A primeira convenção. A estação 63 tem surpresas para o público, a necessidade de sigilo fez algo mais grandioso do que o pretendido. Se apresentem e embarquem, haverá shows no trem.
Os três lugares preferidos de Patrícia, em
Sunshadow, são sua casa, a praça central e sua fundação para as crianças (...) Ela mostra a Josephine o trabalho que têm feito, incluindo crianças de outras
cidades, já contando com algumas que infelizmente se tornaram residentes, por
abandono. Estão tentando encontrar famílias para elas, mas precisam ter certeza
de que as originais não as querem de volta, tarefa inglória porque elas
simplesmente sumiram do mapa. Não esperavam enfrentar esses dramas (...) mas estão providenciando as
mudanças necessárias para que a fundação, que ocupa o quarteirão inteiro na
cidade nova, possa arcar a contento com essa responsabilidade...
- Vou trazer Audrey para ver isso. Em sigilo.
- Traga, nos inspiramos nela também. Ainda
tem um quarto vago, vocês podem chegar de noite e partir na manhã seguinte bem
cedo.
Caminham e conversam pelas instalações, cada
uma com uma criança serelepe nos braços. As crianças brincam até cansarem e se
renderem ao sono, nos braços das divas. Patrícia mostra a escolinha (...) onde usam os mesmos métodos que sua avó
usava e ela mesma começou a usar. Lá estão suas irmãs e a de Renata, que ajuda
na aula de música. Fala dos planos de divulgação, para quando se livrarem do
maníaco, porque antes teme pela segurança das crianças. Ouvem um choro e correm
para uma sala próxima, vêem Rebeca cuidando de uma menina que foi abandonada e
sente falta dos pais, ela não entende o motivo de eles não voltarem (...) Ela consegue
acalmar a pequena sem ajuda.
É a maior construção da cidade, toda feita
com pré-moldados, com as robustas paredes externas servindo também de muro. No
térreo todas as janelas são internas, dando para uma pequena vila de sobrados em
um pátio amplo, com jardins e toda uma estrutura de lazer e desporto (...) Chegam à cozinha, onde estão preparando o
almoço do dia, uma das quatro refeições servidas diariamente. São duas portas
de acesso com sonoras sinetas, para evitar que uma criança entre sem ser
percebida. Em uma prateleira há uma infinidade de forminhas (...) Toda semana há pelo menos
um aniversariante.
O dormitório, que está sendo ampliado, tem
pequenos quartos com no máximo quatro camas cada um. A decoração foi pensada
para as crianças terem (...) a
sensação de que são bem quistas. Observam algumas crianças de colo em seu sono
pueril, Patrícia quer que as suas também freqüentem a fundação, como as irmãs,
nisso o assunto do casamento volta à tona, ela inclina o rosto com um sorriso
escancarado. Quer serenidade. Sim, quer festa, muita festa, quer que os
convidados jamais se esqueçam de seu casamento, mas a vida conjugal
propriamente dita, quer que seja calma e constante...
- Como um casal de idosos?
- Como um casal de idosos, talvez sim. Mas a
rudeza da vida aqui fora já imprime um ritmo muito rápido, com relações muito
superficiais, eu não quero isso dentro de casa. Quero entrar pela porta da sala
e deixar o mundo do lado de fora.
Há tietagem durante a visita. Josephine nem
sempre se revela, quando vai a Sunshadow, mas aparece mais lá do que em Los
Angeles.
&
Os jornais e revistas já alardeiam a primeira
convenção mundial de fãs do Dead Train (...) com fãs europeus já reservando vagas nos poucos hotéis da cidade e
em alguns da região. Os patrocinadores tradicionais já se prontificaram, sem
saber que estarão patrocinando o casamento de Patrícia; algo que ela não
aceitaria se pudesse revelar que será seu casamento; nem anéis de noivado o
casal usa, para não levantar suspeitas em quem não deve saber.
Na prefeitura, Daniel Stewart confere todos
os dias a contabilidade da cidade, sorridente, já nem lembrando o tempo em que
chegou a precisar abrir mão do salário, porque a arrecadação do mês não dava
nem para isso. Com o museu da cidade ampliado, a cidade nova dando
infraestrutura e agora essa convenção (...) chegou a
pensar em fazer um metrô entre Sunshadow e Summerfields. Sunshadow tem a vantagem
extra de ser negligenciada pelos tufões tanto quanto era pelo poder público. A
herdeira de Naomi Petty Green lhe serve de conselheira, às vezes puxando-o de
volta à terra.
Ela, aliás, intercepta mais uma
correspondência que iria para Robert. Ele já tinha dito que não queria mais
saber daquela moça (...) Mikomi nem lhe apresenta o
envelope, entrega-o diretamente para ela...
- A caixa postal é a mesma, a caligraphia
também, o tipo de vocabulário que ela jamais utilizaria... Se essa mulher fosse
viver de ser falsária, passaria fome.
- Também mostra que não o conhece nem um
pouco. Bobby não gosta de refrigerantes!
- Nem de relações sem compromisso, ele é um
romântico incorrigível, o conheço desde criança. Vocês vão se casar mesmo?
- Pretendemos. Imagino quantas fãs sonham com
isso!
- Um monte, a maioria delas bem mais velha do
que você. Obrigada por cuidar dele pra gente. Quero ser a sua madrinha de
casamento, se não tiver outra candidata.
- Pensei na Rebby, mas ela diz que prefere
ficar na fileira dos familiares. Disse que a tradição dos casamentos da família
de Ron é muito cheia de detalhes, não teria paciência para mais de uma cerimônia
rebuscada.
- Cara, é mesmo! A família do Ron tem uma
tradição de quase mil anos e a gente nunca se deu conta disso! Aposto que daria
um filme épico!
Ele sabe disso. Já aventou a possibilidade e
contou ao pai, mas a condessa pediu aos dois empolgados que tivessem paciência
e prudência (...) Rebeca já
concordou, suspirando, com os trâmites familiares, inclusive o estudo sério e
profundo de heráldica, mas avisou que terá que treinar muito caratê e luta com
armas brancas, para não estourar.
Eles falam disso em uma reunião, na casa de
Patrícia, onde a aspirante a condessa mostra três volumes de seiscentas páginas
cada, cujo conteúdo terá que dominar bem até o dia do casamento. A anfitriã
olha para o rapaz, com espanto...
- Você conhece tudo o que tem aqui?
- Tudo. Eu e Lucille conhecemos cada página
destes livros, foi uma das torturas de nossas infâncias.
- Obrigada por avisar sobre o que me
espera... Pelo menos tem uma receita deliciosa ou mais, em cada capítulo!
- Cada uma está ligada a um evento importante
da família, meu amor.
- Jura? Então não vai ser tão difícil, eu
adoro aulas comestíveis!
- A gente te ajuda, comendo o que você
preparar – arrisca Patrícia.
Ela aceita. Não deveriam se surpreender, mas
se surpreendem quando ela pega uma receita medieval e vai à cozinha da
anfitriã (...) em duas horas prepara alguns
pães de leite sem fermentação, com cevada bruta e frutas da estação. Ronald diz
que foi essa receita que garantiu a sobrevivência da maior parte da família,
durante a peste negra, por (...) não levar
uma gota sequer de água. É um pouco mais difícil de mastigar do que os pães
refinados, mas ficou muito saboroso (...) Josephine logo entra guiada pelo olfato, com Richard, Nancy, as gêmeas e dois
motoqueiros, todos salivando com aquele aroma suave...
- Mon Dieu, qu’est que c’est! Quem fez essas
maravilhas?
- Moi – se apresenta Rebeca. Je suis une
vraie comtesse! Já saquei como eu vou tirar isso de letra e aprender tudo
rapidinho! Ron, a gente vai abrir uma franquia de quitutes da família!
- “A gente” quem, cara-pálida? Posso sugerir
que a banda tenha negócios exclusivos para sustentar nossas entidades sociais?
- Valeu, irmã! Ron, a gente vai fazer isso.
Vou aprender esse catatau todo antes do que vocês imaginam, depois vou praticar
e então a gente planeja tudo, Patty.
Não que ele conteste, pelo contrário (...) mas fica assustado com o modo como Rebeca toma as
decisões; até parece sua mãe, que fica imensamente feliz em saber que as
conversas com a pretensa nora têm dado frutos...
- Você o quê?!
- Sabe que eu estou gostando da ideia de ver
ela dando ordens na casa? Alô, Norma? É Diana. Boa noite, como vai? Também,
obrigada. A Rebeca está? Pode chamá-la, por gentileza?
Diana decidiu que vai auxiliar a moçoila, que no
momento está com um bolo de cevada e frutas no forno, uma massa de pão escuro que
vai descansar até amanhã e um suco de pera já pronto para beber.
&
- Ritchie, tem uns cidadãos aí fora, dizendo
que são fãs e vieram pra convenção.
- Provavelmente são, mas vamos ver.
Sai com o guerreiro da estrada e reconhece de
cara, são do fã clube de Detroit, só estranha o bebê que está com eles, ela fez
a besteira de engravidar de um namorado que desapareceu do mapa, quase foi
expulsa de casa, até o pai cair em si e se dar conta de que ninguém transa
sozinho (...) Patrícia está (...) voltando de um compromisso no escritório
central (...) Agora o único
compromisso é seu matrimônio, quer se dedicar de corpo e alma a ele. Na manhã
seguinte voa para o Brasil, passará a lua de mel na fazenda do avô de Renata,
em Rio Verde. Chegam meia hora depois, sorridentes, animados com a travessura
cinematográfica que estão para fazer. Entram todos com os paletós nos braços,
desabotoando as golas, quando vêem uma figurinha conhecida com um bebê no colo,
e as moças se desmancham de imediato...
- Susie! Que coisinha mais linda!!!
Patrícia faz questão de pegar o pequerrucho
nos braços, e jurar que vai dar um murro no safado que fugiu. No decorrer da
semana mais fãs chegam, os patrocinadores começam a chegar e montar seus
espaços (...) Uma réplica em tamanho
natural da 4-4-4-4 está bem no centro do prédio, é onde se dará o casamento, no
segundo dia da convenção. Todos já sabem e o programa deixa claro que haverá
uma surpresa nesse dia, às 18h, com entrada franca.
Em Rio Verde uma fazenda recebe uma linha de
energia e uma telephônica (...) providências de Richard para que a filha tenha conforto e possa se comunicar
com a mãe todos os dias. Daniel e Leila são só sorrisos, vendo uma geladeira,
lâmpadas eléctricas e um televisor funcionando em casa. A alegria é quase tão
grande quanto a que tiveram, quando Renata trouxe os pais, o namorado e os pais
dele (...) o reencontro dos ex-combatentes foi um aguaceiro só.
Fizeram uma revisão na Rural Willys 1958, para receber a criatura tão
fantástica e extraordinária que a neta lhes descreveu, com seu acanhado marido.
Essa criatura tão fantástica e extraordinária
está tirando photographias com seus fãs, apresentando Gregory e organizando
visitas à fundação para as crianças. Por photos que Renata trouxe, ela já
planeja o que fazer na cidade, ainda totalmente desprovida de infraestrutura (...) perfeita para se isolar do
resto do mundo sem que um paparazzo a encontre. Richard já decidiu para onde
induzirá o pervertido, é um lugar luxuoso e de difícil acesso, com tudo de que
a filha gosta. Manda que espalhem que ela vai viajar no terceiro dia da
convenção, por isso a surpresa será no segundo, só não deixa que revelem a
surpresa.
Mais dois dias e Sunshadow fica cheia de
gente famosa. Embora o cidadão ache que seus garotos merecem, o espanto com
tamanha constelação na cidade é grande, chama a atenção da imprensa e logo os
jornalistas alugam casas na cidade (...) Actores, músicos,
apresentadores, até autoridades nacionais. Começam a desconfiar que essa
surpresa que prometeram vai lhes render um ano inteiro de salário de uma só
vez. Encontrar inusitadamente Elizabeth Montgomery, Sharon Tate e Romy
Schneider juntas, conversando na chocolateria do Brooks, já vale uma página na
revista.
Quando rumores de que Rainier III e Grace de
Mônaco comparecerão ao segundo dia correm a região, é como se o dia do juízo
final tivesse sido anunciado (...) Diplomatas chegam à véspera da abertura
da convenção, e os jornalistas (...) se vêem obrigados a rever o que aprenderam na faculdade e fazer um trabalho
sério. Os seis desatam a rir do alvoroço, nem em suas riquíssimas infâncias
conseguiram aprontar tanto. É uma farra, pois a todo momento alguém chega
perto, pergunta, fica de joelhos, mas os seis dizem que terão que aguardar pelo
dia e pela hora que marcaram. Em privacidade desfazem as caras de mistério e
danam a rir.
No dia e na hora da abertura da convenção a
cidade está coalhada de forasteiros. Daniel Stewart distribui sorrisos (...) os seis puxam a
fita e desfazem o laço da entrada, inaugurando oficialmente a primeira Sunshadow
Dead Train Fan Week, mas sem revelar por agora os reais motivos de terem
iniciado esta tradição (...) o
público entra de modo ordeiro, só apressando o passo já lá dentro, a se admirar
com o porte do evento em uma cidade tão pequena. Artistas prestigiados dividem
espaço com anônimos, diante dos painéis com imagem, histórico, particularidades
e árvore genealógica de cada titular da banda. Agora todos sabem que Rebeca é
atiradora de facas e que Renata é médium.
A atração de abertura, é claro, tem música.
The Dead Train anima a própria convenção e depois cede espaço a músicos amigos,
começando por Bread. Pelo menos seis países, fora os Estados Unidos, são
representados por fãs (...) Os jornalistas têm um campo fértil para seu trabalho,
ficam a saber de coisas que nem sempre excedem as fronteiras de onde acontecem,
como prefeitos destituídos por escândalos sexuais, nobres à beira da falência,
castelos abandonados por seus altos custos de manutenção e muito mais (...) Quando o repórter se dá conta, um dos entrevistados é
Diana Ross. Lá mais adiante está Tonny Bennet com o amigo Sinatra, provando pão
de queijo e pamonha na barraca brasileira que Renata providenciou. Embaixadores
de doze países estão lá, também como amigos dos seis, fazendo a imprensa tocar
de roda sem saber direito o que fazer primeiro; exceto Matthew, que está
nadando de braçada, enquanto namora; o melhor de dois mundos. Ronald explica a
fãs e jornalistas as tradições de sua família, tendo que dividir as atenções
que dava a diplomatas.
O sistema de som avisa sobre a programação do
dia, alertando que em uma hora começa uma palestra sobre música erudita e
comercial. Logo depois a própria banda vai dar conselhos pra quem quiser
ingressar na carreira profissional, em seguida será exibido um documentário
sobre cidades abandonadas. No dia seguinte, antes da surpresa, um documentário
e uma palestra sobre a Audrey Hepburn Children Foundation (...) não é só um evento bobo
para promover a banda, é um evento cultural e social completo, que já começa a
sinalizar a possibilidade de outros. A segurança é garantida pelos Street
Warriors, felizes pelo trabalho inesperado.
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