Eles vão conquistar o mundo. A estação 47 traz o avesso como o lado certo de muitas vidas. Não temam as mudanças e embarquem, o trem mudará de estação.
Voam para Los Angeles, com todos os músicos
de apoio, que então passam a integrar a turnê. Eles querem ver do outro lado a
recepção eufórica dos fãs (...) vêem e se assustam, têm a impressão de que um tsunami humano vai invadir a área
de desembarque e carregar o avião (...) alguns panfletos (...) fazem campanha contra a banda, avisando que são satanistas, que dão maus
exemplos para os jovens...
- “Maus exemplo para os jovens”?
- Esses garotos estudam durante as turnês e
eles acusam de dar maus exemplos??
Os músicos se indignam, mas Rebeca logo avisa
para relevarem, que seus detratores nunca primaram pela coerência. Sabem mais
sobre passagens dimensionais e teoria da relatividade, do que sobre eles.
Desta vez o ônibus é maior, o caminhão
também. Vão todos para o Jose’s Hotel, onde artistas amigos querem rever o
sexteto. Ah, sim, os músicos de apoio não sabem que vão para lá também, os seis
decidiram fazer uma surpresa. Eles ficam tão animados (...) que nem notam a plaquinha “Beverly
Hills” se aproximando e depois ficando para trás. Só se dão conta de que algo
está estranho quando vêem Renata acenando para Audrey Hepburn e combinando uma
visita para mais tarde. Mais adiante um dos Beach Boys lhes dá as boas vindas.
Se vêem cercados de mansões e carros caríssimos...
- Mr. Gardner, para onde estamos indo?
- Jose’s Hotel, Patrick. Vocês vão gostar de
lá.
- Turma, a gente está indo para... o...
Ele se volta para Richard, com os olhos esbugalhados,
arrancando gargalhadas, quando chegam aos portões do palacete, com uma turba de
repórteres e paparazzi disparando para tudo o que se mexer naquele ônibus. De
vestido branco, longo, esvoaçante, com mangas levemente bufantes e um fino laço
na gola, lá está ela com seus longos cabelos ao vento. A diva de milhões, a
musa de gerações, sua majestade artística...
- Jose De Lane!
Ele arranca mais uma carga de risadas (...) Ele foi o mais
engraçado, mas todos os outros onze compartilham do espanto, estão tímidos, com
medo de serem calcinados pela luz estrelar da musa. Matthew e os repórteres (...) vão publicar isso. A porta do ônibus se abre e Patrícia corre
para o abraço, causando mais espanto aos músicos...
- Mon Dieu, como você está linda! Nem parece
que passou por tantas tristezas! Apresente-me seus amigos!
- Eles não sabiam que viriam pra cá, estão
tremendo como vara verde!
- Então é porque são verdes no estrelato. Bom
jour, mes amis. Bienvenue a mon Maison.
Assim que ela se aproxima, uma vocalista
desmaia. É levada para dentro nos braços por Richard, com a imprensa se
deliciando com cada passo, acordando uns quinze minutos depois, sob os cuidados
de enfermagem da diva...
- Mademoiselle Rita? Você está bem?
A negra olha para os lados, pergunta pela
mãe, depois pergunta se está morta (...) Diz que
teve um sonho lindo, onde conhecia...
- Jose De Lane!
- Em carne e osso, como você. Venha, estamos
te esperando para o lanche.
Josephine a pega pela mão esquerda e a leva
ao seu lugar à mesa (...) E àquela
mesa enorme a cantora ainda vê meia dúzia de representantes da elite mundial do
cinema. Ela olha para os outros, eles também estão meio abobalhados, (...) a turma de Sunshadow está à
vontade, até namorando à mesa, com Gregory colocando pudim de queijo na boca da
amada...
- Aceita um biscoito de mel, fraulein? Eu
mesma fiz.
- Não recuse a oferta da Hedy, Rita, pegue um
biscoito.
Ela pega, agradece e come ainda incrédula.
Até a semana passada era uma soprano desempregada, que ganhava a vida cantando
em bares e festas (...) Mal acreditou quando
foi aceita para o teste no show do Dead Train, menos ainda quando, ao fim do
show, Matthew a confirmou na turnê e mandou que arrumasse as malas (...) Agora é servida por nada menos do que uma das maiores actrizes e mais lindas
mulheres da história.
Fora os doze, estão todos muito à vontade à
mesa (...) evitando temas pesados que não sejam
absolutamente necessários ao momento. Ainda hoje Renata é solicitada para falar
do Brasil, embora jamais tenha saído de Goiás, seus parentes são viajantes
vorazes e lhe contavam muitas histórias de rincões esquecidos...
- Infelizmente há lugares no Brasil que ainda
hoje estão na idade média, com senhores feudais decidindo a vida e a morte em
seus territórios. E as convulsões dos últimos meses não vão ajudar a melhorar o
quadro. Em contraste, temos Rio de Janeiro e São Paulo que vocês já conhecem
bem.
- E a sua cidade?
- Uma capital pequena, Audrey. Foi fundada em
1933 e ainda hoje carece de muita infraestrutura.
- Jose tem razão em se preocupar com você,
mas não dá para negar que seu “problema” é encantador! Tão jovem e tão lúcida!
- A adversidade forja o caráter, você sabe
disso melhor do que eu. Aliás, nossa novata Rita sabe bem disso, eu conheço a
sua história, nós nos inteiramos a respeito de vocês.
Horror! Horror! Todos olham para ela,
esperando que diga alguma coisa. Ela olha para os outros novatos e eles
devolvem o olhar, ela se volta para Renata e solta o que lhe vem à cabeça,
esperançosa de que não lhe custe a mesma...
- Posso ficar neste emprego pra sempre?
Trabalho até de graça.
Novamente um ataque de risos coletivo. Os
doze músicos de Detroit estão se mostrando humoristas natos. Há dois à mesa (...) avisando que vão aproveitar a piada em um
filme.
&
Enquanto os novatos se instalam, embasbacados
com o requinte de suas suítes, os veteranos permanecem lá em baixo, revendo o
planejamento e actualizando os dados. Zigfrida observa seus pacientes,
especialmente Patrícia (...) Olha para Gregory e se pergunta se ele sabe realmente o alcance do que fez para
ela. Decide cutucar...
- Rapaz, você me poupou um trabalho hercúleo!
- Eu? Como?
- A Patrícia que está à minha frente não tem
um por cento do peso da que deixei em Dallas! Você está fazendo um bem enorme a
ela!
Ele sorri. Isso lhe serve de blindagem contra
as sabotagens dos despeitados. A sueca pormenoriza o que diz (...) da garota. Ela enche o namorado de afagos,
durante a explanação da sueca...
- Mas você sabe que há outro lado, não sabe? Ter
sido responsável por essa melhora gigantesca, fará os outros te cobrarem a
manutenção.
- Ah, isso! Já me cobraram! Já apareceram fãs
de joelhos, me pedindo que não estragasse o bom serviço que fiz.
- Você não me contou isso! Te constrangeram?
- Não. Eu disse que entrei nessa pra casar e
que só dependeria de você.
- Greg! Eu aceito!
A sala de reuniões vira uma festa (...) Só embaça um pouco o brilho da
ocasião, as caras de Rebeca e Ronald. Pela lei, eles jamais poderão se casar.
Josephine os fita longamente e os abraça por trás...
- As leis da física são as únicas imutáveis.
Essa lei estúpida vai cair, só esperem.
Diz com a certeza de quem sabe que um dos
principais pilares já não existe (...) Está pessoalmente empenhada para que a obra da Cascavel Branca não sobreviva
muito mais do que ela. O argumento de que a família tradicional americana será
destruída pela miscigenação, está perdendo força rapidamente. Os novatos descem
pegando a conversa pelo fim (...) Também participarão da entrevista de hoje à noite, no Boa Noite Mundo. Tobby
está ansioso para ver de perto a evolução da banda.
Novamente os novatos tremem feito varas
verdes. No auditório, o fã clube domina. Se isso é um incentivo, é também uma
pressão (...) Meia hora e a histeria dos fãs invade o estúdio, e muitas famílias em Detroit
ligam para parentes, mal acreditando no que vêem. Todos riram dos doze (...) Especialmente a família de Rita, que
já se conformara em vê-la pelo resto da vida cantando em bares e festinhas de
guetos. Agora a mãe da moça esfrega nas caras dos descrentes a imagem da filha
ao vivo (...) entrevistada por Tobby McGinnes
como uma estrela do rock.
&
A primeira fase da turnê não traz problemas,
não além dos decorrentes da própria natureza do ofício (...) Voltam para
Sunshadow com uma pequena multidão a tiracolo, inclusive Gregory dando
satisfações a Nancy, já tendo sido providenciada acomodação para todos os
músicos, na propriedade de Mr. Fischer. Ele, aliás, é a surpresa de que Richard
falou à irmã. Eles conversam no escritório, em poltronas, enquanto Richard
apresenta os quartos aos novatos...
- Eu te conheço desde que você era um
toquinho de gente, não imagina a alegria que senti, quando Richard te trouxe de
volta.
- E o senhor não imagina a minha!
- Decerto! Eu quero te propor uma coisa,
Deborah. Você soube da debandada que houve aqui, quando minha esposa faleceu.
Então sabe que cada um pegou um naco do patrimônio (...) nunca mais deram notícias! Por isso eu quero evitar que
eles coloquem as mãos no que me restou, e ponham a perder todo o trabalho que
eu tive para montar uma atração apresentável para a cidade, com a ajuda de seu
irmão.
- Está me propondo casamento, Mr. Fischer?
- Estou. Você sabe que eu não (...) quero isso para ser visto com uma mulher
que poderia ser minha filha. O que eu quero é uma companheira em quem eu possa
confiar e que impeça os ingratos de destruírem meu trabalho. Amor, a Naomi já
dizia, basta nós deixarmos que ele nasça, e ele nascerá.
- Ritchie, eu sei que você está aí atrás.
Apresente-se!
- Pô! Todos esses anos longe e você não
esquece minhas manias??
- Desde quando você tem esse emprego de
cupido?
- Desde agora.
- Foi ele quem te pediu para intermediar?
- Sim, foi ele. Eu tinha outros caras em
mente, mas ele me chamou para uma conversa e eu prometi interceder. Vai, casa
com ele, vocês dois não têm nada a perder, além das noites solitárias.
- O senhor sabe que eu fui prostituta?
- Sim, eu sei. Mais da metade de nós é
descendente de ladrões e prostitutas, foi esse tipo de gente que deu início a
Sunshadow!
- Ritchie, traz as minhas coisas? Eu já vou
ficando aqui e pegando intimidade com o Gerald.
- Ahahahahahahahaha! Vou trazer suas coisas,
também.
Em meia hora a propriedade está cheia de
gente (...) vão directo ao cartório e lá
assinam os papéis. A festa se dá de improviso, na praça do trem morto, com cada
um levando um quitute para a comemoração. Gerald Fischer nem é tão velho (...) o matrimônio durará uns quinze
ou vinte anos. A animação é by Dead Train. Tudo, claro, registrado por Matthew,
pela revista, pela imprensa e pelos paparazzi, que também entram na boca livre.
À noite, a sós com o marido em sua suíte,
Deborah faz sexo de livre e espontânea vontade pela primeira vez na vida (...) Na
manhã seguinte, Gerald estranha a facilidade com que urina, a agilidade súbita
e a pele menos enrugada. Olha para a cama e vê sua jovem esposa ainda
despertando (...) terá de
volta uma experiência da juventude, suspirar pela amada distante (...) Está apaixonado,
irremediavelmente apaixonado. Tem pena de quem não consegue sentir isso.
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