A idade da responsabilidade. A estação 101 mostra a rapidez com que os filhos crescem, um perigo para pais descuidados. Fiquem atentos e embarquem, o trem vai partir.
A rotina mudou
bastante, mas a essência é a mesma. Enya nunca teve vida mole na fundação (...) A diferença é que agora
cuida de seu lar, seus pais e às vezes dos sobrinhos pequenos. A pele levemente
corada da magricela toma conta da casa, que agora permanece limpa sem Norma e
Robert precisarem mover um dedo. Rebeca e Robert ficam muito mais tranqüilos (...) O primeiro compromisso oficial
é o planejamento para comemorar os vinte e cinco anos de uma banda que muita
gente pensou não ir além do verão de 1963, mas hoje é uma corporação e uma das
maiores empresas de capital fechado do mundo. Novamente terão repórteres da
revista os seguindo para quase todos os lados (...) Fecham o acordo e a parceria oficial está retomada.
Saem ao hall do
escritório central, onde uma multidão aguarda por novidades, enquanto os
Richards actualizam o website e deixam o mundo artístico em polvorosa. Antes
que aquela turba derrube tudo, Patrícia toma a palavra...
- Senhoras e
senhores, boa tarde. Janeiro, vinte e sete, 1986, uma dura segunda-feira.
Começa hoje a maratona preparativa para os vinte e cinco anos da Dead Train. A
Life Magazine novamente vai nos acompanhar nestes dois anos, para lançar uma edição
comemorativa.
- Haverá uma
turnê temática?
- Haverá. Vamos
rodar o mundo nestes dois anos, mas não naquele ritmo louco de 1964.
As perguntas
sobre parcerias para shows conjuntos têm positivas (...) Desta vez permitem que especulem tudo, tanto que até chegam a Enya. A garota vê
pela televisão o assédio e seu nome até então desconhecido ser citado. Rebeca e
Robert falam com cuidado da irmã, dizem que a conhecem desde que era uma
menininha e que ela sempre foi tratada como alguém da família...
- Ela pretende
seguir a carreira musical?
- Hey, Mortimer,
vai com calma! Ela ainda está se acostumando a ter uma família – diz Rebeca.
- Ela poderia
ser entrevistada?
- Poderia, mas
dá um tempo.
Do escritório
vão para o Jose’s Hotel, onde detalhes paralelos das comemorações os aguardam.
A idéia de um romance documentário foi abandonada (...) não conseguiram encontrar um elenco que pudesse
ao menos lembrar o sexteto. Fica para outra ocasião, por hora tratam com a diva
sobre o documentário em seis episódios que Bart e Tobby estão preparando (...) Aqui vai uma dose de sensibilidade por causa de
Patrícia, que de longe teve a infância mais traumática. A dúvida fica por conta
da menção às famílias, que queiram ou não são celebridades nas mídias.
Terminam tudo no
fim da tarde e voltam para Sunshadow (...) Encontram justamente suas famílias dando declarações com muito
cuidado (...) Vão
tratar de ajudá-los a lidar com aqueles sujeitos. Até a noite eles conseguem se
desvencilhar e podem se ocupar de suas particularidades. Todos, menos Matthew,
que faz questão de averiguar o que foi colhido e o que farão com aquelas
informações, não gostou de terem abordado sua filha, menos ainda de essa
abordagem ter abortado um beijo em pleno andamento. Richard ficou muito bravo,
precisou contar até cem para não dar uns tapas no paparazzo. O rapaz já foi
empossado como webmaster da banda (...) agora é um homem sério e a namorada não esconde seu
contentamento...
- Você acha que a gente não deu
descanso pra ele por quê, Marcia? Esse tempo todo ele, assim como todos vocês,
tem sido preparado pra assumir os negócios da banda. Não vamos confiar o
comando da corporação a gente de fora.
- Mas já estão pensando nisso??
- E você ainda vai ter que assumir a
parte chata do meu trabalho no jornal. Lembra-se? Temos 35% das ações!
- Mas eu estudo psicologia, não
administração.
- Eu sou cantora, estudei psicologia e
co-administro nossos negócios. Hello, ninguém disse que você precisa abandonar
sua vocação. Eu não abandonei a minha. Aliás, você já está acostumada a
conciliar muitas actividades; na casa religiosa, na fundação, a faculdade,
nesta casa, consolar o Ricky... Por que está preocupada agora?
- Porque eu ainda não tinha me dado
conta... Eu não tinha percebido o quanto sou ocupada.
- Você e todas as crianças de
Sunshadow, querida. Sabe que mais? Você deu conta do recado. Matt, mostre um
pouco do seu trabalho. Ela precisa aprender a falar tudo sem dizer nada da
própria vida, vai precisar antes do que imagina.
- Ok, vamos começar pela encrenca
desta semana, com o anúncio oficial dos preparativos para as comemorações dos
vinte e cinco anos da Dead Train, que eu acompanho desde o início, diga-se de
passagem...
Ele mostra um encadernado com
fluxogramas e estatísticas pelos quais se orienta, e a partir deles fez um mapa
com lugares, nomes e níveis de periculosidade (...) Só Eddie e Amilton ainda
poupam a filha, pois é um bebê que perambula entre um tombo e outro pela casa,
mas mesmo assim Glenda se acostumou a ver todos fazendo alguma coisa ao longo
do dia (...) Vão visitar os avós maternos (...) com a moça vendo bolinhas felpudas
cor de rosa que tocam violinos de lavanda, com a filha bababdo em seu ombro (...) Encontram o casal ocupado no Nash, passando o aspirador e
conferindo as condições de um carro de baixa milhagem, que raramente pega a
estrada. Eles festejam com vontade a visita (...) Renata aparece com sua família particular, para
participar do ambiente festivo. Às vezes ela olha para aquele sedanete e pensa
como teria sido, se tivessem escolhido ficar em Detroit.
&
Patrícia levanta a mão esquerda, faz a
contagem regressiva e o ensaio começa com a banda completa. A polifonia suave
inicia a canção que vai para o próximo álbum. O estilo é bem próximo ao new
age (...) Eles não
conseguem fazer uma canção à toa, quando se dão conta, há um puxão de orelha
embutido na letra, mesmo que subliminar...
-
...And behind the mask what you don’t now if is the king or the fool...
O tom medieval fica por conta de Enzo,
o mestre da guitarra, que consegue um som de alaúde metalizado (...) Desta vez estão
no estúdio construído para as actividades da banda, o centro de convenções está
sempre muito ocupado, até demais para o sossego de que precisam, mas não deixa
de ser um bom sinal (...) Assim que finalizam, abrem a porta e mandam as
aspirantes entrarem. Karen, Greta, Mirtle e Sakura estão absolutamente
familiarizadas com aqueles músicos e àquele tipo de ambiente, mas agora a
situação é outra (...) Estão tímidas, aquele é seu primeiro ensaio com uma das
bandas mais prestigiadas do mundo, um grupo de dezoito pessoas que são lendas
do pop rock, qualquer um deles faz cansado e com sono o que a maioria não faz
em sua melhor forma.
Fica a cargo de Enzo e Robert ajustar
e equalizar as quatro (...) Os dois combinam
os movimentos, sincronizam e dão uma de maestros, corrigem, apuram, depuram e
pedem que cantem algo por si, as quatro juntas e depois cada uma. Voltam a
corrigir, avisam o que está errado e repetem, então elas estão prontas para
cantar com Rita, Madeleine e Gloria...
- Je ne suis pa un imbécile que vous
pouvez utilizer...
Agora é Patrícia quem coloca as coisas
no eixo. Ela corrige as sete no decorrer da cantoria, interrompe, manda
recomeçar e recomeça a corrigir, até estarem em harmonia...
- Ok, very good. Vocês quatro estão
prontas para começar a ensaiar com a gente. Quero que durmam cedo, evitem
gelados, não ponham uma gota de álcool na boca e moderem na alimentação...
Recomendações válidas para quando começarem a tocar com a gente. WELLCOME TO
THE DEAD TRAIN!!!
As quatro são carregadas eufóricas
pelas dependências do estúdio, inclusive pelos pais babões. Matthew está lá,
photographando para a revista e os dois jornais. Em um mês embarcam para o
México e depois para Guantánamo. Há assuntos secretos aguardando Patrícia e
Rebeca, o que inclui levar para Los Angeles uma família que foi fuzilada pelo
regime, e agora começará vida nova (...) a tristeza de uma vida em uma ditadura que se intitula popular, eles
podem e farão questão de contar.
&
Os preparativos para a primeira viagem
foram concluídos com antecedência (...) Desta vez as novatas ficam, vão
mais seis meses de treino até ficarem prontas para o palco, sem contar que têm
compromissos para finalizar até estarem livres para viajar, a maioria deles é
acadêmica (...) Os seis titulares estão
no quartel general da banda, repassando as últimas recomendações...
- Evitar passeios desnecessários, que
o nível de poluição na Cidade do México é muito alto! Em certos pontos e
horários, é risco de asfixia e até contrair um câncer de pulmão. Dúvidas?
- Vocês vão salvar o mundo, durante a
viagem?
A sala se enche com os risos, Patrícia
responde assim que consegue respirar...
- Vamos, um bocado de vezes, Enzo. Mas
vocês não podem saber o que será... Na verdade haveria pânico, se a população
soubesse agora.
- Em 1992 a gente vai poder contar
algo pra vocês, até lá é sigilo sem apelação.
Viram-se para a porta, são os
Richards, com o avô anunciando a dupla marombada. Eles chamam Patrícia e Rebeca
para uma breve conversa sigilosa. Ricky (...) construiu uma câmera especial...
- Parece uma Canon normal... Quer
dizer, um pouco mais pesadinha...
- Gire o flash no sentido horário,
puxe-o e a segure por ele, como uma arma.
Ela acata a instrução do filho e uma
mira surge do outro lado (...) No corpo do flash um ressalto lateral faz as vezes de gatilho. Usa
munição calibre 32, sete balas, e até tira photos...
- Ah, meu filho... Vem pra mamãe!
Ele vai. Ela queria muito que o
rapazote tivesse uma vida civil comum (...) mas não deu. Paga pelo presente com beijos e afagos no rebento,
enquanto Richard Brain entrega outra para Rebeca. Sem querer ele deu sua
primeira contribuição para a organização, e é uma baita contribuição. Josephine
mescla o espanto com a ternura, ao saber da criação. É seu afilhado e tem muito
orgulho dele...
- Ricky, eu amo você. Não preciso
mesmo de um útero para me sentir mãe e avó.
- Que mecanismo sofisticado! Vi coisas
parecidas na guerra, mas isto é uma grande evolução!
- Tudo isso por minha causa, Nelson.
Meu menino é o máximo! Vamos armadas para a turnê e ninguém vai suspeitar.
- Vamos treinar tiro ainda hoje, irmã.
Temos que estar afiadas nestas armadilhas.
Treinam na academia da polícia de
Sunshadow, com a área de tiros fechada só para elas (...) Arthur volta da Flórida, onde conseguiu locações, com (...) um conteiner cheio de peças para o Cadillac ficar pronto
mais depressa. Ele também teme pela esposa, nessas missões, por isso não tem
palavras para agradecer seu hedeiro...
- Caramba! Vai dar pra terminar o
carro ainda neste ano! Valeu, pai!
- Eu é que agradeço, filho.
Abraça o rapaz, que em altura começa a
ultrapassá-lo, e em peso o ultrapassou há muito tempo com massa magra. A
convivência com o avô o expõe a esforços controlados e intensos (...) Princess comunica a Star que o codinome
do filho será Genius.
Voam poucas semanas depois, sendo
recebidos por um público apaixonado e ruidoso. Alguns fãs, sabendo que eles
gostam da série, vão vestidos de Chaves e Chapolin Colorado. Os compromissos
são, além do show, uma entrevista coletiva, um ensaio publicitário, um jantar
oficial, visita a uma emissora de televisão e salvar o mundo.
&
A coletiva está repleta de intrusos,
gente que não poderá fazer perguntas se não for convidada, mas terá material
para suas publicações nanicas. Com uma turnê de quase dois anos sobra tempo
para mais curiosidade, quase toda ela focada no passado da banda...
- Não! Eu não tive casos com artistas,
nem teria dado tempo! Arthur entrou na minha vida muito cedo.
- Então vocês foram fiéis? Quer dizer,
com toda a liberdade que é tolerada no mundo artístico...
- Há liberdades que não me convém.
Alguém lá atrás pergunta se a postura conservadora não destoa
do que cantam, novamente a líder precisa falar pela banda...
- Não somos conservadores, liberais,
uva, limão ou tutti-ffrutti, tudo isso é rótulo. Somos o que for preciso ser,
quando for preciso ser e enquanto for preciso ser. Leia direito nossa história,
ouça direito nossas letras e verá.
(...) Alguém fala de Lucille e pergunta se estão
gestando mais alguma pérola, no que Enzo e Robert tomam a palavra...
- Em breve teremos boas e belas
novidades.
- Vocês não perdem por esperar – diz o
diplomata.
As caras de felicidade dos dois
aumentam o suspense (...) A televisão mexicana
se esmera em fazer um breve histórico, comparando photographias das várias
fases da banda e convidando artistas locais para comentar. Também falam do concurso
quase pronto para cover...
- Temos pelo menos dezesseis pequenas
bandas mexicanas que só cantam Dead Train, uma delas já tem prestígio e shows
regulares. O que acham disso?
- Wow! Eu quero ver isso!
A colunista musical entrega uma fita
de vídeo e Patrícia coloca em um aparelho que há no palco. Os garotos do
Another Train são realmente bons, cantam ao vivo e são simpáticos com o
público. Quinze minutos depois, estão os seis em frente ao colégio (...) Decidiram isso na hora, se levantaram para
acompanhar a colunista e todo mundo foi atrás. Não é um colégio pobre, mas está
longe de ser o mais caro, o tipo de ambiente em que as discrepâncias e os
preconceitos ficam mais aflorados. Não é um prédio histórico, tampouco exala o
cheiro de tinta nova (...) Richard entra primeiro, arrancando suspiros das mexicanas, conversa com a
direção e eles entram para a surpresa.
Os alunos, em sala, não imaginam os
motivos de tanta gritaria lá fora, até o director entrar em uma delas, falar
com o professor de gramática e levar seis alunos consigo (...) são garotos
comuns; Uma loura baixinha, uma morena de cabelos fartamente escovados, outra
ainda com alguns traços indígenas, um rapaz bem moreno, um branquelo magro e um
que se parece com todo mundo. Na sala de música a banda aguarda os estudantes,
enquanto vê as condições em que eles começaram a cantar...
- Pablo foi o idealizador – diz um
professor. Faz uns três ou quatro anos que eles passam uma hora ou mais por dia
nesta sala, depois das aulas.
- Estão nos imitando no que interessa.
Como as famílias reagiram a isso?
- No começo, señora Gardner, eram
contra, mas eles fizeram algumas apresentações em um clube recreativo perto
daqui, creio que os cachês que levaram para casa persuadiram seus pais.
A conversa é interrompida pelo
director começando a se anunciar, mas sendo interrompido por gritos e choros (...) Rebeca pula detrás da
bateria e eles são acolhidos pelos ídolos, em um misto de felicidade e
desespero, porque ainda não se consideram prontos para conhecê-los e cantar
para eles...
- Deixe que nós decidamos isso. Venham
com a gente, vamos ensaiar um pouco.
Patrícia quase os mata do coração, mas eles conseguem
bravamente resistir à tentação de um desmaio. Afinam os instrumentos, as vozes,
sincronizam, corrigem e começam...
- I can wait you tonight, but I ill not
do. Take your bad ideas and go for your own way...
Aos poucos, com cutucões, eles começam
a se soltar (...) A animação e a competência com que a
líder conduz tudo, os faz esquecer um pouco que estão à presença de seus
ídolos, de uma das maiores e mais importantes bandas da história (...) que está transformando seis adolescentes
que cantam por trocados, em celebridades internacionais. Os pais dos garotos
recebem rapidamente propostas para apresentações e só então ficam sabendo do
que se passa no colégio.
0 comentários:
Postar um comentário