domingo, 3 de março de 2019

Dead Train in the rain CLXXV

    Tempestades de inverno. A estação 175 traz mais transformações e prepara terreno para encrencas vindouras. Apresentem seus bilhetes e embarquem, o trem vai partir.


Assim que a neve permite, retomam os treinamentos conjuntos (...) Ainda é frio, mas as roupas certas resolvem, mesmo para quem não precisa delas... Ok, dentro dos limites da casa da vovó, ela pode dispensar o agasalho. Não há shows agendados para 2013, querem um tempo para a mídia descansar da banda, mas parece que ela gosta do cansaço. Uma matéria sobre os colecionadores e lojas de antiguidades, que guardaram todos os productos licenciados do jubileu de ouro para investimento de longo prazo, repercute na internet. Alguns estão em cofres com atmosphera neutra, que só serão abertos em 2037... alguns nem têm prazo.

Piscina, por enquanto, não. Nem para Phoebe. Vão todos começar o dia, já despertos e prontos para ele (...) Reúnem-se os seis cercados pelos seis, para tratar do assunto. Ainda há gente que pensa que pode passar a perna neles (...) não seria um grande problema, se não tivessem comprado participação acionária de alguns parceiros antigos, estes foram enganados. Ainda há uma chance de reverter o problema, mas terão que jogar pesado...

- Não, a Mel já avisou que só fala com a família do fundador, isso quebrou uma perna deles, agora precisamos quebrar a outra. Pensei em forçar uma paralização na produção, resguardando nossos parceiros, mas a imagem da empresa ficaria arranhada...

Analisam todas as possibilidades, enquanto Sandra e Phoebe pesquisam sobre os malandros e seus contactos. Descobrem algumas coisas interessantes (...) empréstimos consideráveis em vários bancos. Os seis se olham, se viram para elas e pedem que continuem. Encontraram o calcanhar de Aquiles (...) eles só têm lábia e ousadia. Ligam em viva voz para os fundadores da empresa, propõe que expandam os negócios e ganhem também o vital mercado externo de reciclagem de baterias de lítio. A condição é modificarem o estatuto da empresa, para obrigar todos os sócios a trabalharem por ela e limitar, ao menos por enquanto, a participação acionária de estranhos. Eles ainda têm maioria absoluta, fica fácil o conselho aprovar a proposta (...) o que obriga todos a colocarem a mão na massa e se comprometerem com a marca. Está feito.

Enquanto gritos de raiva enchem escritórios de corretoras, eles passam para outro assunto. Os fornecedores da tecelagem estão sofrendo pressão oriental para aceitarem uma exclusividade, o que lhes garantiria o mercado deles, mas também os deixaria em suas mãos (...) até o ponto de terem que fechar as portas ou vender-lhes seus negócios a preços irrisórios. Isso já aconteceu com várias empresas. Ter que resolver problemas alheios, para não serem atingidos por eles, tornou-se rotina (...) Novamente tocam para os novatos, metade deles ainda assustada com a responsabilidade implícita de suceder a banda original... não querem acreditar no que desconfiam.

À tarde, com o tempo dedicado a problemas pessoais e musicais, vão todos passear para espairecer. Conversam felizes diante da Máquina de Costura, fazendo piadas uns dos outros, quando vêem um Model S vermelho acelerando tudo em direção à maternidade...

- Sandra, o que foi isso?

- Não sei, madrinha. Kurt e Moon foram visitar a gente, disseram que me esperariam e... CARACA!

Correm todos para lá (...) e Patrícia já alerta que “Neto do meu afilhado é meu afilhado também”. Crazy Horse e Golden Feather chegam em seguida. Sea Bear fica bem à porta, para tentar ouvir o que se passa. E não demora a ouvir, Stanley berra com vontade, até afinado, imediatamente baptizado pela mãe como Quick Halk. Elias já imagina os apelidos na escola. A imprensa divulga, crente de que o mundo inteiro vai festejar, a parte menos insana até festeja, mas a era dos radicalismos deu de presente ao menino, uma legião de inimigos. Ele ainda nem sabe que existe e já é jurado de morte, por ter “sujado a genética pura de uma linhagem que nunca teve uma raça imunda” (...) e o susto se completa com “Uma cobra imunda trouxe perdição à humanidade, mas tínhamos uma cobra pura e santa para reverter tudo. O que fizeram? Seguiram a Cobra de Deus? Não! Mataram-na como mataram o Salvador! Mataram a Cascavel Branca com a crueldade da miscigenação satânica”. Avisam Star imediatamente...

- Continuem monitorando, acumulem provas. Eu vou falar pessoalmente com Princess e Brain... Patrícia, chame seu pai, estou indo agora.

Ela não gostou do tom de voz. Chama o pai e os dois esperam na biblioteca. O jacto dispensa protocolos, os motores secretos são acionados e ele voa a march 3,5 pelo maior percurso e maior altitude que pode. Ela desce com Nelson e vai ao Cadillac onde Phoebe a espera. Há afagos, mas o clima é tenso, a jovem agente percebe. Os guias lhe dizem que é mais grave do que imagina, pedem que volte à maternidade assim que desembarcar os passageiros. O faz. Lá dentro ela conta tudo o que lhe disseram e dá instruções à madrinha furiosa. Decidem de que forma contarão aos avós e aos pais do menino. Uma deles ser membro da organização pode ajudar, mas não muito, já que é a mãe.

Normalmente poupariam os pais, mas Vulcana corresponde às expectativas, age com a frieza característica. Elias se desfigura, toma feições de um felino acuado, fica parecido com Spark...

- Elias...

Não ouve a madrinha. Saca seu tabletrain e começa a trabalhar alucinadamente. Reúne em suas contas em redes sociais, com links para todas elas, em ordem impecavelmente cronológica, pesquisas científicas devidamente comentadas (...) Arremata com “Sou mestiço, pai de um rapaz branco casado com uma índia e eles me deram um garoto, que débeis mentais começaram a ofender com base em pseudociência e crendices estúpidas. Aos que sabem ler, em vez de só olharem letras, convido a estudar o material que reuni. Quanto aos outros, meu neto é território proibido”. Publica e vai cercar o neto, com aquela cara de quem vai estraçalhar o primeiro que se aproximar sem permissão. Está ficando cada vez mais parecido com Patrícia.

No começo da tarde, com os ânimos mais amenos, a publicação repercutindo e alimentando generosamente o jet set, Crazy Horse aparece sobre sua velha Harley, montada com sucatas de outras acidentadas, e um capacete extra...

- Eu não sou Happy Moon, mas de agora em diante te chamarei de Brave Bear. Me acompanhe para seu baptismo, bravo.

- Voltaremos antes de anoitecer... Eu espero.

São horas de viagem por Michigan, Elias coletando imagens de tirar o fôlego. Funciona, ele volta calmo para casa (...) Mais de três mil photographias são publicadas e compartilhadas por empresas de turismo, para chamar gente a conhecer o Estado. Enquanto grupos radicais se revoltam com a publicação do brasileiro e procuram um meio de deportá-lo, ele acostuma o caçula ao sobrimho recém-nascido. O dia seguinte é de mais polêmicas, porque o rapaz costuma ser bastante neutro, agora a imprensa sabe que ele tem o mesmo apego familiar da madrinha, que é espinhoso, mas sempre rende bons prêmios.

&

A organização já se mobilizou para neutralizar, no momento certo, os seguidores póstumos da Cascavel Branca (...) Mas mesmo quem prega o equilíbrio, pode se radicalizar. Uma pequena multidão se concentra à entrada da Gardner Company, protestando furiosamente contra o imenso V8 611”. Pregam uma medida radical, a extinção imediata de todos os motores, fazendo o mundo se mover por pedais, com bicicletas que custam mais do que um Challenger, com pneus mais caros do que os de um Corvette, manutenção mais cara do que a de uma Harley Davidson e seguro mais caro do que o de um Cadillac, fabricadas com minérios retirados por imensos caminhões diesel-híbridos, transportados por gigantescos navios a diesel, depois em enormes carretas a diesel, para fábricas com milhares de motores eléctricos, depois transportadas por mais caminhões a diesel para aviões a querosene, para serem entregues por caminhões a diesel até seus ecológicos e racionais compradores; muito coerente mesmo.

De pouco adianta divulgarem os dados de emissões, ruídos e o facto de ser apenas um protótipo (...) que não será utilizado em nenhum modelo de série, não adianta lembrar do pioneirismo do próprio Richard na hibridização em larga escada, continuam protestando e demonizando o automóvel e tudo o que leva motores, pregando a proibição à força como solução contra as mazelas da humanidade, com o governo ditando o que pode e o que não pode em prol do bem estar da população; e viva a democracia! Richard se recusa a acreditar na burrice que está ouvindo. Vai ver por si o espetáculo circense que se desenrola lá fora. Ele sai e de cara vê alguns conhecidos, gente que lê artigos científicos pela metade, recorta o que lhe interessa e interpreta como endosso às suas idéias (...) Fica triste por haver idiotas transformando ciência, e até o ateísmo em novas religiões...

- É a primeira vez que vou ao circo, mas estou decepcionado, quero meu dinheiro de volta.

- Não é um circo, Mr. Gardner! Isto aqui é uma mobilização em prol da sobrevivência da espécie humana, da preservação ambiental e da extinção dos motores em todas as suas formas!

- Mostre as pesquisas que apoiam essa conversa toda.

- As pesquisas são manipuladas por grandes grupos econômicos interessados na perpetuação da dependência humana em relação aos ladrões de energia!

- E quais são os seus estudos a respeito?

- Eu não sou cientista, não tenho obrigação de fornecer dados e não tenho que dar satisfações a carrocratas! Morte aos carros! Morte aos motores!

- Inclusive os do marcapasso?

- Sacrificios são necessários! O mundo novo precisa de mortes para a preservação da vida!

- Prove.

- Vamos provar na prática, destruindo os motores, a começar pelos seus...

Richard dá um soco na própria palma esquerda, mostrando que está pronto para a briga, e os ânimos esfriam. É um homem velho, mas é um velho enorme e capaz de quebrar ossos. A coisa fica mais perigosa quando neto e bisneta do grandalhão vão ver quem o está ameaçando. São três gigantes dando audiência para canais de televisão que estão adorando este início de ano. A polícia logo chega (...) Tudo acaba sem conflitos e os manifestantes vão embora em bicicletas, naquele frio ainda cortante que Phoebe ignorou sumariamente. Não se preocupou em vestir o agasalho, se ocupou em ir amparar o bisavô, de regata e bermuda.

Albert chega em seu uniforme de Beastie, procurando os candidatos a cadáver que ameaçaram sua esposa. Logo em seguida chega o resto do bando...

- Salve, irmãos!

- Salve, irmão! A gente veio o mais rápido possível, com essa neve toda na estrada. Cadê?

- Se mandaram, os covardes. Eu estava atendendo uma criança, quando me avisaram. Irmão, esse mundo está virado pelo avesso!

- Pior! Mas não tem outro pra gente se mudar, temos que arranjar as coisas por aqui mesmo. Já vimos que não dá pra te abandonar, guy, mas fica difícil pra gente... Tem lugar pra gente em Sunshadow?

- Eu providencio – responde Richard, já ligando para Chuck.

Mais um bando de motoqueiros mau encarados (...) formando a polícia rodoviária de Sunshadow. Albert decide fazer visitas esporádicas ao posto de trabalho de Phoebe. Em Los Angeles, Arthur decide algo parecido. Está farto de passar meses seguidos longe da família, especialmente longe da esposa...

- Porra, Steve! Eu sou marido de Patrícia Petty e fico meses longe dela! MESES! Cansei, cara! Vou montar uma estação de trabalho em casa, só virei aos estúdios quando for absolutamente necessário.

- Calma, não se exalte e não parta minha cara em duas. Eu compreendo o seu lado, sério, mas você presente faz muita falta! Você encoraja e inspira os elencos, precisamos de um meio termo!

- Por exemplo?

- Não sei, mas precisamos. Aproveite essa semana de folga e pense bem no caso, porque nós precisamos de suas orientações in loco, temos muitos filmes que serão ambientados com trechos ou totalmente em outras épocas, ninguém melhor do que você para manter nosso padrão de qualidade. Vamos, Arthur, pela nossa amizade e pelos garotos que estão começando no cinema...

- Ok. Eu não sou pago para isso, mas vou pedir ajuda para encontrar uma solução. Mas meses inteiros longe de casa e de minha esposa, eu não fico mais.

- Se eu fosse marido dela, eu também não.

Vai ao escritório central da banda, pega a cunhada e a sobrinha, vai pedir bênção a Josephine e voa com elas para Sunshadow. Melinda (...) sugere a mente mais brilhante do mundo para ajuda-lo; sua neta Phoebe.

Ela raciocina um pouco. Pergunta o que exactamente ele faz naqueles estúdios (...) Ele conta, com a esposa feliz pela notícia, abraçada a ele, enquanto a moça faz uma expressão muito sóbria e fica como que em estado meditativo. Ela tem um insight...

- Onde serão filmadas essas cenas?

- São milhares de cenas, literalmente milhares. Eles filmam onde for melhor.

- E poderiam, por enquanto, filmar aqui?

- Alô, Steve? Vocês foram salvos por um anjo de dois metros e doze. Vou arranjar alguma coisa aqui mesmo, aguarde notícias. Não existe cidade mais vintage neste país...

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