quinta-feira, 16 de maio de 2019

Dead Train in the rain CCXLVIII

    Com lama ou neve, esperança vive: A estação 248 mancha um ano que já estava sujo, mas lhe dá um tapa gelado na cada. Embarquem, o trem vai partir.


No dia marcado, lá estão eles com suas maquetes ricamente detalhadas. Os dois engenheiros se dão bom dia querendo um pular no pescoço do outro, mas aqui precisam manter a civilidade (...) Quando entram no auditório sete do centro de convenções e, em vez de apenas os integrantes da banda, vêem uma multidão e no meio dela está Jose De Lane; tremem nas bases. Agora um ampara o outro e seus sorrisos ficam mais tímidos (...) Nos baús sobre rodas estão os modelos prometidos, com todos os elementos que Patrícia exigiu para que fossem apreciados.

Os Richards se adiantam para coloca-los sobre as bases no palco, são um pouco pesados para aqueles dois (...) Os engenheiros mecânicos abrem e têm a gratificação nas expressões dos mais de duzentos presentes. Com cerca de 55” de comprimento, o que significa 220” nos modelos reais, eles têm diante de si dois legítimos american full size cars cheios de personalidade. O Lincoln um tanto contido, quase com medo de ser ultra luxuoso, mas por isso mesmo tem seu charme. Os representantes explicam com projeções dos tablets no telão as opções, configurações, milhares de cores, tons e combinações, interiores dos mais diversos, várias rodas, enfim, tudo o que carros que levarão de três a quatro meses para ficarem prontos (...) podem oferecer.

Patrícia, Phoebe, Sandra e os Richards cuidam de traduzir aos outros os termos técnicos mais sofisticados, e explicar como aquilo pode fazer alguma diferença no carro. A apresentação, com direito a um buffet que os dois não esperavam, era para despertar curiosidade e conseguir intenções de compra (...) recebem dez mil pré-encomendas, para quando os protótipos definitivos estiverem prontos. Nenhum pretende investir menos do que trezentos mil dólares em cada carro, então os rostos daqueles dois se acendem como quando conseguiram seus empregos, antes de descobrirem o massacre que teriam pela frente.

Agora vão ao buffet, com direito a photos, filmagens e um ambiente de evento da alta sociedade. Os dois voltam a Detroit recebidos como heróis, com as pré-encomendas assinadas estufando suas maletas, e um cheque gordo cada um. As miniaturas ficaram com Patrícia, que agora se prepara com sua família pra a próxima festividade.

O halloween tem um gosto especial (...) a gestação de Sandra está a todo vapor e na mais santa paz, apesar de seu pavio curto, ajudando a acalmar Fabrícia. A encrenqueira tem sido mantida calma, apesar dos percalços do ano. Amhrán na Farraige observa todo aquele folguedo com atenção, algumas pessoas estão revelando suas sombras nas fantasias que usam. É bom se revelarem em uma brincadeira, pode assim prevenir-se para quando ficarem realmente vulneráveis. Reconhece brincadeiras de elementais nas crianças que batem às portas pedindo doces, para não fazerem travessuras.

Elias volta para casa entre monstros e aliens, entre estes teóricos dos antigos astronautas que têm uma boa chance de estudar os híbridos. Lá vem uma deles, Elizabeth em um maiô de vampira com Gregory de Drácula e Colleen de lobinha (...) Detectam alguma coisa, mas são sinais difusos, o suficiente porém para tirarem conclusões... era só Phoebe passando por detrás deles, com um gerador de interferências para interceptar e controlar drones invasores. Ela reconhece um deles e vai dar as boas vindas, fazendo um dos leitores disparar seus registros. Ela reconhece aqueles aplicativos e pede desculpas...

- Esses drones de fora viraram pragas, precisamos de um modo de controlar e este foi o meio que encontrei. Sugiro que recalibrem seus equipamentos para evitar interferências... Aqui está senha...

Eles entendem. Com um misto de alívio e frustração (...) Agora, para como ela os reconheceu, só têm uma resposta: os aliens.

O tempo e os últimos shows da banda passam. A temperatura começa a recuar e as bebidas quentes ficam mais atraentes (...) As coisas vão na toada mansa da dureza cotidiana, até o Brasil dar mais um presente à mídia, a barragem de uma mineradora se rompeu e o tsunami de rejeitos químicos devastou uma cidade inteira, não obstante ter tomado um rio e estar a caminho do oceano, intoxicando e matando tudo o que encontra pelo caminho. Renata cai no sofá em estado de choque, já percebendo a agonia das vítimas. Naomi a puxa com urgência para a casa religiosa, aonde estão indo também Marcia, Phoebe e os outros médiuns. O trabalho neste ano tem sido incomparavelmente mais duro, Marcia que o diga, o próximo já ligou avisando que será pior.

Patrícia apenas suspira. Tem gente do governo brasileiro com essa lama até o pescoço. Recebe de colaboradores informações que a imprensa brasileira não dá, pensa um pouco e autoriza-os a fritar todo mundo (...) Vai à internet privativa da cidade e torna o sunshadower ciente de tudo o que pode saber (...) Vai ver como estão as meninas (...) Aisha cuidou de acalmar os ânimos e enxugar algumas lágrimas.

O dia de ação de graças tem um quê de velório, porque sabem que muitas crianças morreram naquela tragédia, e muitas vão adoecer gravemente com o tempo, pela intoxicação. O tom da ceia é mais sóbrio em toda Sunshadow. As crianças da fundação passam o feriado com famílias, algumas na Máquina de Costura. Patrícia não consegue deixar de pensar que aqueles petizes poderiam estar debaixo daquele rejeito, se morassem na extinta cidade de Mariana.

Os dias dissipam em parte o choque da notícia e chega o dia de decorarem o diorama. É uma tarefa delicada, por conta do tamanho diminuto de cada ítem (...) Concluida a extenuante montagem, Patrícia religa a energia e tudo volta a funcionar, para a alegria da gata que persegue os trens (...) Lá fora a neve manda notícias, avisa que não demora a deixar todo mundo preso em casa.

Por telephonia sabem que algumas crianças não quiseram esperar o tempo regulamentar e decidiram nascer hoje, uma delas faz Patrícia sair à maternidade para reclamar seu novo afilhado. Volta toda pimpona e cheia de energia, puxa Arthur e vão ambos providenciar sua primeira contribuição de boas vindas para o menino. Voltam à noite, já falando dos filhos de Darifa e de Abigail. Liga para elas, não importa o motivo, simplesmente quer ligar, falar com elas e estreitar os laços familiares (...) Quando vai dormir, já ligou para pelo menos cinqüenta pessoas, inclusive Zigfrida, que aproveitou para notar na voz da diva sua boa recuperação em andamento.

&

A noite da véspera de natal tem uma cena triste, que por pouco não se torna trágica. Norma acorda assustada para ver Robert Richard, mas ele está bem. Enya se levanta e acaba acordando Elias (...) Mas ela ouviu uma criança chorando e agora os dois também, e vem lá de fora. Ele liga o monitor, vê e se apressa em ir acudir. Recolhe uma jovem quase morta por hipotermia, com um bebê enrolado em trapos (...) Os primeiros socorros são feitos lá mesmo e rumam com urgência para o hospital. A jovem, ainda adolescente, quando consegue acordar e vê Elias, simplesmente diz “Cuida da minha filha pra mim” em tom de súplica, prestes a chorar. Não precisam de muito tempo para descobrirem do que se trata, a garota de quinze anos é filha de pastores radicais e foi expulsa de casa quando deu à luz, nua. Ela caminhou de Summerfields até Sunshadow protegida por apenas um cobertor e tênis velhos que conseguiu em uma lixeira, sob uma nevasca terrível, para evitar que parentes cumprissem a promessa de vingar na criança a “desonra contra as leis de deus”. Chegou a ter certeza de que morreria...

- Vocês duas ficam conosco. Pode me chamar de papai – diz Elias.

- Mamma Buzzy, pode nos providenciar as provas para o processo de adoção?

Meio que sem acreditar no que está ouvindo, ela lhes repassa o que a breve investigação conseguiu. Norma sabe que a filha não vai se importar em seu quarto ser ocupado por uma sobrinha acidental. A garota chora copiosamente, é levada para receber os cuidados restantes em casa, o que inclui alimentação decente. Adele finalmente consegue dar leite suficiente para a pequenina sem nome...

- Pode ser Hope?

Se viram e lá está Robert Richard (...) É meio tarde para voltarem a dormir, exceto ele, que volta para a cama assim que as apresentações são feitas. Os adultos ainda têm muito o que fazer pela garota, ouvir tudo o que ela tem a dizer é uma delas, para saberem com quem estão realmente lidando.

Quando o dia raia, meio embaçado pelas nuvens, a casa é simplesmente invadida por gente que soube em primeira mão da novidade por Beatrix. A banda inteira mais consortes, Nancy, Richard, Kurt, Lidia, Fabrícia, Ana Clara e Elisa entram como quem nunca precisou se anunciar. Patrícia já pergunta preventivamente onde estão suas novas afilhadas. Norma pede que se sentem, a história é longa e revoltante. E revolta mesmo! Rebeca precisa ser contida (...) manda-la com um bebê para a morte certa foi o cúmulo. Mas por que ela bateu justamente àquela porta?

- Orei por minha filha e Deus me disse que eu seria recebida aqui.

Olham para Renata (...) Ela pede um minuto, enquanto lhe dão instruções. Terminado, se volta para o primo e avisa “Cuida, que a filha é sua (...) Por agora improvisam uma festa de boas vindas, mas sem direito a jogar na piscina, está congelada. Depois saem para comprar os presentes da novata.

Pela manhã Sandra e Kurt levam seus pequenos para conhecerem a nova tia e a nova prima, presentes antecipados, dizem aos petizes. Aos poucos, quase letargicamente, a garota se dá conta de que foi adoptada por lendas vivas, que está em Sunshadow e sua madrinha é ninguém menos do que Patrícia Petty. No fim da tarde Renata aparece de novo, convidando todo mundo para o último culto do ano. Para Adele será uma novidade, qualquer referência religiosa que não fosse de sua igreja era censurada. A Pontiac 1969 mostra aqui o valor de seu extenso corpo (...) A surpresa vem quando a garota começa a cumprimentar pessoas que a maioria não vê, é chamada à mesa e se choca ao descobrir que é médium. Em sua antiga família seria espancada para “expulsar o demônio”, aqui é recebida e tem orientações para lidar com algo que nunca tinha percebido...

- Você pagou o que devia com o bônus de ter sobrevivido, graças ao amor contagioso de seu pai. Se você quiser servir ao Cristo incondicionalmente amoroso, lhe oferecemos a chance agora.

Ela aceita e o guia pede que Renata pessoalmente a instrua, depois se despede e deixa o corpo de Marcia. Ela detesta ter que ceder o corpo, ficaria furiosa se não lhe dissessem que Adele vai ajuda-la em sua sina. O humor muda na hora, ela fica quase eufórica.

O restinho de ano transcorre na normalidade, com o mundo lá fora desabando, tragédias acontecendo, americanos estúpidos querendo fazer o mesmo em território americano, idiotas querendo que o governo viva de brisa e mantenha os serviços essenciais sem receber impostos, enfim, coisas que ajudam muito a atrapalhar uma nação.

A cidade subterrânea ferve (...) Adele acompanha Norma, Enya e Robert Richard, com Hope nos braços. Aquilo tudo é encantador, ter sido proibida de olhar para Sunshadow, quando iam para Detroit, faz as duas pensarem que ela vivia em um hospício (...) voltam à entrada para a superfície e vão para casa. Elias está conectado com Sandra e Kurt, para gerenciar os negócios de casa, como a madrinha ordenou (...) precisa atender gente do mundo inteiro e em alguns lugares é alto verão. Sabendo disso e raciocinando um pouco, Adele conclui...

- Mas se a Terra é plana, como pode haver mais de uma estação ao mesmo tempo? Ou não é plana?

- Nem plana, nem regular, minha filha – responde o homem. Estou agora ajudando um gerente na Austrália, lá eles estão encerrando o expediente, é noite.

Ela entra momentaneamente em parafuso, mas se lembra do que o guia lhe disse, a época da ignorância passou, é um luxo que não pode mais se dar. Norma lhe entrega um exemplar de “Parables of Elias” para ela conhecer o pai que tem agora. Os novos irmãos estão ouvindo, ela transmitindo à madrinha o que se passa...

- Meu pai vai amar saber disso!

E liga para Richard, que acende um led de alta potência para São Tesla em favor de Elias. A cabecinha da garota começa a rachar a carapaça dura e crescer (...) Lá fora alguns paparazzi se perguntam quem é aquela garota que não conseguiram photographar.

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