Agora já foi! A estação 53 tem um segredo para te contar: Sua vida não quer saber dos teus planos, ela tem seus próprios. Conte até dez e embarque, o trem vai partir.
É um país muito pequeno, que acabou
encontrando no pouco tamanho uma de suas chaves para o desenvolvimento (...) embora os
Estados Unidos comprovem que tamanho não é impedimento. O hotel foi escolhido
por Bart, com arquitetura típica e os empregados bem próximos dos hóspedes,
porque se há algo sólido nos estereótipos, é o excesso de respeito para com a
privacidade, que acaba gerando uma cultura de indiferença que está longe das
intenções dessa gente.
Falar em recepção calorosa na Suíça é, no
mínimo, uma piada de mau gosto. A recepção dos fãs é muito animada, com direito
a cantoria e exibição de productos licenciados, como uma marca de câmera
photográphica que produz modelos verde e preto, com exterior emborrachado e
texturizado, e alças em forma de trilhos, tudo para não ser apenas uma
bugiganga qualquer com um adesivo da franquia na carcaça.
A ida para o hotel é muito ordeira, fica
fácil identificar os paparazzi (...) Quando lá chegam, a surpresa é generalizada,
especialmente os seis pares de olhinhos juvenis brilham como quem ganha uma
surpresa de natal. Quase uma tonelada de doces e chocolates da melhor
procedência que foram enviados por fãs. Antes que Rebeca se atire à gula,
Ronald a pega nos braços, só para prevenir. Patrícia (...) manda cada um pegar três tabletes e nada mais, o resto será
enviado para Sunshadow hoje mesmo...
- Sem conversa! Vocês estão malucos?
Conheço-os muito bem, especialmente vocês cinco! Peguem três, cada um, eu
pegarei uma cesta de bombons para consumo coletivo, o resto voa hoje para os Estados
Unidos.
A liderança às vezes tem suas horas chatas.
Sobem aos aposentos, dentro de duas horas terão uma coletiva (...) Mal se arranjam e
Matthew recebe uma ligação da Califórnia...
- Grande Dennis! Quais as novas, garoto de
praia?
- Matt, cara, começou uma polêmica do tamanho
de um tsunami por aqui! Aqueles babaquinhas do “The Special Boys” voltaram da
turnê com uns discursos nada a ver! E o empresário deles está embarcando nessa!
Começaram uma campanha para proibir negros e brancos de trabalharem no mesmo
ambiente, você já sacou a deles, não sacou?
- Saquei... Um trio de cabeças-ocas vai a um
país que se apóia em pseudociência nazista e volta querendo encher a América de
merda estrangeira, como se não tivéssemos as nossas próprias para limpar... O
quê??? O que é isso, eles querem cometer suicídio?
- A gente acabou de voltar do lugar onde eles
marcaram a coletiva, meu irmão. Estão se juntando a um bando de pastores
picaretas pra tentar separar Rebby e Ron.
- Ok, valeu, meu irmão. Vou avisar Patty e Ritchie,
mas não me peça pra contar aos dois ou uma terceira guerra mundial vai
acontecer. Já avisaram pra Jose?
- O Brian está falando com ela agora, no
Jose’s Hotel. Aí, eles vão acabar sabendo de qualquer jeito, porque isso vai
sair nos noticiários. É bom vocês darem um jeito de contar o quanto antes ou...
Eh... Vou desligar agora, o Brian chegou e parece que ele viu a morte de perto.
Valeu, até a volta. Cara, você está bem?
Ele desliga e vai falar com os dois. Patrícia
volta a fazer aquela cara, Richard diz que uma surra parece não ter sido
suficiente e Matthew tenta colocar foco na conversa (...) A moçoila conhece a
amiga e sabe que só há um modo de contar-lhe algo: contando. Vai à suíte onde
sabe que estão e lá os encontra...
- Que bom encontrar vocês dois, o Dennis
mandou um recado. Os três boçais voltaram da turnê e estão fazendo campanha
para tirar Ron e Rita da banda, mas principalmente para separar vocês dois.
Voltaram como militantes racistas daquele país e angariaram a simpatia daquelas
igrejas de bíblia de sovaco. Não faz meia hora que a coletiva deles acabou e os
jornais do país inteiro já estão noticiando.
- Valeu, irmã. Você vai ter a resposta
agorinha, feche a porta e escute lá de fora.
A garota diz já tirando o minivestido e
pegando um preservativo. Ela não faz questão de ser discreta, grita de verdade,
fazendo o restante da banda sair de seus quartos, olhando para Patrícia, tão
rubra que aprece ter acabado de voltar dos alpes. Ela olha freneticamente para
os outros, para a porta, para qualquer lugar (...) O espetáculo termina
e um silêncio súbito toma conta do andar, em alguns minutos a porta se abre e
Rebeca aparece de toalha...
- Conta isso pra eles do jeito que achar
melhor. Mas, cara! ISSO É BOM DEMAIS! Bobby, deixa que eu conto pros nossos
pais. Agora deixem o Ron descansar até a coletiva, eu vou tomar uma ducha.
Fecha a porta e vai tirar o suor. Renata
cutuca a amiga, pedindo uma explicação que vá além de “Alguém na banda não é
mais virgem”. Patrícia explica, de início eles ficam indignados (...) mas pesando os motivos
eles começam a rir e fazem uma festa de improviso, parabenizando a baixinha
assim que ela sai pronta para a coletiva. Todos, exceto Patrícia, que ainda
está mais branca do que o normal, só de pensar no episódio. Zigfrida tem mais
um abacaxi para descascar.
Todos concordam que isso ficará longe dos
ouvidos da imprensa (...) Vão à coletiva e Patrícia se limita a dar o recado, de onde os
repórteres deduzem que sua falta de cor seja pela raiva. Ela afirma que a lei
mais idiota do mundo vai cair, e que todos verão o casamento de Rebeca e Ronald
nas manchetes. Finaliza com um desabafo de quem tem lutos em família...
- Depois de tudo o que nossos pais e avós
passaram por causa da guerra, disseminar a ideia de segregação é a coisa mais
antiamericana que existe! É dar razão aos inimigos, inclusive ao covarde que
matou a família e se matou em seguida, após a derrota vergonhosa. No que tange
a este assunto, é só o que a Dead Train tem a dizer.
- Sabia que você daria conta do recado.
- Mas você apelou!
- Relax, foi só um ataque de fúria que eu
canalizei para outra coisa. Melhor do que sair quebrando o hotel, convenhamos.
- Sim, concordo. A... Não estourou?
- Nenhuma das três. Fica fria.
Terminam de cochichar e dão andamento à
coletiva. Cada vez que alguém pergunta sobre Gregory, o episódio vem à mente e
ela volta a ficar rubra, porque pela primeira vez se imagina transando com ele (...) Finalmente alguém se lembra da
polêmica da dieta da banda, e finalmente ela pode falar sem tremer...
- Quer dizer, essa rigidez toda é realmente
necessária?
- Absolutamente necessária, talvez não seja.
Talvez eu exagere um pouco aqui e ali, mas essa disciplina alimentar nos deixa
em nossa melhor forma o tempo todo.
- Você fez quase uma tonelada de chocolates
viajar para a América por causa disso?
- Sim. Você não conhece esses dezessete como
eu conheço. Aliás, foi gente que nos conhece no cerne que começou com essa
dieta, bem nos nossos primeiros shows: nossas mães. Sim, tudo isso é cuidado de
mamãe para com seus rebentos, e tenho certeza que as mães dos novatos aprovam
isso.
Eles a olham com cara de “Como assim?” e ela
revela que ligou para a mãe de cada um deles, assegurando que cuidaria de todos
como se fossem seus filhos, e ganhou a gratidão de cada uma por isso...
- Cara, sério?
- Foi a sua mãe quem começou e me ligou,
Jack, então achei por bem tranqüilizar todas.
Os suíços começam a rir das caras que eles fazem. A
coletiva continua já com um padrão bem mais suave, mais parecido com um caderno
de cultura do que com um policial.
&
Desta vez Rebeca tem que contrariar sua
natureza (...) Pensaram que Renata e
Matthew seriam os com maiores chances de fazer as coisas antes da hora, nunca
que dois amigos com idades próximas se precipitassem. Ela explica lentamente o
que aconteceu, os motivos, as circunstâncias e as alternativas danosas que tinha
à disposição...
- Enfim! Foi, não tem volta. Usamos
camisinhas, não tem gravidez. A gente já tinha motivos para se casar assim que
essa lei de debilóides cair, agora é questão de honra!
- Ah, agora você tocou no ponto! Questão de
honra mesmo! Quero falar com ele.
- Vai ter que esperar, ele está levando um
sabão do pai, neste exacto momento.
Enquanto isso, Patrícia liga para a mãe (...) Fala das caras que os dois estão fazendo e o que deduz que estejam ouvindo,
então pede que os chame imediatamente assim que os dois desligarem, o que
acontece em questão de minutos...
- Norma, é Nancy. Quero falar com vocês e com
os pais de Ronald, aqui em casa, agora... Bom dia, David, é Nancy. Estamos
esperando por você e Diana em minha casa, para tratar de seus filhos. Sim, é
necessário que seja aqui, um lugar neutro e com duas crianças de colo sensíveis
a tons agressivos. Eles já estão vindo.
Mesmo em tom civilizado, a conversa é tensa.
Nancy os lembra a todo momento dos anos de amizade e parceria, o que já
passaram pelos seus filhos e tudo o que eles estão enfrentando agora (...) Reitera que eles só fizeram isso em resposta à agressão.
Com algumas horas, eles começam a compreender, mas David ainda está
decepcionado com Ronald, Norma defende o pretenso genro...
- Você não conhece Rebeca, David. Ela é
dominadora, sabe colocar uma pessoa contra a parede, só a Patty, eu não sei
como consegue ser imune! Se eles transaram, é porque ela deu um ultimato para
ele tomar uma atitude.
- Tem certeza do que está falando?
- Sabe o que ela falou ao telephone? “Eu
conversei com o Ron e ele fez o que um homem tem que fazer”. Em situações assim
ela não conversa, ela dá um ultimato.
- Então a coisa muda de figura! Fui injusto
com meu filho... De uma coisa vocês tenham certeza, quando tiverem idade, eles
se casam. Nenhum conde de nossa linhagem deixou uma moça desamparada, e não
será desta vez (...) Vamos celebrar a união de nossas
famílias!
Nancy busca um bom vinho e o caso é dado por
encerrado (...) Fica
acertado que isso permanecerá restrito às famílias e a quem já sabe, inclusive
Josephine...
- Mon dieu...
- E parece que ela gostou da experiência.
- Oh, eu tenho certeza! Não conheço um que
não tenha gostado! E os pais deles, como reagiram?
- Mamãe está intermediando uma conversa,
antes que se transforme em guerra. Espero por notícias a qualquer momento.
- Boa providência. Eu ligarei para ela daqui
a pouco. Patty, pelo menos eles se preveniram?
- Três camisinhas.
- Gulosos! Eles estão aptos ao trabalho?
- Estão vendo passarinho verde, afinando e
sincronizando que é uma beleza! Deixe isso comigo, é minha função controlar os
dezessete. Apenas cuide da minha mãe por mim.
Ela cuidará. Liga imediatamente para Nancy e
tem as boas notícias em primeira mão, já avisando que ninguém de fora do
círculo deve ter conhecimento disso. Paralelamente, Zigfrida está conversando
com o casal de apressadinhos (...) a reprimenda paterna abalou Ronald, as expectativas sobre ele
são muito grandes e as cobranças idem. David (...) liga
para o hotel e o chama. Se explica e se desculpa, por não tê-lo ouvido além do
“A gente transou”. Já deveria ter se dado conta de que a vida do rapazote não
tem a menor intenção de seguir os planos dele, muito menos os seus, então só
pede que ele honre o compromisso e abençoa o relacionamento dos dois; algo que
soaria démodé à maioria, mas que dá um alívio enorme aos ombros de quem traz
quase um milênio de tradição familiar, de livre e espontânea vontade.
Agora vão conhecer o local do show, esperando
que os incidentes da manhã fiquem por lá. O que encontram por lá? Mais (...) chocolate, vários com declarações
de amor dos fãs. O prefeito está lá, com a desculpa de receber os músicos mais
comentados do ano (...) A apresentação será ao ar livre, em espaço aberto, mas o suíço é tão
honesto, que quem não conseguiu ingressos não cogita entrar na área destinada
ao show...
- Isso é comovente, prefeito! Vou conversar
com minha filha a respeito, só um instante.
Richard conversa com ela, por alguns minutos,
e a própria Patrícia comunica que, havendo condições de segurança e conforto,
cada pagante poderá levar um acompanhante. Lá vai o prefeito, contar ao
conselho o que conseguiu para os fãs nativos. Na noite do dia seguinte a área
fica lotada. Um mar de gente pula e dança ao som de Dead Train (...) Quando voltam para o hotel, mais chocolate os espera.
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