A imprensa tupiniquim. A estação 86 tem um tom mais ameno, mas também dores ainda não curadas. Embarquem com calma, o trem vai partir.
A primeira
entrevista para a imprensa brasileira seria um tumulto, não fosse Matthew
Tamasauskas. Ele precisa agir quase como em um internato(...) Tudo pronto, ele avisa e a banda pode
descer. Patrícia está muito bem humorada, tem a mãe à frente de tudo, seu filho
e seu marido na mesma suíte, as irmãs no mesmo hotel e uma missão muito mais
agradável do que o normal. Bom humor que se reflete na banda inteira, exceto em
Lucille, que pela primeira vez porá seu rostinho meigo na mira das câmeras;
Julia toma nota dessa tristeza, mas não tira conclusões por enquanto. Todos
posicionados, Matthew libera e eles começam na ordem estabelecida...
- Como a Renata
Rodrigues reagiu à tentativa de ser expatriada?
- Não, eu mesma
respondo. Foi horrível. Foi como se o chão sumisse. Talvez tivesse entrado em
depressão se a Patty não tivesse um plano B na ponta da língua; ela sempre tem
um.
- A promoção?
- Sim, também a
promoção de dez anos do Dead Train.
Eles não perdoam
pontos críticos e polêmicos (...) inimizades, as lendas, curiosidades sobre Sunshadow, a idéia de
trazerem suas famílias, a relação com Jose De Lane, mas também falam das piadas
de mau gosto com o nome de Mikomi; esmiúçam tudo o que podem no pouco tempo que
têm. O último pergunta sobre Lucille, Ronald se adianta, acolhendo a irmã...
- Sim, é ela
mesma. Ela está no coral porque tem capacidade para estar lá. Vocês verão no
show.
Deixam Matthew
cuidando das arestas, enquanto sobem de volta, Marina e Victoria meio
tristonhas por não terem mais a companhia e ajuda da amiga (...) Vão à piscina, depois à sesta
sagrada, para estarem inteiros na hora do show.
&
Richard faz um
sinal de positivo com a mão direita e encosta o indicador esquerdo na testa,
como se lembrasse de algo. É o sinal para deixar Patrícia mais tranqüila, o
rapaz que acompanhou os generais rebeldes já começou a receber o treinamento (...) Desce com os outros para o ônibus, o Morumbi já está
enchendo de ghost drivers. O Mercedes-Benz entra no estádio e a banda desce
diante dos fãs para o palco aberto, onde a visão de 360° dá uma experiência
totalmente nova (...) O alívio do público fica por conta de não ter que ouvir coisas como “Boa
noite, Brazil” saturado de sotaque de quem não sabe o que está dizendo, eles
dominam bem o português e saúdam o público com naturalidade...
- Boa noite,
gente! Obrigada por terem vindo, a nossa festa começa agora.
Começam com “Dead
Train”, depois “Forgotten” e “Hug Now”, então têm um momento de interação com
os fãs e continuam. Deborah os observa do camarim improvisado (...) se sente em casa com o tratamento
que tem recebido dos brasileiros e adorou as pechinchas. No intervalo eles vão
pelo gramado mesmo para o vestiário que normalmente fica lotado de marmanjos
suados, um deles gritando e soltando palavrões para empurrar os outros.
Comentam entre si que é um dos melhores públicos que já tiveram (...) Rebeca aproveita para amamentar, com a
cunhada e o marido paparicando os pequenos. Marcia acorda um pouco, olha
sonolenta para a mãe, abre um sorrisão enorme e volta a dormir. Sakura se
pendura em Robert assim que ele se aproxima, está empolgada com a experiência.
Karen quer saber que gente esquisita é aquela lá fora, arrancando uma
gargalhada dos pais. Patrícia recebe os cuidados da equipe que a tia comanda,
enquanto acolhe Richard. Nancy faz as gêmeas trabalharem, elas a ajudam a
verificar todo mundo (...) Elas
querem trabalhar nos bastidores, não querem? Então que comecem agora.
Voltam para a
última parte do show com banda e fãs devidamente reabastecidos. Chamam dois
para o palco, brincam e voltam a cantar (...) Amanhã cedo desembarcam no Rio de
Janeiro, precisam descansar para os compromissos que têm na Cidade Maravilhosa.
&
No avião mesmo
assistem aos noticiários e lêem os jornais paulistas. A imprensa foi muito
elogiosa (...) mas a atenção dada à Lucille a preocupa. Acompanhou Robert, como combinado,
agora a imprensa a chama de “mulata madrinha da bateria com voz de diva do
jazz”. Ela até gosta da idéia de uma carreira, mas não de ser comparada a
símbolos sexuais (...) O piloto avisa que descerão no Galeão em
alguns minutos e todos voltam para as poltronas, não necessariamente as que
ocupavam na decolagem.
Um público que
fala chiando os aguarda festivamente (...) Eles descem e são ovacionados, a crítica sobre o show em
São Paulo os entusiasmou. Mas, Deus! Como faz calor aqui! A luminosidade é
muito intensa, entram logo no ônibus, um Nielson Diplomata JO pintado nas cores
da banda, antes que fiquem cegos com a exposição repentina; Não sem antes fazer
a farra com os fãs, claro. Vão para o Copacabana Palace (...) O ônibus é seguido por dezenas de
carros e motocicletas, que têm acréscimos assim que chegam à Avenida Atlântica.
Lá está o mar, os banhistas se apressam para tentar tirar uma photo do ônibus
passando, pois os músicos facilitam muito (...) Infelizmente não será desta vez que
dividirão a areia com eles, estão viajando a trabalho.
O hotel os recebe
como suas majestades, com pompa e circunstância. Alguns artistas brasileiros se
preveniram e se hospedaram para enquanto estiverem na cidade. Sobem às suas
suítes e se aboletam, pelas próximas horas querem um pouco de privacidade com
suas famílias (...) Mas não se
furtam de aparecer nas sacadas, quando sabem que há uma multidão à sua espera.
Matthew até que gostaria de estar com eles, mas precisa esclarecer uma série de
dúvidas da imprensa local, uma delas é o motivo de terem trazido tanta gente ao
Brasil...
- Eu poderia dar
mil motivos, afirmar que eles queriam aproveitar as belezas naturais do Brasil,
mas a verdade é que nos demos conta de que somos pais de crianças pequenas, que
não podem simplesmente ser deixadas por um mês ou dois. Nancy veio porque é ela
quem manda e nós temos juízo suficiente para obedecer.
- A irmã do Ron,
ela vai seguir carreira?
- O nome dela é
Lucille. Sim, ela está sendo preparada para isso.
Não dura muito,
mas é muito maçante. Ele volta para sua família e a encontra descendo com os
outros para a piscina (...) O Dead Train todo relaxando à
piscina é uma oportunidade ímpar. Uma actriz que tenta sair de uma saia justa
por um flagrante extraconjugal, se aproxima de Renata e Matthew, que acabam de
sair da piscina com a pequerrucha, é a esperteza que ela demonstrou na água o
gancho para a abordagem...
- Que menina
esperta!
- Tão esperta que
nos fez trazê-la na turnê. Olá, sou Renata Rodrigues.
Estranha muito! É
ela a mega star no ambiente (...) mas é uma das lições de humildade que aprendeu com gente realmente celebrável,
como a princesa Grace de Mônaco...
- Prazer, eu sou
Tânia Brandão.
- Eu sei, eu
acompanho você pelas revistas, gosto do seu trabalho. Por que nunca fez algo
fora do Brasil?
A surpresa da
carioca é imensa! Ela quase pula de felicidade ao redor da piscina, mas usa de
seus talentos cênicos para fingir estar apenas lisonjeada. Patrícia observa o
episódio do outro lado da piscina (...) Rebeca se aproxima da amiga, ela responde
preventivamente quem é e do que suspeita...
- Só isso mesmo?
- Olhe em volta.
Mais da metade dos hóspedes é de artistas que se hospedaram quando souberam que
viríamos para cá.
- Saco! Vou ficar
de olho também.
Renata se sai
bem. Tem certeza de que algum photógrapho escondido registrou as cenas (...) No
decorrer da manhã todos são abordados, Ronald precisa conter os ímpetos da
esposa. Mas dá dez horas e Nancy desce, Patrícia diz “Mommy!”, todos olham para
a mesma direção e ela aponta para o relógio. Sabem o que significa e entram
todos (...) Ela
observou tudo da janela, memorizou tudo e ficou atenta aos movimentos mais
sutis. O jogo de blusa branca e saia média marrom ajuda a construir a imagem de
professora severa.
À tarde eles vão
para uma coletiva televisionada, devidamente alimentados e descansados. O prazo
desta vez é maior, mas Matthew não tem menos trabalho. As formas físicas
invejáveis dos seis são o tema das primeiras perguntas (...) Falam da alimentação e da rotina de exercícios que têm, mas
não falam sobre o caratê que Patrícia, Rebeca e Richard praticam antes do sol
nascer (...) As perguntas sobre as crianças,
Nancy e Lucille passam a rechear a coletiva, efeito colateral de uma turnê
familiar (...) uma
colunista cultural pergunta se não têm planos para cantar em outros idiomas...
- Já que dominam
tão bem vários e uma de vocês é brasileira!
Eles se olham,
começam a sorrir e fazem uma farra. Gostaram da idéia (...) Pelo menos três idiomas além
do inglês estarão em um álbum a ser estudado, mas tratam de comunicar
imediatamente Josephine, enquanto Matthew conversa com a moça que fez a feliz e
inteligente sugestão.
&
No começo era uma
visita pretendida por Renata, ninguém precisaria acompanhá-la, além da pequena
Marcia (...) Vão todos, a comitiva inteira à Federação Espírita. Nenhum
médium extraordinário está presente, além da própria Renata, que não se
considera assim. São recebidos pelos dirigentes e seguidos pela imprensa.
Alguém ouve o disco espírita que eles gravaram (...) pequenas
intervenções de Richard e sua memória prodigiosa acabam revelando que um ateu é
um dos mais vastos e profundos conhecedores da doutrina no mundo...
- Então faz
sentido essa história de “guru” da banda?
- Mais ou menos.
Eles têm humildade para ouvir e meditar sobre a experiência que lhes repasso.
Chamar um ateu de guru é como alisar uma onça e chamá-la de bichano.
- Que bom saber
que essa onça está do nosso lado! O que nos diz da philosophia?
- Esta eu
adoptei, gostei das partes sobre disciplina, educação dos filhos e honestidade.
Ah, claro, me identifiquei com fazer o bem sem esperar por recompensas, sei que
não tem nenhuma mesmo!
O tom foi
descontraído (...) embora tenha sido
sincero. Dão uma sopa para a equipe da federação, depois cada um perambula com
um cicerone pelas dependências do prédio (...) Patrícia vai com a sua inteira para a
directoria, onde fala reservadamente sobre Josephine com a presidência. As
meninas distraem o sobrinho enquanto os adultos conversam sobre a diva, que no
fundo é uma mulher frustrada pela maternidade que não pôde ter. Audrey cutuca a
irmã ao ver seu nome em um dos panfletos, ela lê “Melinda Gonzáles” em voz alta
e Patrícia interrompe o que dizia...
- Como, Audrey?
- É o que está
escrito aqui. Tome...
- É aquela menina
que você ajudou, não é? Na verdade ela é um anjo.
Permanece calada,
apenas lê a curta mensagem que sua irmã postiça mandou. Começa a lacrimejar
quando se lembra dos abraços que a menina retribuía com dificuldades, por causa
das dores. Ela falava em andar de bicicleta e nadar no clube (...) mas falava com alegria, não com
frustração. A moça se desmancha rapidamente e quando percebe já está chorando (...) Nancy pega o pequeno panfleto e
lê com Richard: “Meus queridos, a dedicação à família é um expediente sagrado
na seara da regeneração que vos foi confiada, de si mesmos e dos seus. Urge
entretanto, que reavaliemos o que podemos considerar uma família. Lembrem-se do
que disse o Mestre Jesus, na angústia física da crucificação, ao ver sua santa
mãe Maria se debulhar em lágrimas pela dolorosa e lenta perda de seu filho
amado. Não limiteis aos laços consangüíneos o amor que dedicais ao próximo. Eu,
ainda encarnada para a expiação de faltas graves, conheci o amor incondicional
que me foi dedicado por um espírito nobre que não tinha qualquer obrigação cármica
para comigo. Uma pessoa rica e poderosa que se curvou ao auxílio de uma família
humilde e em dificuldades, atenuando a dor e enchendo corações estranhos com o
bálsamo da prática que ora vos aconselho. Sigam, bem amados, o exemplo dessa
pessoa. Coloquem todos os seus semelhantes na esphera do que consideram sua
família, porque todos o são. Façais isso por eles, pela humanidade, por si
mesmos, porque o que fizeres aos indefesos é ao Mestre que estareis fazendo.
Não vos custa uma palavra amiga, não vos custa uma hora ouvindo os lamentos de
quem não tem a quem desabafar, não vos custa se colocardes na pele e no ponto
de vista de vossos irmãos desafortunados. Oferecei vosso amparo no que vos for
possível e buscai ajuda para o que exceder vossas forças, vos surpreendereis
com a bondade da providência divina ao perceberdes que um amparo inesperado
virá em vosso socorro. Eu não esperava, amados, mas o amparo veio, então posso
vos repassar a experiência maravilhosa que me foi concedida. Lembrai sempre que
o vosso irmão é todo aquele que estiver ao vosso alcance”.
Patrícia chora
copiosamente abraçada às irmãs, até Renata aparecer com os outros e compreender
os insights que recebeu durante a visita. Arthur lhe mostra o panfleto e ela
sorri...
- Ela não era o
único anjo naquele hospital, minha amiga.
- Patty, isso
aqui é você – exclama Rebeca!
A líder é cercada
pelos seus seguidores até que cessem os prantos. Melinda aproveita para matar
saudades daquele abraço.
&
Alguém da
imprensa carioca tem acesso a uma cópia da mensagem de Melinda, é muito fácil
ligar os pontos (...) a notícia de que um anjo recomendou a bondade e sabedoria de Patrícia
Petty corre pela imprensa brasileira, chegando rapidamente aos fã-clubes do
mundo inteiro e saindo do controle de seus autores (...) Josephine toma conhecimento e lhe providenciam um exemplar da
mensagem...
- Ah, as coisas
que essa menina voluntariosa arranja, Bart! Imagine como ela deve ser vista nas
colônias!
- Ela deve ter um
fã-clube por lá. Não duvido que faça shows entre eles, durante o sono.
- Eu temia que
essa personalidade autoritária atrapalhasse o progresso da banda, mas ela soube
dosar tudo. Veja só isso, pedidos de colaboração, parcerias, negócios e
aparições. Eles construíram uma imagem excelente, nem precisariam mais se
esforçar tanto!
Mas se esforçam (...) Voltam ao hotel para um
descanso, têm um compromisso importante logo mais à noite e precisam estar
descansados, haverá políticos no meio. Amanhã têm o show e voam na mesma noite
para Brasília (...) Assim que chegam ao hotel,
Nancy os recebe com seus pimpolhos, que rendem um festival de abraços e
carícias. Os artistas que se hospedaram para aproveitar respingos de fama e
prestígio até se comovem com sinceridade. Manobra, aliás, que tem dado bons
resultados, todos já deram entrevistas para falar de suas impressões e dar
notícias sobre os astros.
Vão tomar um bom
banho e depois descem para almoçar. Rita e Lucille têm sido insistentemente
comparadas às mulatas das escolas de samba. O tom é muito elogioso, mas elas se
incomodam pelo teor sexual da comparação e dos comentários (...) principalmente a fidalga, que quer
a todo custo evitar ser reconhecida pela plástica.
0 comentários:
Postar um comentário