A ascensão de Robert. A estação 51 traz a amenidade perigosa de se negligenciar o foro íntimo. Façam agora as pazes consigo mesmos e embarquem, o trem não vai se atrasar.
A coletiva tem o maior contingente de
jornalistas e imitações que eles já enfrentaram. Estão todos querendo saber o
que aconteceu dentro do Palácio de Monte Carlo. Enquanto se ajeitam, disparam a
rir de uma tira de jornal, que mostra Patrícia chegando em um Fiat 500, saindo
pelo teto solar e depois o carregando como uma bolsa a tiracolo (...) vão os dezoito para a coletiva, os seis fazem questão; são mais
alvos para o tiroteio. E mal entram a saraivada de perguntas começa, Matthew
precisa ser grosso para organizar todo o pandemônio, avisando que a coletiva
durará duas horas, tempo suficiente para todo mundo fazer a sua pergunta (...) logo os novatos são inquiridos sobre o trabalho com
a banda. Patrícia responde sobre se conhecem algum cantor italiano, e ela
destaca alguns em quem apostaria suas fichas...
- Rita Pavone, Jimmy Fontana, Anna Identici, Peppino
di Capri e Gigliolla Cinquetti; Meu Deus, que voz é aquela! Eu ouviria ela o
dia inteiro, se pudesse!
Quase como um professor linha dura, Matthew
evita que um atropele as perguntas do outro (...) Alguém decide cutucar a solidão de
Robert...
- Solteiro, sim, estou. Sozinho? Não, não
mesmo! Sou um Dead Train.
Voltam ao hotel, para fazer a lição de casa.
Matthew sempre diz isso e quase ninguém acredita, terão que ver a edição de fim
de ano para talvez acreditarem.
O dia seguinte é de ensaios (...) Eles só admitem a presença do fã clube local. O que aprenderam
em Mônaco é posto em prática, o estádio está repleto de pequenas árvores
ornamentais (...) Por
fim, vão descansar, que hoje têm serviço pesado e amanhã terão Paris.
&
Encontram Zigfrida no vôo para Paris (...) providência tomada após o incidente
camuflado (...) Ela sabe que sua paciente preferida está com
tudo quicando dentro de sua cabecinha juvenil. A sueca avisa que aquelas turnês
que não fizeram na África do Sul e algumas ditaduras, os colegas de colégio
deles estão fazendo...
- Eu acho maravilhoso! Quem sabe eles gostam,
começam a babar e seus regimes idiotas caem mais depressa!
O vôo noturno não é longo, mas o suficiente
para ela perceber que não houve prejuízo algum (...) Ela reitera que confia piamente no pai, nas pessoas
esquisitas que pipocam a todo momento, é outra conversa. Deborah começa a rir,
acha muito engraçado alguém de Sunshadow falar em gente esquisita.
Em Paris, como em todas as cidades que
visitarem (...) Terão passeios e sessões photográphicas (...) também para melhorar a imagem de seu país, que o americano
médio não sabe que anda bem ruinzinha. Ronald avisa de cara para não se
escandalizarem com a intimidade dos cumprimentos, especialmente se ficarem
amigos de alguém.
Como toda cidade diuturna, Paris os
recepciona com uma comitiva de fãs que esticam a noite como hábito arraigado.
Vão ao hotel e são surpreendidos com uma recepção especial para Ronald,
herdeiro do condado. Os outros já dão sinais de que isso será motivo para
piadas (...) assim que se instalam, fazendo reverências caricatas...
- Eu não imaginava que eles ainda se
lembrassem de nós!
- Provavelmente não mesmo, Ron. O mais certo
é que a nossa fama ressuscitou a sua.
- Ainda assim, Bobby, meu pai vai ficar feliz
em saber disso.
E fica mesmo. David quase chora pela
perspectiva de sua família voltar a ter o prestígio de outrora em sua terra
natal. Decide finalmente pendurar o brasão acima da lareira, quase três séculos
depois.
Estão no dia seguinte, bem cedo, estudando o
local do show (...) chegam flores para
as moças, com rosas vermelhas especialmente para Renata (...) Ela mima o namorado até ele desfazer a carranca,
esvair o repertório de reclamações e retoma o foco no trabalho. Os comentários
sobre seus glúteos e sua beleza rara (...) ela não mostrou ao ciumento. Até os novatos receberam flores
e bilhetinhos, só Robert parece ter sido esquecido pelos galanteadores da
cidade, apesar de os fãs reiterarem seu carinho a todo momento. A banda notou
isso.
Chega a hora da coletiva. O de menos é não
terem que se deslocar (...) os jornalistas ficam na
plateia e eles no palco. Hoje Ronald ganha destaque, as perguntas vão desde
como está a família a se pretende manter uma residência nos arredores de Paris (...) se realmente pretende se casar com Rebeca
ou é só um impulso juvenil, arrancando rugas no cenho da garota. Mas a
curiosidade acerca do sucesso tão repentino quanto estrondoso da banda, os faz
focar novamente Patrícia...
- Na realidade a banda não surgiu da noite
pro dia, foram uns cinco anos de gestação, dois dos quais em regime de
internato. Nos submetemos a uma rotina severa de estudos e prática, além de
aceitar as broncas de um crítico de música que se mostrou mais ácido do que eu
presumia.
- Quem é esse crítico tão rigoroso?
- Meu tio Fester, é ele o responsável pelo
padrão de qualidade das nossas canções.
- E a que mais a mademoiselle atribui esse
sucesso?
- Primeiro aos fãs, são eles que decidem quem
sobe e quem desce. De nossa parte eu posso resumir em quatro palavras:
Trabalho, persistência, humildade e disciplina.
- Disciplina incluiria a dieta rígida de que
os hotéis tanto falam?
- Nós não estamos viajando de férias, estamos
trabalhando. Precisamos estar em nossa melhor forma o tempo todo. Claro (...) ninguém vai adoecer por causa de um chocolate ou uma taça
de vinho, mas nosso trabalho vai muito além das apresentações públicas,
precisamos estar lúcidos e saudáveis o tempo todo. Nas folgas a gente come
besteiras, acorda tarde e anda de biquíni pela casa, mas em uma turnê a
disciplina é imperiosa.
- Oh la la! Vocês têm photos disso?
Eles respondem negativamente com as mãos, não
segurando os risos. Mas é tarde, todos lá, imprensa, operários e fãs, ficam
imaginando os seis em trajes sumários (...) com a
imaginação alçando vôos mais altos e sensualizando as poses. Claro que os
cartunistas compram a idéia na hora.
Após uma revisão nas apostilas, vão ao
passeio agendado. Pegaram um ônibus acidentado e o deixaram aberto no andar
superior, só com a estrutura dos para-brisas (...) e uma
longa capota de lona com alguns arcos no bagageiro, para o caso de chover (...) Mas o céu
hoje está bonito, com algumas nuvens refletindo de volta a luz solar e vento
moderado. Cercados de Citröen 2CV por todos os lados, eles photographam e se
deixam photographar, faz parte da turnê. A grandiosidade e o rebuscamento marcam
a paisagem. Renata faz questão de permanecer abraçada a Matthew, para dar o
devido recado a quem cabe, Rebeca e Ronald os seguem, Patrícia e Enzo acabam
suspirando por seus pares, enquanto Robert se sente isolado. Patrick cutuca
Richard...
- Eu vi. Sabe que às vezes me dá vontade de
fazer umas correções nas teorias de Darwin? Tem gente que não é inteligente o
suficiente para ter um ancestral em comum com os chimpanzés. Se a Patty tivesse
escolhido o Bobby, eu teria ficado muito feliz!
- Eu bem que queria ajudar, mas não sou
mulher!
- Eu agradeço pela intenção. Coisas assim me
fazem acreditar com mais força que o mundo não gosta de pessoas boas, ao menos
não por perto.
Param perto da Torre Eiffel, onde alguém
colocou um disco de Charles Aznavour. Robert novamente chora cantando, é de
longe o membro mais romântico da banda. Acompanha o disco e canta Que c’est
triste Venise (...) só vê a torre, de mãos nos bolsos das calças jeans, o vento roçando
seus cabelos cortados bem rentes (...) Ele só acorda e
percebe quando se sente espremido, e vê a irmã lhe abraçando com força. Para a
surpresa geral, as balzaquianas começam a assediar o rapazote. Ele tem se
mostrado um perfeito cavalheiro desde que a banda estreou, seu romantismo
crescente acabou por angariar a simpatia de mulheres bem mais velhas, que com o
tempo passaram a ser seu público particular (...) Ele trata
todas elas com carinho e polidez, quando se dá conta está com marcas de batom
do pescoço à testa. Rebeca faz a festa, os paparazzi também. O facto de
conhecer de cor as canções de Aznavour, contou pontos a seu favor.
Ele gostou do assédio, mas um bando de fãs
beijoqueiras não dá conta do que ele perdeu. Voltam ao hotel para suas tarefas
escolares. A imagem de pelo menos dez francesas atacando Robert chega a
Sunshadow (...) pelo menos duas lhe beijaram a boca, (...) Josephine assiste à cena boquiaberta,
pensava que isso só pudesse acontecer em filmes de comédia. Liga para Zigfrida,
quer esclarecer os pormenores do episódio...
- Ele cantou e foi atacado por aquelas
mulheres? Só isso?
- Acha pouco? Ele tratou cada uma como se
fosse a única mulher do mundo, eu estava lá e vi!
- Ele pelo menos está melhor?
- Muito melhor! Melhor e em ponto de bala se
é que me entende, mandei ele se fechar no banheiro e aliviar (...) Maldita hora em que me indexei a essa ética! Ok, ossos do ofício. Ele
está mais alegre, por conseqüência a Rebeca também e o incidente rendeu uma
baita publicidade.
- Imagino! Conheço dezenas de canastrões que
pagam fãs para simularem ataques que não dão metade do que ele conseguiu. Tenha
uma conversa reservada com ele, assim que puder, e evitem deixa-lo sozinho com
uma mulher estranha, ainda há muito chão pela frente nesta turnê.
Os telejornais franceses destacam o fenômeno
do “amorzinho das balzaquianas”. Algumas das desinibidas concedem depoimentos,
dos quais saem pérolas como “Másculo e gostoso”, “Não é um garoto, é um homem
desabrochando”, “Boca deliciosa”, “Loucamente cheiroso”, entre outras que não
cabem em qualquer horário (...) as novatas olham
com sorrisos largos, pela inexistência de impedimentos. Zigfrida fica espantada
com a eficácia da propaganda, com o perdão do trocadilho, boca a boca.
A noite seguinte é de histeria, o sucesso que
Enzo e Ronald fazem juntos com moças até um pouco mais velhas, Robert faz
sozinho com mulheres maduras. Ele se torna um símbolo sexual para elas, se
tornando também odiado por uma parcela grande dos homens de meia idade.
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