Todo o ouro do mundo não é páreo para a morte. A estação 44 mostra o que acontece após um luto: a vida continua. Enxuguem suas lágrimas e subam, o trem não vai esperar.
Em uma cerimônia fúnebre militar, Richard
deposita sobre o caixão a bandeira de Sunshadow, em nome dos mil cidadãos
mortos na guerra. Ele e a família foram convidados (...) para fazer justiça ao luto de sua cidade, mas também para revelar um segredo
que finalmente pode começar a ser divulgado (...) embora a CIA saiba que ninguém vai acreditar tão
cedo na conversa. Nelson chama o mecânico para um canto, já agradecendo pela
maravilha que o mini compressor fez por sua Zundapp...
- O homem que estamos sepultando hoje
conheceu seu pai e seu avô. Chegou a lutar com eles (...) em uma missão secreta.
- Então eu posso considerar isso como um
sepultamento deles também.
- Lembra-se daquela sua idéia de voltar a
usar Hollywood para nossos propósitos? Sabe qual o verdadeiro nome do soldado
que acabamos de enterrar?
- Não, peraí! Ele é Steve Rogers? O Capitão
América é real?!!
- Tudo o que as revistas publicaram (...) aconteceu de verdade. As
revistas eram na verdade, um relatório cifrado para Washington. Está na hora de
você conhecer a verdade sobre os heróis das revistas, Brain, porque um dia você
será um deles. A sua infância foi mais verdadeira do que você pensa, Richard, e
o mundo é melhor do que as pessoas querem acreditar. Venha comigo.
Vai para uma sala com várias câmeras e
televisores, onde é posto em contacto com Josephine, Grant e outros agentes que
já têm ciência do caso. É tudo muito rápido (...) mas Patrícia desconfia assim mesmo...
- Olha, desta vez eu até posso contar, mas
você não vai acreditar.
- Experimente.
- O soldado que foi enterrado hoje é Steve
Rogers.
- Oh, claro... Suponho que aquela tenente
chorosa seja Diana Prince. Não quer falar, não fala, não precisa curtir com a
minha cara.
- But is true!
- Vejam! Lá em cima! Será um pássaro? Um
avião? Não, é só meu pai me passando trote outra vez. Vamos pra casa.
Voltam para casa. Alguns oficiais (...) preferem que os segredos sejam guardados para
sempre, mas o próprio Richard sempre diz “Não existe essa conversa de segredo,
um dia todos sabem a verdade, e as conseqüências são tão mais amenas quanto
mais cedo e mais preparada a população estiver”. Richard não alimenta heróis,
nem mesmo seu pai e seu tio.
&
Melinda manda photographias do que pode ter
sido seu último aniversário. Nancy abraça a filha por trás, para evitar que
faça aquela cara de novo (...) Ela vê aos poucos a alegria do pós guerra se tornar uma euforia cega. Começa
a ter saudades da época de criança, que nem faz muito tempo. Talvez tenha mais
saudades é da inocência que tinha então, quando não sabia que o mundo era tão
perverso como testemunhou nos últimos dois anos (...) Melinda
nasceu pouco depois de começar a receber do mundo as doses de perversidade, é
como se sua inocência estivesse, como ela, dando seus últimos suspiros (...) a tranqüilidade que tinha na
primeira infância lhe faz muita falta...
- Honey?
- I’m good, mom. Estou bem.
- Você nunca está bem, quando faz essa cara.
- Tá muito séria?
- Psicoticamente séria. Até parece que quem
está morrendo é você!
- De certa forma... De certa forma é sim. Eu
me analiso também, percebi minhas mudanças nesses poucos anos... Estou
acometida por um forte saudosismo.
A voz embarga várias vezes (...) Ela para de falar e suspira profundamente, põe a mão na
testa e faz que vai sair, mas é detida pela mãe, então desiste de ser uma
adulta amargurada e deita a cabeça no colo da genitora. As rugas na testa se
desmancham lentamente, mas Nancy sabe que as de dentro ainda estão firmes.
Mesmo o rosto da garota, apesar de desfranzido, continua severo.
Meia hora de brincadeiras na piscina,
construída durante a turnê, ajuda a mudar a cara de Patrícia (...) a perspectiva de duas novas vidas
a ajuda a esquecer o ocaso de uma, pelo menos por agora. Deborah olha da janela
de seu quarto, pensando em tudo o que perdeu (...) Sente-se estúpida. Viu que a sobrinha que não conhecia
revolucionou a cidade, mas não viu a revolução acontecer. As três semanas de
retorno a Sunshadow não foram suficientes para se actualizar com tudo (...) lhe dói saber de seus dramas, e de
não poder ajudar mais do que com suas massagens.
Mas a líder do Dead Train não é a única,
todos os seis estão mudados, depois de tamanha demonstração de agressividade do
mundo para consigo, mas nenhum deles mudou tanto quanto Silvia (...) A menina alegre, tagarela e expansiva parece ter
ficado na saudade. Já parou de culpar Laura por cada folha de árvore que cai,
mas a filha carinhosa de outrora está arredia, passou até a fechar a porta do
quarto (...) Às vezes elas voltam a se abraçar, mas é mais por
sentimento mútuo de culpa, do que pelo carinho transbordante que dominava a
cena.
Irônico como a cidade que tiraram do
esquecimento está pujante e feliz, enquanto eles não demonstram um décimo do
vigor de há um mês. Renata termina de fazer uma leitura do Livro dos Médiuns,
medita e liga para os outros. Convoca todos para uma reunião na casa de
Patrícia (...) Pede que levem roupas de banho, sob a normal.
Em quinze minutos estão todos em frente à placa amarela com a frase “Não posso
impedir as pessoas de serem idiotas, mas posso fazer com que hesitem em colocar
sua idiotice em prática” (...) ela diz para terem
paciência, os leva para os fundos da casa, onde a moçoila ainda mima a mãe...
- Oi, gente. Algum problema?
- Sim, senhorita mártir, mas já vamos
resolver. Muito bem, todo mundo tirando a roupa e pulando na água!
Agora eles entendem. Patrícia entende quando
os cinco pulam na piscina e começam a sabotar sua cara jururu, arrancando
gargalhadas sonoras.
&
Patrícia conversa com Zigfrida sobre Melinda.
Fala do modo sereno e resignado com que ela encara a iminência do óbito (...) Mesmo com todo o mal estar que os
efeitos colaterais do tratamento lhe impõe...
- Ela está te dando uma lição de vida, não é?
- Mais do que isso – diz com voz mais madura
que de costume – ela está de mostrando como eu devo viver. Você é veterana na
profissão, já deve ter visto uma penca de meninas mimadas, fúteis, que se
desesperam por causa de uma briga com um garoto (...) sem nem terem idade para saber o que é um namoro.
- “Penca”? Você está comparando garotas a
bananas!
- É uma expressão que a Rê trouxe do Brasil.
Se diz penca ou cacho para algo que se tem aos montes, às vezes até banalizado
de tão numeroso.
- Quantas vezes esteve com ela?
- Além daquela primeira visita, estive três
vezes com os três. Ela sempre me recebe com um sorriso banguela... Ela perdeu
os dentes por causa da medicação, sabia? Perdeu-os e sabe que isso não vai
salvá-la, só adiar um pouco o desfecho.
- “Desfecho”. Medo de mais um luto?
- Depois da minha avó, só ela conseguiu me
trazer esperanças no mundo... Que barulho é esse? Pai, que barulho...
- Sua mãe vai ter os bebês!
Diz e dispara com Nancy para a maternidade. Não
é mais difícil do que se pode esperar de um parto de gêmeas, elas (...) enchem o hospital com seus choros de
recém-nascidas. A primeira pessoa para quem Patrícia conta é Josephine, a
segunda é Maria de las Dolores, que avisa a Melinda que há uma irmã da Patty
Petty com o nome dela. A criança fica eufórica, mal cabendo em si. Se ainda
tivesse as pernas, correria pelo hospital para espalhar a notícia.
Audrey e Melinda conhecem seu quartinho no
mesmo dia (...) Logo os outros
cinco vão com suas famílias, com Renata levando Eddie nos braços, Eduarda ainda
precisa de amparo do marido após o parto de ontem.
Pouco mais de um mês, com a casa tão repleta
de alegria que mal cabe em seu prédio, decidem do hospital se ligam ou não para
ela...
- Ela tem que saber. Ela se responsabilizou
pela menina, ela custeou tudo, até colocou seu prestígio para apoiar o
tratamento dos outros doentes. Não são só eles que devem isso a ela, nós também
devemos. Coragem, Phineas (...) eu estou
ligando, mas você tem que falar... Está chamando. Coragem!
- Patty, é o doutor Blatter, como vai? É
sobre a Melinda... Eu... Eu tenho que ser directo (...) o sofrimento dela finalmente acabou...
- Obrigada, doutor. Providencie tudo, depois
me mande a conta. Muito obrigada pelo que fez pela minha irmã...
Ela desliga e olha sóbria para o nada. Faz a
cara de mártir (...) Ela é forte, muito
forte... Mas agora precisa desesperadamente do colo da mãe. Nancy vai avisá-la
de uma tragédia horrorosa e a flagra lacrimejando, com o rosto se avermelhando
rapidamente...
- Patty, mataram o presidente... Minha filha,
o que houve?!!
- Mãe... A... Melinda... Ela morreu...
Deixa a cara de mulher séria, durona e dona
de seu mundo, para desabar em um choro desesperado e escandaloso (...) O ídolo de milhões (...) com seus pouco mais de seis pés de altura, agora é só
uma menininha (...) Por horas ela chora
desatadamente, depois está dormindo nos braços da mãe. Ela liga para Josephine
e avisa sobre o estado da filha.
Já recuperada, vê o pai constrangido, avisando
que estão pedindo sua presença no funeral do presidente...
- Vá, pai, é essa a sua missão. A minha é com
os pais da Melinda, eles não têm ninguém por eles na América. Amanhã eu choro
no seu colo, tá?
Ele vai com o coração partido. Sabe que ela
foi sincera, mas por isso mesmo sente um pouco de culpa.
Enquanto Richard tem uma honra triste (...) acabando por se tornar um
ombro paterno para os americanos, Josephine e o Dead Train são os únicos
presentes no sepultamento de Melinda Gonzáles. Para não chorar,
Patrícia canta...
-
It was once a caterpillar, that looked enchanted for a star. The caterpillar
aways said “One day I ill be with you”. One day her dream is realized, she
could finally fly and directing your spirit to heaven, she met with the Star
Heart.
Fly,
butterfly, your place is no more here. Fly, little angel, back to your true
home.
Tank
you for being in this world my little star. You lit my aching heart, showed me
my pain was small. Today I’m better person for having know my little
caterpillar.
Fly,
butterfly, your place is no more here. Fly, little angel, back to your true
home.
Ela canta sozinha, com uma voz bem mais
madura (...) vez nem Josephine segura as lágrimas.
O tempo passa, as lágrimas também (...) Patrícia é flagrada amamentando as pequenas. Os
adultos olham aquilo quase se desmanchando, porque a garota ainda tem o rosto
arredondado e suave, apesar dos momentos de franzimento do cenho...
- Que bom saber que posso contar com essa
ajuda! Poder te chamar e voltar a dormir, no meio da noite, vai fazer muito bem
à minha cútis.
Ela não recusa. Se levanta pronta ao menor
sinal de choro e vai atender as irmãs. Passa a ser comum (...) dividir as responsabilidades com
a mãe. É comum vê-la por Sunshadow, levando as duas para passear, bem
agasalhadas e juntinhas ao seu corpo, às vezes acompanhada de Renata, que cuida
de Eddie com a mesma dedicação. Naomi facilitou a maternidade, quando Patrícia
nasceu, agora é ela quem alivia a vida de Nancy. Infelizmente, férias
propriamente ditas, os seis ainda demorarão a ter (...) há uma série de assuntos que exigem suas jovens mentes, como a
gravação do segundo álbum e dos videoclipes de cada música...
- A gente pode aproveitar uma cena de um dos
clipes para fazer a capa do disco.
- Boa, Bobby! Então teremos que fazer um
projecto photográphico à altura...
Discutem os rumos da banda para o ano que vem,
enquanto sua agente precisa negociar para que eles tenham tempo para respirar.
Mais de cinqüenta pedidos de shows já estão sendo estudados, dois deles na
Alemanha. Josephine encarregou Bart de conversar com as cidades muito próximas
entre si, não quer que os garotos sejam consumidos pelo trabalho.
Apesar de não se apresentar à mídia há alguns
meses, o Dead Train continua nela. A reabertura e ampliação da estação
ferroviária, foi acompanhada de uma estrada paralela à principal, que leva à
estradinha de acesso a Sunshadow. O fluxo de turistas já justificou a ampliação
dos poucos estabelecimentos comerciais da cidade, mas trouxe junto a tietagem
pirata dos paparazzi, que se encarregam de alimentar a indústria de notinhas de
celebridades, enquanto Matthew cuida das notícias relevantes. Uma delas é a
avalanche de provocações, que alguns artistas ciumentos e invejosos têm
derramado nos jornais (...) Um paparazzo aborda Rebeca, sem a menor noção do perigo que
corre, faz uma pergunta, ela faz cara de inocente e ele esclarece...
- Eles disseram exactamente isso?
- “Enquanto o trem descansa em paz, o Cool
Boys faz a alegria dos fãs”, e o “The Special Boys” disse que conhece todos os
pontos fracos de vocês.
- Cara, que dó de você! Ter que ganhar a vida
escutando tanta merda deve ser triste! Olha, pra compensar, eu estou indo agora
pra casa da Patty, a gente vai falar com o Matt sobre a campanha deste ano
inteiro e até um pouco do próximo.
- Já estão trabalhando para o ano que vem?
- Nós nunca paramos de trabalhar. Nós somos
empresários, não tiramos férias como todo mundo, só quando o serviço termina. E
o deste calhamaço aqui vai até o fim do ano, no mínimo. Tenho que ir, Tchau.
Pelo menos tem uma notícia fresquinha para
sua coluna, em vez de “Renata do Dead Train passeia pela praça do dead train”.
Rebeca (...) teve umas dúvidas e quer ter tempo
para esclarecê-las. Essa conversa de que o patrocinador vai fornecer as roupas,
não lhe agrada (...) não vai usar o
que não quiser. Ele poderia, por exemplo, fornecer roupas provocantes ou
exóticas, só para chamar mais atenção do público do que a banda.
A discussão é tensa, com Rebeca ameaçando
cantar pelada no palco, e eles sabem que ela é capaz disso, mas concordam em
colocar uma cláusula que faculte os garotos de usar o considerarem
inapropriado. Vão até o fim da tarde nessa reunião, que é findada com um
buffet (...) quando gente de fora
tenta interferir na rotina da banda, é o quase como xingar suas mães. Agora é
com Josephine.
A diva gosta da atitude dos pupilos (...) Fizeram bem em esperar alguns anos
até se lançarem, conseguiram amadurecer bastante. Bart consegue um acordo, mas
eles pedem uma contrapartida, mais dez shows no decorrer do ano que vem. Eles
sugerem que contractem logo Deborah, porque vão precisar dela. Tudo em sigilo (...) Os seis já estão calibrados
para o ritmo de seu trabalho.
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