sua recuperação (...) Rebeca e Robert fazem questão de assistir aqueles fãs tão prestativos (...) Os pais dos universitários ficam felizes de poderem cortar pela metade as remessas que pretendiam fazer.

&

Prudence ainda estranha o mundo. Se acostumou a Sunshadow (...) Los Angeles é uma coisa assustadora! A menina se sente perdida, tem medo de se afastar dos pais, mas eles sabem que as filhas precisam se acostumar a enfrentar o mundo (...) Patrícia usa um vestidinho preto simples de botões laterais, inspirado no feito em 1965 por Pierre Cardin. A família vai ao escritório central, onde Melinda espera com Aubrey e um lanche reforçado. Atrás deles uma horda de paparazzi registrando um momento relativamente raro (...) Irmã e prima levam a estreante para a pracinha do jardim privativo (...)...

- Bee, Betty, que lugar doido é esse?

- É a cidade grande, irmã.

- É o palco maior das ilusões, a sombra mórbida de seu auge, o zumbí errante do sucesso perdido, a esfinge insaciável por sonhos de inocentes, esta é Los Angeles! Eu adoro essa zorra... Tá assustada?

- Ela está, Bee. Infelizmente terá que enfrentar este mundo, meu amor. Sunshadow é um pequeno paraíso, este aqui é o mundo real. É por isso que trouxemos vocês enquanto ainda são crianças, conosco vocês estão seguras e poderão aprender as coisas da vida sem medo. Vem comigo, vamos dar uma volta por Hollywood.

Imediatamente um dos funcionários avisa tanto à organização quanto, não riam, à “Guarda Imperial de Sua Majestade Patrícia de Sunshadow”. Embora não saiba, Prudence está usando uma réplica multicolorida dos vestidinhos minimalistas do último terço dos anos sessenta, de tecido leve e fresco. A mãe lhe mostra algo similar a Sunshadow, a grande quantidade de carros antigos (...) isso ajuda a aliviar o nervosismo da menina. Voltam para Sunshadow à noite, após uma passada no Jose’s Hotel. Na manhã seguinte, após os exercícios matinais, os cinco casais se reúnem para tratar das reações de seus pimpolhos, exceto Robert e Mikomi, eles apenas ouvem. A rejeição unicamente de Prudence à cidade é destaque.

Em Washington, Richard assiste à cena mais esperada pela organização nos últimos anos. Lionel Krumb viu descer ao túmulo o último desafeto que travava suas promoções, por causa de sua simpatia pela organização (...) Hoje o presidente prende com prazer a estrelinha e Nelson tem um companheiro para sua senda. O General Krumb presta continência, é dispensado e vai para a festa, diante de vários desafetos ainda vivos no Pentágono, que de agora em diante lhe devem obediência e respeito (...)...

- Ritchie, pode arranjar uma casa pra mim em Sunshadow? Acho que agora eu mereço!

- Mandarei meu neto ver isso agora mesmo.

Uma casa ampla e charmosa, na estrada para a Culture Train, edificada em 1910, deve servir. Ele se muda uma semana depois (...) Não demora para alguém se lembrar que ele teve contacto directo com os garotos em seu primeiro dia de fama...

- Declarações, General Krumb!

- Mas eu já declarei, pergunte à receita federal!

- Sobre o primeiro dia de fama do Dead Train! Como foi que aconteceu?

- Well... Foi um gesto de cavalheirismo de Richard para com a hoje minha esposa... Como vou contar isso? Certo...

A fama trinta anos depois. Nelson desata a rir, quando o vê pela televisão, todo desengonçado a dar as declarações (...) quase enfartou quando perguntaram se Patrícia já era agente secreta, na época.

&

Quando todos os desastres do ano pareciam já ter acontecido, a organização fica em polvorosa, Patrícia se tranca sozinha e rapidamente na biblioteca, com ordens para não ser importunada sob hipótese alguma (...) Yitzhak Rabin foi assassinado justo por um judeu, durante um pronunciamento público. Ela avisou reiteradas vezes, mas eles disseram que estava tudo sob controle (...) então baixaram a guarda para seus próprios radicais. Conseguem que Arafat mude pontos sutís, mas cruciais da rotina da segurança, que assim detém um radical que estava acima de qualquer suspeita.

O trabalho em conjunto com a CIA é extenuante, são dezenas de ligações, e-mails, um olho na televisão e outro nos jornais que já têm páginas virtuais, sete idiomas praticamente simultâneos e um estresse absurdo. Seu trabalho vara a noite e só termina quando os outros concluíram os exercícios diários. Richard vai à filha, que acaba de abrir a porta, está visivelmente desgastada e exausta...

- Minha filha!

- Estou bem, daddy. Evitamos o pior...

- Vem cá.

Ela se despe da armadura de Princess e se deixa acolher por seu velho e ainda monstruoso pai. Ele, Arthur, Rebeca e Richard sabem exatacmente o que ela fez, por isso mesmo ficam pasmos em ter conseguido fazê-lo e ainda sair andando daquela biblioteca. Era uma guerra que eles queriam, pois foi uma guerra que ela lhes negou. Star não poderia simplesmente interromper um trabalho de extrema gravidade, seria como interromper uma cirurgia cardíaca com o coração aberto, mas agora toma as rédeas de suas mãos e ordena que descanse da organização (...) Nelson pede a Krumb que espere ela ter algumas horas de sono, para transmitir a gratidão da Casa Branca. Dorme com Arthur sentado ao lado, segurando sua mão.

O inverno se anuncia com a tensão dando o tom, porque a ruptura que esperavam para o fim do século aconteceu agora (...) O alívio vem com o lançamento do Open Sunshadow (...) um resumo ricamente ilustrado e repleto de referências dos anos de pesquisas de Zigfrida e sua equipe. A capa é criação de Renata, mostra uma mulher comum abrindo uma janela no peito e mostrando sua cópia, com alguns adereços a mais e melhor arrumada, mas a rigor sua cópia. Os detratores da cidade se apressam em comprar e logo Tobby faz dele o tema principal do programa...

- É um trabalho científico por excelência, mas longe de ser chato, algumas passagens são hilárias!

A sueca não pôde deixar de colocar seu humor corrosivo em algumas passagens, que citam supostas pesquisas de detratores que jamais as publicaram, mas são citadas em todas as entrevistas. As mensagens cifradas ocupam quase um terço do livro (...) para que todos os colaboradores tenham acesso às novas orientações.

O inverno chega com os seis voltando do último show do ano, que tirou as últimas rugas da testa de Patrícia. Ela precisa da música, é o que mantém sua sanidade no lugar (...) Pelo menos conseguiu trazer um Fusca Itamar vermelho a álcool, que dará à mãe no natal. Lhe daria a Volkswagen inteira, tem cacife para isso, se ela ainda fabricasse Volkswagens (...) Enquanto eles esfriam, os ânimos esquentam entre os novos inimigos de Zigtrida Fälkstaden, alguns dos quais literalmente mastigam o livro de tanta raiva. Se apressam em procurar literaturas que o desmintam.

&

Os Richards encontram a solução. A estrutura da casa é de toras bem ancoradas entre si, então é viável montar um chassi, como em um trailer, e assim permitir as escavações, para ver o que afinal está enterrado debaixo da sede da fazenda (...) entregam a empreitada a um engenheiro de confiança, porque eles estão assoberbados de trabalho, a começar pelo nó que a Chevrolet deu, ao anunciar o EV1. O carro é uma beleza (...) a forma de aquisição é que despertou desconfianças, principalmente no sunshadower. O velho Gardner foi enfático com o vendedor que lhe ofereceu um...

- Se eu levar um para casa e tentarem tomá-lo depois, alguém vai comer chumbo quente!

E desistiram da oferta. Ele entrou em seu Corvette Stingray preto 1973 convertido, e saiu cantando pneus com os 200HP instantâneos de cada um. A autonomia é relativamente curta, cabe pouca bateria de chumbo em um puro-sangue, mas 160 milhas dão e sobram para a região. Ele tem mais o que fazer do que acreditar em mais uma lorota (...) como acertar o fornecimento de novas ligas para seus compressores, deixou o neto cuidando do assunto até voltar...

- Quer dizer que nem pagando o dobro o carro seria seu? O que foi com eles? O trauma de terem sido derrotados quando disseram a verdade ainda persiste?

- O caso Corvair foi vergonhoso, mas não acredito que seja só isso. Eles têm usado demais o testosterona como argumento de vendas, um carro que não polui e não incomoda os ouvidos, vai contra a cabecinha do público que conseguiram com isso. Conseguiu algo?

Marcia acaba tendo que ajudar o marido, para ele não ficar sobrecarregado com os assuntos da Culture Train e de salvação do mundo. Lá está Phoebe (...) Molibidênio, Vanádio, Tungstênio e Nióbio entram rapidamente para o seu vocabulário. Os quatro voltam para casa, mas os adultos não ficarão alheios aos assuntos da fábrica (...) para isso têm seus celulares. Esses aparelhos (...) têm sido fonte de polêmica comportamental (...) símbolo de ostentação cafona, bem como de guerra nos bastidores do show business. São poucos os famosos cujos números não são conhecidos pelos fofoqueiros, os do Dead Train, por exemplo...

- Nem que a vaca tussa! Vocês têm os telephones do escritório, não precisam dos nossos.

Renata está irredutível. Segue para a Máquina de Costura, onde todos têm histórias correlatas, o assédio dos colunistas para terem seus números de celular, está ficando perigoso...

- Um deles abordou a Proo, na volta das aulas, propondo troca de números de celular. Por sorte Betty é grudada nela e logo a tirou de perto. Rê, depois falaremos com o Matt, a imprensa está ficando muito atrevida e perigosa pra gente, especialmente para a nossa neta.

As duas recebem neste momento, ligações de seus rebentos, com a notícia “Mon, Phoebe is plaing the piano!”, respondendo “But she still is a baby!”...

- Rê! O que tá acontecendo com Little Phee?

- Eu sei lá? Esse grau de talento só deveria se manifestar depois dos seis anos!

- Cosa è sucesso a lei?

- Enzo, a Phoebe tá tocando piano... Eu ouvi aquelas mãozinhas redondas dedilhando o piano!

Rebeca põe a mão na testa da goiana aflita, depois lidera a turma à casa dos pais aflitos (...) No que permitem seus bracinhos curtos e suas mãozinhas de boneca, a menina toca “Balada Por Elise” (...) Chamam urgente a professora Nancy, ela saberá o que fazer... Esperam...

- Deus... Meu Deus... Você não quer mesmo esperar ter tamanho de gente, não é? Ok, foi você quem pediu. Steph, é a sua primeira aluna, pode começar agora.

A menina treme, mas seus olhos brilham como nunca. Estrala as mãos, põe a prima no colo e a orienta. Marcia começa a ter um fio de esperança, porque é uma criança educando outra, então as linguagens não são muito distantes (...) Olha para o marido com cara de “A culpa é sua”...

- Minha? Por quê?

- Você sabe tudo, entende de tudo, sabe fazer de tudo! Tem que ter alguma coisa nos seus genes que copia e cola intelecto! Você, sua mãe, seu avô, a sua bisavó... Se bem que ela não é mãe dele...

- Ah, é isso... Ufa! Vó...

- Não se preocupe, meu amor, vamos cuidar da pequenina como eu cuidei de sua mãe. Marcia, peça desculpas à sua tia Patty, sua bronca pode ter sido elogiosa, mas foi uma bronca e foi injusta.

Nancy foi sua professora, como foi de sua mãe, de sua tia e agora é de sua filha. Ela a encara como fazia na época da sala de aula. A jovem se aproxima da sogra, cabisbaixa, mas ganha um abraço antes de conseguir parar de gaguejar. Ela se acostumou a ter o controle da situação, sempre conseguiu contornar os problemas (...) agora justamente sua filha ameaçava inverter a situação e subjugá-la. Foi desesperador!

&

Matthew volta de New York após um mês de incêndios criminosos, e de dar alguns sopapos em sujeitos que tentavam assediar sua neta para conseguir informações sobre sua esposa. Sua linda, escultural, maravilhosa, sua sexy voice wife o espera em Sunshadow (...) Também quer ver por si o que falaram de Phoebe...

- Rê, quê que estão dando pra essa menina comer?

- O Seu Richard acha que ela é o próximo passo da evolução da espécie. Já notou que ela praticamente não se cansa e quase não sente frio?

- Se aqueles ufólogos descobrem isso... Deus me livre!

- Não vão, Matthew, eu asseguro.

Josephine entra na casa, iluminando tudo ao dedor. Ela quer mesmo falar com os dois e a presença da pequena não é entrave, ela é uma de seus afilhados (...) Pega a criança nos braços e leva os três à Máquina de Costura. É clara com os quatro, não quer descontroles diante dela, quer ser avisada a qualquer dificuldade dos jovens pais com os progressos de Phoebe, e não menos importante, quer mais visitas (...) Vai suplementar o trabalho de Nancy, mas para isso precisa ter a menina por perto com alguma freqüência, de preferência muita freqüência.

Lá fora a imprensa se amontoa para ver Jose de Lane após quase um ano sem aparecer (...) Tudo se complica quando os outros quatro casais chegam para pedir bênção à sua protetora. As cortinas da frente permanecem fechadas durante toda a visita. Na saída ela diz que foi puxar orelhas dos pupilos ausentes. Meia verdade. Na realidade colocou a organização de olho em Phoebe, Patrícia e Rebeca compreenderam (...) estará muito mais segura como colaboradora do que como uma cidadã comum que ela nunca conseguirá ser. No sábado lá está o jovem casal com seu rebento especial, a criança fica encantada com o palacete...

- Essa casa é maior do que Sunshadow, mamãe!

- É também sua casa, mon petit chérie. Ricky, queremos falar com você a sós. Marcia, é só um minuto e vamos encontrar vocês no deck. Encontrar sua mãe naquela estrada, foi a melhor coisa que já aconteceu à organização...

A diva explica ao rapaz, sem a autoridade de Star, das conclusões a que Zigfrida chegou (...) por mais que ela mesma tenha relutado em aceitar isso sobre sua afilhada. Ademais, cedo ou tarde essa genialidade toda ficará escancarada e ela vai precisar de quem a ajude a lidar com os revezes correlatos...

- Minha mãe já me dizia desde que eu era menino, que o mundo não perdoa quem é bom demais.

- E não vai perdoar Phoebe. Compreende minha preocupação? Podemos contar com você?

- O codinome dela será Angel. Já começaremos a acostumá-la à vida dura e a guardar segredos. Fazer o quê?

O jovem homenzarrão se levanta, abraça Josephine e Nelson e sai com eles à piscina, onde Marcia tem ataques de fofura, vendo a desenvoltura da herdeira na água. O restante do fim de semana é ameno, apenas com entretenimento, enquanto Open Sunshadow continua a eriçar pelos de intelectuais teóricos (...) A convenção da banda coincide com uma campanha para banir o livro das escolas. Novamente tentando voltar e se firmar na fama, os Special Boys entram na campanha sem terem lido sequer o prefácio. Vivendo de empregos comuns, às vezes tocando para pequenas platéias, eles sentem falta do auge (...) Mas isso foi há décadas!

Do outro lado, os dezoito ídolos mundiais gozam do prestígio que construíram sobre rocha, os seis em particular têm seus momentos de relaxamento, quando encarnam os fundadores da banda...

- Boa tarde, gente, muito obrigada por terem vindo. Hoje teremos uma apresentação especial... Charlie, deixe esse sintetizador aí e venha pra frente... Você ainda não sabe da maior que me contaram agorinha... A Dianna acaba de dar à luz três meninos!

O músico fica bobo, ri feito um pateta não sabe para onde. Agora é avô e carregado pelos comparsas pelo salão principal do centro de convenções (...) O Sunshadow Racer Motors Show reflete um pouco o pessimismo crescente, mas não nos números. A população vê nas oportunidades do evento, uma chance de sobreviver aos revezes que se avizinham. Encerram o ano da banda com uma confraternização na Máquina de Costura, para celebrar terem todos saído vivos da encrenca.

0 comentários: