sábado, 30 de março de 2019

Dead Train in the rain CCII

    Tensão. A estação 202 acrescenta a tensão da vida secreta aos problemas cotidianos. Respirem fundo e embarquem, o trem vai partir.


Albert liga para a Máquina de Costura e confirma, Patrícia também está assim. Ele se aproxima com discrição, notando detalhes daquele cenho franzid (...) Verifica o perímetro e se aproxima um pouco mais, até ficar ao lado dele (...) Na Máquina de Costura, Patrícia mergulha em seu abismo após coordenar o resgate de seis agentes de países aliados, e duas famílias desesperadas que pegaram carona no plano. O governo polonês concordou em seu homem levar os civis, mas as perdas que eles sofreram quase os fez desistir e se entregar à morte certa, Zigfrida sabe disso e pouco pode fazer a respeito, além de agir nela. No escritório da loja, o rapaz começa a lacrimejar...

- O que tá pegando, Brave Bear?

- Farpas que ainda machucam. Ainda tenho alguns vácuos que as mantém presas... Nem me lembrava deles...

- Putz, o negócio é grave...

Acolhe o rapaz e se põe a pensar no que fazer. Enya está em Detroit, posando para a Cadillac, Sandra está tratando de negócios com os comparsas, então só resta mesmo...

- Eu não queria incomodar, tia Frida, mas o Elias começou a chorar e...

- Elias o quê???

Ela ouviu. Deixa a depressão profunda de lado e acerta o passo. Esquece da própria dor e abraça o afilhado, que é um homem feito, mas está no momento muito vulnerável, após um estresse absurdo. Ela olha para a sueca, que promete investigar o caso assim que ele estiver em condições de responder a algum estímulo. Com carinho e o necessário silêncio, ele consegue respirar e emergir o suficiente para ser ouvido. Albert fica por perto, para o caso de precisarem. Ele fala do vazio repentino, que causou uma avalanche de lembranças e lutos antigos. Alguns deles imaginários...

- Lutos imaginários... Fale a respeito.

Zigfrida passa da preocupação para a curiosidade. Ele fala de pessoas que simplesmente imaginou, ao longo da infância e adolescência, e que de uma hora para outra as tinha como perdas trágicas, sempre associadas a perdas reais (...) São como personagens dos anos trinta aos cinqüenta, se lembra deles sem se lembrar de detalhes fisionômicos, apenas que são perdas (...) Sempre se lembrava, e voltou a se lembrar, do ponto de vista de uma criança pequena entre adultos altos.

À noite a sueca fala do quanto está impressionada com a criatividade, ainda que passiva e dolorosa, que viu nos relatos do rapaz (...) ele foi capaz de descrever muitos por suas roupas e seus gestuários, o que na prática é o que fica na memória de longo prazo (...) O humor melhora em pouco tempo, com a receita que Renata deu à amiga. Ela sai de casa com Naomi em um vestido longo e fresco, que é facilmente tremulado pelo vento, dando aos paparazzi uma noção precisa do que ele esconde. Enquanto o bordão “Oh, grandma!” volta aos tabloides, ela entra na Máquina de Costura para ver o primo (...) A menina se adianta e se recosta nele, se deixa amolecer e ele quase instintivamente a acolhe.

Mais tarde, inteirada de tudo e já maquinando caminhos a seguir, Renata trata a respeito com Zigfrida (...) O sentimento de perda que emergiu pode ser uma chave para ajudar a madrinha também. Apesar de tudo, o rapaz é um grande fornecedor de material para estudos, suas crises são valiosas para os pesquisadores...

- Na minha opinião o seu primo é um doido às avessas. O comportamento dele é todo certinho e retinho, mas por dentro ele é um doido igual a vocês.

- Um doido com procedimento operacional padrão.

- Yes! Ele não se enquadra em padrões alheios, tem os seus próprios e não abre mão deles. E ele está coberto de razão!

- E, trocando de assunto, aquela gente que voltou conosco ainda está com a Jose?

- Está e eu estou trabalhando com eles. Eles vão ter vida nova, com todas as encrencas que uma vida normal merece, com idendidades novas, rostos novos e histórias de vida na ponta da língua. E, é algo que você pode saber, muita gente ainda vai morrer nos próximos anos, para poder viver e se safar de regimes autoritários. Você pode ajudar, quer?

- É claro! O quê que eu tenho que fazer?

- Verá na hora. Alguns deles virão da América do Sul, inclusive do Brasil. As coisas estão ficando realmente ruins por lá, muitos correligionários e simpatizantes de políticos formaram verdadeiras gangues que são toleradas e até financiadas por debaixo do pano. Eles vão precisar de toda a ajuda que tiverem.

- Nós três vamos ajudar.

Convoca a filha e a irmã, explica o que pode da situação (...) Marcia, após as instruções, puxa a filha e manda soltar o verbo. Ela não pode contar muito, pode dizer os tipos de históricos que trarão e adiantar o expediente...

- Essa porra toda já tá podre... Se for tirar quem não presta de lá, não fica um sequer... Amado, tirei umas informações da Phee e quero que você complemente. Me espere aí mesmo.

Vai à Culture Train, de cuja entrada vê as obras do museu de Patrícia em andamento (...) Encontra Richard à sua espera, no escritório. Ele complementa com alguns detalhes sórdidos (...) Avisa ainda que a pior parte da política brasileira está tentando se infiltrar na política americana, só não conseguiu ainda porque a maioria deles está na lista negra da CIA, alguns a Interpol pega assim que puserem um pé para fora do país...

- É tudo o que posso te dizer, amada.

- É o bastante... É o bastante para eu perder a fome...

Quando volta para casa, a mãe está lá, com a caçula, esperando para dar o abraço de que a filha aturdida precisa. Fica com ela e as bisnetas pelo resto da tarde (...) Ela conversa com os comparsas na manhã seguinte, em um intervalo entre assuntos corporativos...

- Vou parabenizar os dois, por conseguirem dizer todo o necessário sem falar demais. A situação é essa mesma, o Brasil é uma preocupação bem maior do que a ditadura venezuelana. E por falar nestes dois problemas, eu proponho manter nossos investimentos no primeiro, e mandar ajuda clandestina ao segundo, porque aquele bufão psicopata não vai aceitar ver gente de fora, muito menos burgueses, ajudando o povo que ele atirou à mais podre miséria. Todos comigo?

- Tô contigo, irmã.

- Nós dois contigo.

- Desde que usávamos fraldas.

- De acordo.

- Na hora, uai!

Decidem e mandam executar. Passam para o próximo assunto (...) A união europeia se fragilizando, ditadores se aproveitando disso, terroristas se misturando a refugiados, enfim, o caos nosso de cada dia bate à porta (...) Com todas as meninas na escola, a casa fica muito silenciosa, silenciosa a ponto de incomodar. Eles se olham, vão aos instrumentos e começam...

- We no have love for the music, we no have love for the art...

Na falta ade um show agendado para hoje, cantam para si mesmos e desopilam.

&

Os picaretas mordem as próprias nucas de raiva, não podem fazer mais do que isso. Está ficando cada dia mais difícil negociar com gente de Michigan (...) No momento, balizados por Phoebe, eles assinam a cooperação com várias entidades para acelerar as pesquisas de aeronaves eléctricas, bem como fábricas de baterias melhoradas e empresas para reciclagem das descartadas (...) Os novos parceiros voltam para suas respectivas empresas, para tomarem as devidas providências e evitarem puxões de orelhas. Os seis vão à copa e comemoram. Marie pede licença para anunciar uma polêmica, precisará da experiência dos pais...

- Foi o mesmo que aconteceu com Elias. A gente sempre passava pela instituição, quando ia pra Memphis...

- O que acontece dia sim, dia também – diz Rebeca.

- É... Mick, traz ela... Ela se agarrou à gente e não quis soltar... Eu até chorei... Nos dois últimos meses a gente grudou e... Vem com a mamãe... Gente, esta é nossa pequena Zsa-Zsa.

É como se vissem Zigfrida na primeira infância. A pequerrucha é branquela e intensamente ruiva, tem dois olhos que parecem ter sido recortados do céu, quase como as mulheres cativas (...) Ela se arreganha para todo mundo assim que os pais asseguram que pode. Rebeca e Ronald compreendem os temores, ela tem toda razão (...) Norma, Diana e David chegam e se derretem completamente pela pequena novata. Nancy se anuncia e reclama a educação da menina, com Josephine reclamando a afilhada de Zigfrida...

- Oras! Dêem-me! Vejam só essa carinha... É a Frida desenhada e desavergonhada!

- Re-re-re-re...

Os risos pueris da petiz amolecem ainda mais os adultos, ela está se divertindo muito. Chamam Elias, ele é o expert em educar e proteger crianças polêmicas. Ele (...) a pega nos braços e a leva ao jardim, apresenta-lhe as flores e os pássaros. Lady Spy vai investigar a intrusa e também é apresentada...

- Com cuidado, bem devagar... Isso...

O casal aprende na prática, de forma didática, e ele já avisa que a menina tem mais em comum com a sueca do que a aparência, é tão geniosa quanto. Ela despenca de Los Angeles para conferir. A encontra rindo com Belize, que aguarda com os irmãos a hora de ir para casa com a mãe...

- Oi, Luppy! É ela?

- Yeap, é ela! Você doou sangue nos últimos anos? Alguém te clonou!

As marroquinas ajudam a cuidar da menina e a educá-la (...) Na biblioteca, em uma reunião leve e egradável, Rebeca se derrete pela neta incidental. Está resistindo facilmente, mas a tentação de mimar a pequena é grande, ainda mais por ser a caçula (...) Pensam nas crianças que estão em gestação, na bagunça que suas casas vão se tornar, na correria que será todos os dias... Se derretem nas poltronas.

Voam para New Mexico no dia seguinte, em estado de graça, e de cara vêem que realmente há polêmica. Em Sunshadow a imprensa aprendeu a respeitar, mas aqui fora o medo de levar uma surra é atenuado pela pouca convivência (...) Se instalam no resort e exploram o ambiente, enquanto os parceiros do show não chegam. Sandra e Phoebe conversam com uma copeira sobre um fã clube local, ela é mãe de um membro. Chamam o garoto e ele surta, mas consegue se controlar até a hora de tratarem de negócios. Um deles, descendente de turcos (...) não deixa passar a oportunidade assim que os papéis são assinados...

- Elas estão se adaptando bem, são acompanhadas por profissionais e sempre há alguém por perto para qualquer caso.

- Me desculpe, mas o Hassam era louco?

- Não, o que ele fez se deu no pleno exercício de sua lucidez, não há um pingo de loucura aqui.

- Só amor.

- É... No fim das contas ele conseguiu o que queria... Mas vamos mudar de assunto. Joe, vem cá...

Se entretém com o jovem fã para dissipar um pouco da densidade do assunto. Ele acaba sendo útil, informando de movimentações que Patrícia pede a colaboradores locais que investiguem. À tarde, quando testam o palco, uma moça de cabeça raspada com a cruz de Ank tatuada faz o sinal, e as quatro agentes vão ter consigo...

- E agora? O FBI está investigando tanta gente, que está todo embaraçado nos procedimentos!

Alertam assim mesmo e a resposta é a esperada (...) precisariam do dobro do efetivo para quitar o serviço. Mas concordam em pedir a agentes locais que aproveitem o expediente e tenham consigo (...) Voltam aos outros, tensas, decidem fazer um pré-ensaio para relaxarem, para a alegria dos operários. Têm a agradável surpresa de uma acústica maravilhosa, a mais perfeita que já tiveram...

- Ricky, é mamãe. Não sei o que vocês fizeram aqui, mas quero que façam de agora em diante em todos os nossos shows.

- Yeap, mom, vou das as ordens agora mesmo. Gente, ela gostou. Podemos colocar o revestimento novo em todos os palcos da banda.

A equipe se sente lisonjeada (...) Quanto à irmã adoptiva, Arthur a aprova. Hamira torna-se estagiária da Culture Train, arrancando dias depois o sorriso mais largo que a mãe pode oferecer (...) Em Marrakesh as onze começam a ser vistas como celebridades (...) na família e entre os maridos das que ficaram, sobram admiração e orgulho, querem ver logo o nome da moça nos créditos de uma animação de Hollywood.

Na volta dos três shows, Patrícia vai directo para o prodígio que Arthur descobriu sob a poeira de uma bordadeira competente...

- Amor da mamãe vai ter seu nome nas telas de cinema! Conte-me tudo, Arthur!

- Descobri esse talento quando a flagrei simulando bordados animados no tablet. Dê uma olhada nisto e segure o queixo se puder.

A animação de treze segundos mostra duas flores bordadas brotando de um pano de prato, saindo dele e dançando juntas (...) Ela fica boquiaberta, aperta a moça em um abraço até sair suco de marroquina, e avisa o marido que o nome artístico dela é Princess Hamira Alander, nem um grau nobiliárquico a menos.

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